Em 2019, as ações do Banco Pan, controlado pelo BTG Pactual e pela Caixa, subiram 474,1%. Não havia nenhum fato em especial que justificasse esse salto, que foi de mais de dez vezes superior ao rendimento do Bovespa, o principal índice da B3.
Esse avanço, no entanto, foi calcado numa narrativa que o mercado comprou antes mesmo de ser implementada: a digitalização do Banco Pan. Em setembro de 2019, o Pan captou R$ 1 bilhão em um follow on, sendo que mais de R$ 500 milhões foram para o caixa do banco para implementar essa estratégia.
Agora, chegou a hora de o Banco Pan cumprir a promessa e começar a entregar o que foi prometido no passado.
A conta digital foi ar em fevereiro de 2020, um pouco antes de a pandemia do novo coronavírus provocar uma crise sanitária e econômica. Os números, no entanto, ainda são guardados a sete chaves por Carlos Eduardo Guimarães, CEO do Banco Pan.
“Mas posso dizer que o número de contas abertas cresceu mais de 50% de junho para julho”, disse Guimarães, mais conhecido por Cadu no mercado financeiro, ao NeoFeed. “Estamos avançando a passos largos.”
No segundo trimestre de 2020, o Banco Pan viu sua base de clientes que consomem todos os serviços crescer para 5,7 milhões, uma alta de 8% em relação ao trimestre anterior. Foram adicionados 173 ml novos clientes por mês, segundo um relatório do Banco Safra, que atribuiu esse crescimento à estratégia digital.
O CEO do Banco Pan informa também que 60% dos clientes que abriram a conta digital já tinham um produto no Banco Pan. Os 40% restantes chegaram via marketing digital.
Em relatório, o Banco Safra disse que o Banco Pan tem um modelo de negócios interessante, com características de ativos leves, carteira de crédito robusta e de rápido crescimento, que deve ser alavancada pelo aumento do uso do seu banco digital.
“O banco está colhendo os primeiros resultados de um processo interno de digitalização que deve trazer resultados mesmo na originação de crédito (com melhorias na qualidade e nos volumes)”, informou o relatório, escrito pelos analistas Luis F. Azevedo e Silvio Dória.
No segundo trimestre, a formalização digital de empréstimos consignados passou de 19% para 60% na comparação com o mesmo período do ano passado. O financiamento digital de veículos, que era zero há 12 meses, chegou a 90%.
Mas o desafio do Banco Pan não é só levar o seu cliente das classes C, D e E a usar o meio digital. “Eles estão querendo capturar os clientes que hoje contratam os financiamentos de carros e motos e fazem o consignado”, diz uma fonte do mercado financeiro. “Historicamente, eles sempre foram bons nesses serviços, mas nunca conseguiram perpetuar os clientes.” Sobre o banco digital, limita-se a dizer: “É cedo ainda para avaliar.”
O nicho em que o Banco Pan atua desde que o controlador era o empresário e apresentador Silvo Santos conta com mais 120 milhões de pessoas. Mas há uma parcela grande deles que ainda não tem conta em banco e podem se sentir atraídos por uma oferta digital completa e sem custo de tarifas.
Pesquisa da consultoria Locomotiva, divulgada no ano passado, estimou que 45 milhões de pessoas não têm conta em bancos. Esse contingente de pessoas movimentou R$ 850 bilhões, o equivalente ao PIB da Argentina e do Chile somados.
Mas, em contrapartida, o número de concorrentes também não é pequeno. E o Banco Pan é um retardatário nessa onda de bancos digitais. Entre os rivais, um deles é o Banco Neon, que tem entre seus investidores o BV (ex-Banco Votorantim) e o fundo americano General Atlantic. O Banco Original abocanha uma parte desse nicho. A Acesso também quer uma fatia deste mercado. E até mesmo o Nubank, que tem um posicionamento mais premium, vem conquistando clientes da classe C no Nordeste em razão da NuConta. “São tantos bancos digitais que não consigo nem afirmar qual é o foco de cada um”, diz Guimarães.
