A agenda de investimentos públicos e privados em infraestrutura deu um salto desde a mudança de governo, no ano passado, com a previsão de leilões de concessões públicas, parcerias público-privadas (PPP) e abertura de financiamentos pelo BNDES, entre outras iniciativas.
Um relatório da consultoria Inter.B, recém-divulgado, reforça essa tendência, com a previsão de que os investimentos totais no setor atingirão R$ 215,8 bilhões este ano, aumento de 11% em relação a 2023.
As boas notícias da Carta de Infraestrutura - relatório periódico da Inter.B, que nesta edição traz novas estimativas de investimento em infraestrutura em 2023 e as primeiras projeções para 2024 -, no entanto, param por aí.
O estudo mostra que, ainda que em 2023 o governo federal tenha obtido espaço fiscal ampliado por conta da PEC da Transição, e lançado em agosto o novo PAC, os investimentos públicos em infraestrutura no âmbito federal não avançaram, com a significativa exceção de rodovias.
Mesmo com aumento de 14,47% dos aportes públicos e de 9,96% dos privados previstos para este ano, os investimentos em infraestrutura ainda ficarão em apenas 1,87% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2024, longe da meta anual recorrente de 4% do PIB, considerada ideal para modernizar a infraestrutura do País.
“O fato é que há mais de três décadas não se investe o suficiente para responder às demandas do bem-estar da população e os requisitos básicos de uma economia competitiva”, diz o relatório, apontando entre as brechas mais pronunciadas o setor de transportes – em todos os modais, e particularmente em mobilidade urbana – e saneamento básico.
E nada indica que esse fosso entre a faixa de 2% para os 4% do PIB necessários diminuirá no curto prazo. O setor privado, por exemplo, já faz a sua parte, contribuindo com 65% dos investimentos totais em infraestrutura no País – acima da média mundial de 50%.
Com isso, a necessidade de dobrar esses investimentos em relação ao PIB esbarra principalmente no setor público, incluindo os governos federal, estaduais e municipais.
O relatório da Inter.B aponta dois fatores que impedem a ampliação dos investimentos públicos. Um deles são as restrições fiscais do Executivo, que de acordo com o documento assumiram uma natureza estrutural.
“O problema do espaço fiscal limitado do governo para investimentos em infraestrutura não é simples porque não há previsão de ampliar esse espaço nos próximos anos, ao contrário, a tendência é de uma pressão maior sobre o Executivo por gastos em outras áreas”, diz Claudio Frischtak, sócio da Inter.B e um dos responsáveis pelo relatório.
Outro fator chama a atenção por envolver uma questão política bastante atual: os efeitos nefastos das emendas parlamentares.
Segundo o relatório, a modernização da infraestrutura requer planejamento, correta priorização e capacidade de boa execução. Mas as emendas parlamentares vão na contramão da boa gestão dos investimentos públicos.
“Um agravante das emendas parlamentares é que boa parte não está prevista no planejamento e priorização de gastos do governo, e pouco se sabe como são executadas, gerando desperdício de recursos e baixo retorno para a sociedade”, diz Frischtak.
Ele aponta ainda outro efeito que limita os investimentos públicos: os problemas de governança do Executivo, que não têm relação com mobilização de recursos.
“Precisamos melhorar o planejamento, priorização e execução desses investimentos, como as grandes obras que ficam pelo caminho, não só a paralisação, como os atrasos dessas obras”, diz, citando o caso da Ferrovia Transnordestina, obra iniciada em 2006 e que tem apenas metade do trajeto concluído, com previsão de terminar apenas em 2028.
Avanço do setor privado
As dificuldades dos governos federal, estaduais e municipais de aportar investimentos no setor não são recentes.
O Brasil não consegue ultrapassar a barreira de 2% do PIB de investimentos em infraestrutura desde 2015, último ano antes do início da gravíssima crise econômica de 2016-2017, que secou recursos do Estado.
Os investimentos privados em infraestrutura foram ocupando o espaço, expandindo de 43,4% em 2010 para 69,9% em 2020, até se estabilizar em torno de 65% nos últimos anos.
Um dado preocupante é a baixa perspectiva de os setores público e privado conseguirem avançar nos investimentos em infraestrutura além da faixa de 2% do PIB.
O estudo estima que, dada as amarras que enfrenta, o setor público poderia, no limite, ampliar os investimentos em 0,10% a 0,15% do PIB por um período entre 3 e 4 anos para chegar a 1% do PIB.
Já o setor privado teria de necessariamente ampliar sua participação para 75% de todos os investimentos em infraestrutura para atingir os 3% do PIB necessários para completar a meta geral de 4% do PIB.
Para Frischtak, há excesso de demanda de investimento em infraestrutura. Por isso, segundo ele, não só pela restrição de investimento público, o setor privado tem potencial de exercer um papel maior.
“Tem espaço para aumentar, principalmente em áreas que combinam segurança jurídica com previsibilidade regulatória, o segmento de transmissão de energia é um exemplo bem-sucedido”, afirma.
Entre as sugestões apontadas pelo relatório para ampliar os investimentos, estão a necessidade de perseguir uma agenda ampla que combine oferta de segurança jurídica para atuação privada no setor, reforço da independência das agências, evitando sua politização, e introdução de medidas para romper com paralisia de obras.