Grécia, Espanha e Portugal, os vilões do bloco monetário do euro durante a crise financeira de 2012, viraram o jogo e registraram crescimento econômico em 2023 equivalente a mais do dobro da média da União Europeia, que foi de apenas 0,5% ao longo do ano e de 0,3% no primeiro trimestre de 2024.
Os dados divulgados pela Eurostat (agência de estatísticas da União Europeia) reforçam uma constatação - a economia da Europa está crescendo em dois ritmos diferentes.
Um mais rápido, puxado por essas três nações do sul do continente. E outro, num ritmo próximo à estagnação, liderado pela Alemanha, cuja economia representa 25% do bloco europeu.
Espanha e Portugal, por exemplo, cresceram mais de três vezes em 2023 em relação à Alemanha, cuja economia avançou apenas 0,6% no ano passado. Na análise geral dos dados do bloco, nota-se que os países do sul do continente estão ocupando o espaço tradicional de nações do norte, mais ricas e conhecidas como “motores” do crescimento europeu.
Daí a surpresa de três nações que há uma década eram consideradas o patinho feio da União Europeia estarem ajudando a melhorar a economia do bloco, que saiu de uma recessão técnica (desaceleração de 0,1% nos dois últimos trimestres de 2023) para registrar um avanço de 0,3% nos primeiros três meses de 2024.
Há explicações macroeconômicas para essa diferenciação entre o ritmo de crescimento entre os países do bloco. Os três do sul do Velho Continente deixaram para trás uma crise de dívida que ameaçava a sobrevivência do euro como moeda única.
Durante anos, submeteram-se a programas de resgates capitaneados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelo Banco Central Europeu (BCE) para reduzir o déficit fiscal e o elevado endividamento. Os programas de austeridade não foram interrompidos nem durante o período de contração da economia global causado pela pandemia.
Mantendo as metas fiscais sob controle e adotando outras medidas de abertura econômica, como a redução da burocracia, da carga de impostos e de exigências para ampliar o mercado de trabalho, os resultados começaram a aparecer.
Em comum, esses três países guardaram algumas semelhanças nesse processo. Um deles foi de terem dobrado sua economia de serviços, em especial o turismo, que teve um grande boom após o fim da pandemia.
Grécia, Espanha e Portugal também se beneficiaram de parte de um pacote de estímulo de € 800 bilhões implementado pela União Europeia no período pós-pandemia.
Cada país, no entanto, trilhou caminhos com características próprias. A Grécia cresceu cerca do dobro da média da zona do euro no ano passado, impulsionada pelo aumento do investimento de empresas multinacionais, como a Microsoft e a Pfizer, pelo turismo recorde e pelos investimentos em energias renováveis.
Considerado o maior case de sucesso de recuperação fiscal e monetária da última década, a Grécia chegou a registrar uma queda no PIB de 25% em 2012. A economia começou a patinar a partir de 2008, piorou em 2010 e afundou de vez na crise em 2012, com taxa de desemprego chegando a 28%.
Após se submeter a três planos de resgate, que juntos somaram € 296 bilhões, o PIB do país cresceu 8,4% em 2021, 5,9% em 2022 e 2,2% no ano passado – números chineses se comparados à média da União Europeia (5,3% em 2021, 3,5% em 2022 e 0,5% no ano passado).
A economia da Espanha teve um crescimento surpreendente de 2,4% no primeiro trimestre de 2024 em comparação com o mesmo período do ano passado.
Portugal cresceu a uma taxa menor, de 1,4% no trimestre na comparação anual, puxado pelos setores de construção e hotelaria. Mas o avanço da economia em 2023, de 2,3%, refletiu o crescimento de exportações de bens e serviços em relação às importações por cinco trimestres consecutivos.
Estagnação alemã
Na outra ponta, os países do norte europeu continuam lutando para se reerguer. A economia da Alemanha está estagnada desde o início da pandemia, em 2020. Seu vasto setor industrial sofreu um duro golpe após o aumento nos preços da energia desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, desacelerando ano a ano.
Na prática, a Alemanha está pagando o preço de basear sua economia num modelo orientado para a exportação que dependia do comércio internacional e das cadeias de abastecimento globais, impactadas por conflitos geopolíticos e pelas crescentes tensões entre a China e os Estados Unidos – os seus dois principais parceiros comerciais.
O resultado foram dois anos de crescimento quase nulo, colocando o país no último lugar entre os seus pares do G7, os sete países mais ricos do mundo. Outras nações ricas do norte europeu, como França e Holanda, estão em situação melhor.
Segunda maior economia da zona do euro, a França registrou crescimento no primeiro trimestre de 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado, mas enfrenta desequilíbrio fiscal (5,5% do PIB) e alto endividamento (110% do PIB). A Holanda só recentemente saiu de uma recessão moderada que a atingiu no ano passado, quando a economia contraiu 1,1%.
Juntas, as economias alemã, francesa e holandesa representam cerca de 45% do PIB da zona do euro. Por isso, os indicadores da União Europeia dependem dessas nações do norte para acompanharem o desempenho dos Estados Unidos, baliza de comparação entre os países do Primeiro Mundo.
Enquanto Alemanha, França e Holanda se arrastam, as três nações do sul se encarregam de trazer boas notícias. Graças ao bom desempenho dos antigos vilões da zona do euro, o Banco Central Europeu prevê para junho o início do ciclo de corte das taxas de juros.