A carteira de crédito é de R$ 24,7 bilhões. Os empréstimos consignados representam 52% desse total e os financiamentos de veículos, 38%. E, além disso, ele é lucrativo. No segundo trimestre, o lucro atingiu R$ 144 milhões, uma alta de 22% em comparação ao mesmo período do ano passado.
O banco digital do Pan é uma conta corrente completa, que inclui outros serviços, como cartão de crédito e débito, empréstimo pessoal e limite emergencial. O atendimento é via chat no aplicativo.
No terceiro trimestre deste ano, o Banco Pan planeja novos serviços a esse cardápio. O principal deles é a autocontratação do empréstimo consignado – por clientes do banco ou não – sem a necessidade de intervenção humana. Será tudo digital.
O banco terá também uma plataforma de investimento de renda fixa, que será focada em produtos simples e conservadores, como um Certificado de Depósito Bancário (CDB) do próprio Pan. “Não adianta ter muita complexidade. Vamos ser diretos e simples”, afirma Guimarães.
Os próximos serviços a serem incorporados ao banco digital é o de seguros, por meio da Too Seguros (antiga Pan Seguros), e o AutoPan, que dá crédito pessoal para quem já tem carro pago ou tem espaço para tomar mais recursos. “O business de veículos é muito importante para nós. Ele origina R$ 500 milhões por mês. Nossa carteira é de mais de R$ 9 bilhões”, diz o CEO do Banco Pan.
O Banco Pan está investindo também em uma plataforma de educação financeira em seu banco digital em parceria com a startup Grão, da empreendedora Monica Saccarelli, fundadora da corretora Rico, comprada pelo XP no fim de 2016. “Desenvolvemos toda a parte de dicas para ensinar o cliente a guardar dinheiro para atingir certos objetivos”, diz Saccarelli.
A aproximação com startups é outro capítulo dessa nova fase digital do Pan. A parceria mais antiga é a com a Méliuz, startup mineira de cashbach, que lançou um cartão de crédito cobranded em 2019.
“Conversamos com mais de 12 bancos, eles foram os únicos que fizeram uma proposta comercial boa que permitia criar um cartão de crédito sem anuidade e com cashback de até 1,8% do gasto”, afirma André Amaral, diretor de estratégia da Méliuz.
Agora, o banco está desenvolvendo novas parcerias para ajudar a captar clientes para a conta digital. São os casos da Celcoin, aplicativo que permite carregar celulares com crédito pré-pagos e pagar contas, e a Mobills, um aplicativo de investimento pessoal.
As duas startups, que chegaram até o Banco Pan por meio do programa boostLAB do BTG Pactual, ganham um percentual para cada cliente que abrir uma conta na instituição financeira. “Acreditamos que há espaço para ampliar o intermediário”, afirma Guimarães.
No segundo semestre, os mais de 700 correspondentes bancários também vão entrar no jogo e começar a oferecer a conta digital do Banco Pan. A própria Grão está ajudando nesse processo. A startup, inspirada na americana Acorns, que ensina usuários a poupar mesmo que centavos, desenvolveu um projeto para o Pan.
A ideia é atrair para o aplicativo usuários que foram negativados quando quiseram comprar uma moto. Lá, eles aprendem a poupar para conseguir juntar dinheiro e dar entrada no bem. Quando tiverem os recursos, vão receber uma comunicação se querem dar entrada no financiamento. “Estamos fazendo esse teste há três semanas”, diz Saccarelli.
Mas a maior aposta em um intermediário para atrair clientes para o banco digital do Pan é com a Claro, que tem 58,6 milhões de assinantes de telefonia celular. “Eles vão ser um canal de venda de nossos produtos”, afirma Guimarães.
A contrapartida do Banco Pan é oferecer créditos para o uso dos celulares de forma gratuita ou com desconto. A operadora do grupo mexicano América Móvil, por sua vez, recebe um valor pela originação do cliente.
A parceria é semelhante a fechada pela TIM como o C6 Bank, anunciada no início de julho, que conseguiu atrair 200 mil clientes ao banco digital em apenas três semanas.
Os investidores estão acompanhando os passos do Banco Pan. Neste ano, as ações caem apenas 8,6%. Um sinal de que o mercado comprou a estratégia. Mas, agora, está esperando para ver se a entrega vai ser feita.