Além dos subsídios na conta de luz, que custaram R$ 37,4 bilhões no ano passado aos consumidores cativos de eletricidade do Sistema Interligado Nacional (SIN), a aprovação do projeto de lei n° 9.543/2018, pela Câmara dos Deputados, que cria a tarifa social de água e esgoto para famílias de baixa renda, levantou temor de um novo encargo na conta mensal dos brasileiros.

Esse risco, por enquanto, está afastado – pelo menos até a aprovação definitiva do PL, que ainda vai voltar ao Senado. Isso porque o custo do subsídio, que deverá ficar entre R$ 1,8 bilhão e R$ 5,5 bilhões, será bancado integralmente pela União, de acordo com a versão do texto aprovado pelos deputados.

Ou seja, nem consumidores de outras faixas de renda nem as concessionárias serão impactadas diretamente.

Como já existe tarifa social de água e esgoto nos contratos atuais, que podem ter regulação estadual e municipal, a Abcon (sindicato das concessionárias privadas de água e esgoto) elogiou o projeto de lei, por ampliar e, por tabela, uniformizar os benefícios.

“O PL traz um avanço no sentido possibilitar ao governo federal, junto com a concessionária, expandir a faixa de tarifa social”, afirma Percy Soares Neto, diretor executivo da Abcon, ao NeoFeed.

O desconto previsto na conta de água pode chegar até 50% para 34 milhões de famílias de baixa renda. O custo do subsídio será bancado por meio da Conta de Universalização de Acesso à Água, que será custeada por dotações orçamentárias do Executivo e multas aplicadas pela agência reguladora.

Terão direito à nova tarifa social os usuários com renda per capita (por pessoa da casa) de até meio salário-mínimo nacional (R$ 706), que sejam inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) ou em cuja família haja uma pessoa com deficiência e/ou um idoso de baixa renda com 65 anos ou mais.

Em qualquer situação, a tarifa mensal diferenciada valerá para os primeiros 15 m³ por residência habilitada ao benefício. O excedente de consumo será cobrado com os valores da tarifa regular.

O PL foi aprovado por 325 votos a favor, 97 contra e uma abstenção e agora retorna para os senadores após passar por modificações. Nada impede, porém, que no Senado ou mesmo na regulamentação posterior à aprovação as regras mudem, jogando a conta para consumidores de outras faixas de renda ou concessionárias.

De acordo com o relator do PL, deputado Pedro Campos (PSB-PE), a criação da tarifa social de água e esgoto “pode contribuir para a redução da inadimplência e para o aumento da eficiência do uso da água, incentivando as famílias a consumirem de forma mais consciente e sustentável”.

Regulação

A oposição, no entanto, votou contra. O deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), chamou a atenção para a dúvida de como esse subsídio será pago, citando o exemplo dos encargos da tarifa de energia elétrica. “A regulação da energia elétrica é federal, mas a de água e esgoto pode ser estadual ou municipal, e não está claro como isso será resolvido”, disse.

Para Soares, da Abcon, o projeto de lei ajuda a dirimir essa dúvida quanto à comparação com o setor elétrico que, por ser de concessão federal, já conta com um fundo de equalização de tarifa.

“O setor de saneamento não tinha como equalizar essa questão da tarifa social por estar ligado a entes diferentes, talvez esse seja o maior avanço desse projeto de lei”, afirmou o dirigente da Abcon, lembrando que o PL amarrou essa pendência sem mexer nos contratos existentes nem onerando os consumidores de outras faixas de renda.

Outros especialistas ouvidos pelo NeoFeed, no entanto, divergem sobre as vantagens e até a constitucionalidade do projeto de lei.

Wladimir Antonio Ribeiro, sócio da Manesco, Ramires, Perez, e Azevedo Marques Sociedade de Advogados, diz que o mercado já esperava essa equiparação da tarifa social e elogiou o PL, pois já define um modelo, evitando insegurança jurídica para os contratos futuros.

“O impacto desse projeto é limitado ou inexistente do ponto de vista econômico-financeiro, pois a tarifa social atual de águae esgoto é mais generosa do que a prevista nessa lei”, assegurou.

Segundo ele, o impacto maior no setor ocorrerá quando a reforma tributária entrar em vigor. Isso porque o setor de saneamento diferentemente de outros serviços públicos, não é hoje tributado.

“Quando a reforma entrar em vigor, a tributação do setor de saneamento deverá causar impacto nas tarifas”, advertiu.

Já o advogado Renato Fernandes de Castro, do escritório Almeida Prado & Hoffmann, diz que Legislativo federal extrapolou seus poderes constitucionais ao aprovar o projeto de lei.

“Não cabe ao Congresso Nacional legislar sobre saneamento básico, é função dos municípios definirem, por meio dos órgãos reguladores competentes, as tarifas dos serviços públicos, assim como os critérios de enquadramento das categorias de usuários”, disse Castro.