Alternativa à ampliação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o novo pacote fiscal ainda gera muitas dúvidas no mercado financeiro. Mas o fim da isenção de impostos sobre títulos e fundos incentivados é visto como praticamente certo - embora o histórico de rejeição do Congresso ponha essa certeza em xeque.

A primeira sinalização veio na noite de domingo, 8 de junho, quando o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou que o governo estudava tarifar em 5% os LCIs e LCAs — hoje isentos — como alternativa à elevação do IOF. Segundo o ministro, os títulos isentos deixarão de ser isentos, mas continuarão bastante incentivados em comparação com outros papéis de renda fixa, que têm imposto de renda entre 15% e 22,5%.

Ao longo de segunda-feira, 9, novas informações foram sendo divulgadas, indicando que a tarifa pode alcançar também outros produtos, como fundos imobiliários, Fiagros, CRIs, CRAs e debêntures incentivadas.

O pacote fiscal deve ser apresentado ainda nesta semana, em forma de Medida Provisória, e, posteriormente, debatido no Congresso para se tornar projeto de lei.

“Nos meus vinte anos de mercado, sempre ouvi que o governo tinha interesse em taxar fundos imobiliários, mas sempre recuou. Só que, agora, infelizmente, é a primeira vez que parece que vem de uma maneira mais assertiva, mais firme”, diz Marcelo Michaluá, sócio-fundador e Co-CEO da RB Asset.

Nos últimos anos, a isenção, aliada a um cenário de juro baixo, tem sido um ativo importante especialmente para os CRIs e CRAs, com o varejo aumentando em 656% o volume de investimentos nesses produtos desde 2020. O racional por trás é que, quanto maior o rendimento bruto, maior é a vantagem da isenção tributária, já que o imposto é sobre os ganhos líquidos.

“Venho observando que é uma tentativa antiga do governo de tributar esses ativos”, afirma Felipe Ribeiro, sócio e diretor de investimentos alternativos do Clube FII. Com a expectativa de que as taxas passem a valer apenas no ano que vem, Ribeiro espera por um aumento vertiginoso no volume de emissões até o fim de dezembro.

“Deve ser algo nunca visto antes. Será a última chamada para esses CRIs isentos. Uma parcela desses CRIs deve ir para tesourarias de banco para depois serem negociados. Esses ativos vão valer mais do que os que forem emitidos depois, por serem isentos”, afirma. Para ele, o volume pode até superar as emissões recordes do ano passado, de R$ 68,8 bilhões.

Michaluá acredita que a mesma lógica deve se valer para os CRAs, debêntures incentivadas, LCAs e LCIs. "Me parece que tudo o que tiver de oportunidade será emitido até o dia 30 de dezembro. Ainda tem esses seis meses, quase, para uma corrida para aproveitar a janela da isenção".

Após esse período, Ribeiro projeta uma seca nesse mercado, hoje concentrado nas mãos de pessoas físicas. Mas, para os fundos imobiliários, com cotas perpétuas, alguns investidores já se antecipam, vendendo participação.

Nesta segunda, o IFIX — principal índice de FIIs da bolsa — caiu 0,96%. “Com o tributo de 5%, o valor das cotas precisaria ser reajustado para manter o mesmo dividend yield”, diz Ribeiro.

Apesar da expectativa de que as regras passem a valer apenas em 2026, Eric Visini, sócio da área Tributária da TozziniFreire Advogados, avalia que a possibilidade de as taxas entrarem em vigor ainda neste ano é significativa.

“Eu diria que há uma chance de 50%. É possível que exista aí algum impacto já para esse ano, tendo em vista especialmente o ritmo do governo de obter um ingresso de recursos ainda para este ano”, diz o tributarista.

O advogado, no entanto, vê baixa probabilidade de a medida ter efeito retroativo, passando a incidir sobre títulos já emitidos. “O governo poderia até tentar, mas isso seria afastado por medidas judiciais”, afirma Visini.

Apesar de a medida ter gerado alguma preocupação em parte do mercado, quem defendia que a isenção gerava uma competição injusta para quem não tinha o benefício viu uma redução de assimetria.

“Deve contribuir [com a captação]. Mas ainda há uma diferença grande de tributação”, disse um gestor de fundos multimercados — hoje taxados em 15% a 22,5%.

Marcos Piellusch, professor de Finanças da FIA, avalia que, embora tire parte da atratividade, o imposto de 5% ainda representa um incentivo significativo em relação aos outros produtos. “Perde atratividade, mas não deixa de ser atrativo.”

Segundo ele, a taxa proposta não anula a chance de algumas empresas conseguirem emitir abaixo do CDI, como nas ofertas recentes do CRI da Allos e, no ano passado, das debêntures incentivadas da Vale. “Se o LCI pagar 99% ou 95% do CDI, o retorno ainda vai ser maior do que se você aplicasse num CDB, por exemplo, a 100% do CDI. Começa a ficar mais difícil se pagar menos de 90%.”

Para Michaluá, da RB, os 5% ainda representam um incentivo. O risco é essa taxa aumentar gradualmente. “Fica a dúvida e a preocupação de que, a partir do momento que você começa a taxar, você pode crescer essa alíquota no tempo. Quem diz que o governo não pode subir de 5% para 7%, para 10%?”