Os indicadores do quarto trimestre da economia dos Estados Unidos, anunciados nesta quinta-feira, 26 de janeiro, e a pequena recuperação já registrada em janeiro na zona do euro estão levando economistas a reavaliar o tamanho e a duração da recessão da economia global prevista para 2023.

A contração menor da economia americana, que desacelerou para uma taxa anual de crescimento (ainda relevante) de 2,9% no quarto trimestre, e as boas notícias da Europa – que está vivendo um inverno menos rigoroso, atenuando a ameaça de escassez de energia por causa da guerra na Ucrânia – podem compensar o efeito da inflação e das taxas de juros elevadas nas duas regiões e impedir que o mundo entre em uma recessão acentuada.

Essa possibilidade ganha mais força se a China conseguir evitar os efeitos da reabertura pós-pandêmica e acelerar seu crescimento econômico, o que ocorreria no segundo semestre deste ano.

Os números do PIB do quarto trimestre dos EUA, divulgados pelo Departamento de Comércio, trouxeram algumas surpresas. O índice de crescimento de 2,9% foi 0,1% acima do previsto pelo mercado, ante 3,2% registrados no trimestre anterior.

Os gastos com consumo, responsáveis por 68% do PIB americano, cresceram 2,1% entre outubro e dezembro. O investimento empresarial e os gastos do governo também contribuíram para a expansão do último trimestre.

Esses dados isolados, no entanto, não afastam o risco de recessão. As vendas no varejo, por exemplo, caíram no mês passado no ritmo mais acentuado de 2022. A produção manufatureira, por sua vez, registrou queda em novembro e dezembro. E o mercado imobiliário viu a venda de casas cair pelo 11º mês consecutivo.

Essa retração da economia americana se deve aos esforços do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, para conter a alta inflação por meio de rápidos aumentos nas taxas de juros.

A taxa de juros saiu de um patamar próximo a zero em março para uma faixa atual entre 4,25% e 4,5%. A inflação, que chegou a atingir 9,1% ao ano em junho – a maior alta em 41 anos no país – caiu em dezembro para 6,5%.

O cenário para 2023 nos EUA ficará um pouco mais claro na próxima semana, quando as autoridades do Fed fazem a primeira reunião do ano. A expectativa global é se vão acelerar ou desacelerar o aumento da taxa de juros.

O economista Joelson Sampaio, professor da FGV, afirma que é preciso acompanhar o desempenho do mercado de trabalho nos EUA para saber como o Fed vai conduzir os índices de aumentos das taxas de juros nos EUA.

Isso porque com um mercado de trabalho aquecido, há mais consumo e, por tabela, mais inflação. Em dezembro, o índice de desemprego nos EUA foi de apenas 3,5%.

“O Fed é muito sensível aos indicadores do mercado de trabalho, caso ele se mantenha aquecido, a tendência é de que o Fed continue subindo a taxa de juros até atingir a faixa de 5,25%, mesmo com inflação em queda”, afirma Sampaio.

Velho Continente busca a estabilidade

O otimismo na Europa se deve a uma tímida, mas inesperada, recuperação da produção econômica na zona do euro. A comparação com os EUA reforçou a confiança de que a recessão na Europa, se vier, será menor do que era esperado.

Na terça-feira, 24 de janeiro, o índice composto de produção na Europa da S&P Global subiu em janeiro de 49,3 pontos para 50,2 pontos - nos EUA, foi de 46,6 pontos. Quando o indicador está em 50 pontos, o sinal é de expansão, enquanto uma leitura abaixo desse nível indica uma contração.

“A estabilização da economia da zona do euro no início do ano aumenta a evidência de que a região pode escapar da recessão”, disse Chris Williamson, economista-chefe de negócios da S&P Global Market Intelligence.

A divergência sugere que, enquanto a economia dos EUA continua perdendo força, a da Europa pode estar se estabilizando, pelo menos por enquanto.

Até o fim do ano passado, a maioria dos economistas via a zona do euro com grande probabilidade de entrar em recessão em 2023.

Mas a combinação de um inverno ameno e medidas dos governos para encontrar novos fornecedores de gás natural ajudaram a segurar o baque na zona do euro.

O Banco Central Europeu (BCE), por sua vez, utiliza uma estratégia diferente para combater a inflação, que continua elevada, de 9,2% em dezembro.

As taxas de juros são de apenas 2,5% e o BCE resiste em aumentá-las de forma radical com medo de aprofundar o desemprego – o mercado de trabalho europeu é menos volátil que o dos EUA.

O mundo em compasso de espera

A aposta numa recessão mais branda nos dois lados do Atlântico se baseia no peso dos EUA na economia global.

Embora exista a possibilidade de as taxas de juros na zona do euro subirem ainda mais, as dos EUA podem estar perto do fim do seu ciclo de altas.

“O prolongamento da recessão dependerá muito de quando o Fed encontrar espaço para iniciar o corte de juros”, afirma Francisco Nobre, economista-chefe da XP.

Com isso, resta saber quando a provável recessão terá início e quanto tempo durará. O indicador geral de uma recessão é de dois trimestres de crescimento negativo do PIB, mas esse é apenas um indicador. Há situações em que duram pouco tempo, mas causam danos por longos períodos.

A recessão gerada pela crise financeira global de 2008, por exemplo, durou de dezembro de 2007 a junho de 2009, num total de 18 meses.

A recessão global mais recente, fruto da pandemia do novo coronavírus, durou apenas dois meses, de fevereiro de 2020 a abril de 2020. Mas seus efeitos estão sendo sentidos até hoje, em especial no Primeiro Mundo, desacostumado a conviver com inflação e juros elevados.