A inflação na Argentina, que por muitos anos foi tratada como um problema crônico do país vizinho, demonstra sinais de ter sido domada pelo governo do presidente Javier Milei, ao recentemente ficar abaixo de 2% pela primeira vez em cinco anos.
O Instituto Nacional de Estadística y Censos de Argentina (Indec) informou que o índice de preços ao consumidor argentino apresentou uma alta de 1,5% em maio, em base anual, uma desaceleração ante a alta de 2,8% de abril.
Foi a menor leitura do indicador desde abril de 2020. Se excluir o período da Covid-19, o índice de maio foi o mais baixo desde novembro de 2017, com o resultado sendo bastante influenciado por itens sazonais, segundo o BTG Pactual.
“Os preços sazonais foram cruciais para atingir essa marca de 1,5%, pois caíram 2,7% em maio”, diz Andres Borenstein, analista do BTG Pactual, em relatório. Mas ele destaca que o núcleo do índice também evoluiu positivamente, ao cair 1 ponto percentual na comparação mensal, a 2,2%, alcançando o menor valor desde maio de 2020, período marcado pelos efeitos do lockdown da pandemia.
O resultado representa uma grande vitória para o governo Milei, que espera capitalizar esses resultados nas eleições legislativas de outubro para crescer sua base no Congresso Nacional para seguir com sua agenda de ajustes e reformas – atualmente, o governo está em minoria, dificultando o trabalho de passar reformas.
“Com essa inflação de maio em 1,5%, o governo Milei consegue aparentemente passar pelo primeiro grande desafio dele, que era derrubar a inflação e, consequentemente, manter a população argentina comprada na estratégia dele”, diz Luis Otávio Leal, sócio e economista chefe da G5 Partners, ao NeoFeed.
Milei foi eleito presidente em 2023 com a promessa de travar uma guerra contra a inflação crônica na Argentina, que quando tomou posse, em dezembro do mesmo ano, estava em 25,5%, em base mensal.
Para isso, adotou uma dura política de austeridade e desregulamentação, paralisando obras e investimentos, além de ajustes nos gastos sociais, o que resultou em turbulência política no país e receios de enfraquecimento da economia.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que a economia argentina vai crescer cerca de 5,5% neste ano, se recuperando da recessão vista no ano passado. No entanto, economistas alertam que o crescimento estagnou nos últimos meses e os índices de produtividade e investimentos permanecem fracos – o BTG Pactual aponta no relatório sobre a inflação de maio que a economia mais fraca está ajudando no processo de desinflação.
“A única forma de manter a população engajada no plano de austeridade do governo era conseguir uma redução rápida e forte da inflação da Argentina, que parece que vai ser atingido”, diz Leal. “Os números de inflação reforçam a perspectiva de que Milei pode conquistar mais espaço no Congresso.”
O BTG Pactual projeta que a inflação acumulada em 12 meses feche 2025 em 28%, recuando dos 43,5% apurados em maio, destacando que existe a possibilidade de o índice fechar o ano ainda mais baixo.
Para Leal, com a inflação no nível atual abrindo caminho para a ampliação da base governista, fica faltando resolver a questão cambial. Mesmo com a injeção de US$ 20 bilhões em recursos pelo FMI, a Argentina continua com problema de reservas, gerando dificuldades para manter o câmbio flutuante, imprescindível para a economia voltar ao normal.
“Enquanto a Argentina não conseguir acumular reservas suficientes para liberar o câmbio sem representar uma grande desvalorização, consequentemente prejudicando a convergência da inflação para níveis mais baixos, o projeto econômico do Milei ainda fica incompleto”, diz.
Apesar dos desafios de curto prazo para manter os preços estabilizados, os observadores externos seguem otimistas com os rumos da Argentina, se sentindo mais seguros com as perspectivas econômicas.
“A guerra de Milei contra a inflação vai além dos números — trata-se de liberar o potencial da Argentina”, afirma Malcolm Dorson, chefe de estratégias de mercados emergentes da Global X, ao NeoFeed. “Com a inflação mensal agora controlada, as portas estão se abrindo para o capital estrangeiro e o crescimento sustentável de longo prazo.”