O Brasil fez um bom trabalho no controle da inflação, mas precisa ficar atento ao equilíbrio fiscal se pretende atrair investidores estrangeiros para o mercado de capitais. O alerta é do espanhol Alex Fusté, economista-chefe do Andbank, grupo financeiro especializado em private banking.

Com sede em Andorra e presente em 11 países, o Andbank detém o equivalente a R$ 210 bilhões sob gestão no mundo. No Brasil, o private banking também operava um banco. Mas a licença bancária foi vendida recentemente para a fintech Creditas. Após a conclusão da venda pelo Banco Central, o grupo financeiro vai concentrar sua operação no País como distribuidor de títulos e valores mobiliários (DTVM) e com uma gestora.

Em visita ao Brasil para encontros com clientes e parceiros, Fusté conversou com o NeoFeed sobre controle de inflação, política monetária brasileira e o impacto que a decisão do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) de prolongar por mais tempo os juros em níveis elevados está causando na economia global.

O economista-chefe da instituição europeia teceu elogios à política monetária do Banco Central brasileiro para o controle da inflação. Disse que o Brasil está bem posicionado no mundo com seu superávit comercial que, segundo ele, é fruto do superciclo de commodities e do aumento do preço de energia. Mas Fusté alertou que o governo precisa ficar atento à questão fiscal para atrair investidores externos.

“Para o Brasil atrair mais investimentos para o mercado de capitais, o investidor externo precisa de mais clareza se a questão fiscal está realmente controlada e se não há risco de crise de dívida ou de crise cambial no radar”, diz Fusté.

Segundo ele, o País dispõe de amplo superávit comercial, mas o saldo de capital, entre o que entra e o que sai, ainda é deficitário. “Se o Brasil corrigir a questão fiscal vai desfrutar de um círculo virtuoso, que é uma balança comercial e uma balança de capitais positivas.”

Fusté acredita que a política de juros altos mantidos por mais tempo pelo Fed vai levar a uma desaceleração inevitável da economia americana. Ele aponta dois fatores. “Primeiro, a verticalidade no câmbio monetário tem sido muito intensa, além disso, o Fed tem US$ 4,5 trilhões de títulos para vender”, aponta.

Seu raciocínio é que, quando o Fed vende esses títulos de curto prazo o preço cai e aumenta a taxa de títulos de longo prazo, causando um efeito no custo de financiamento de longo prazo das empresas e das hipotecas. “Portanto, haverá menos liquidez, e esse efeito deve ocorrer num prazo entre nove e 12 meses.”

A desaceleração americana, de acordo com Fusté, causará impacto na economia global. Mas ele acredita que o Brasil será menos afetado. “O Brasil continua a ter uma das taxas de juros reais mais altas do mundo, isso significa que há espaço para continuar reduzindo a Selic”, diz ele. "O Andbank calcula que as taxas de juros cairão para algo em torno de 9% e 9,5% no final do próximo ano ou no início de 2025."

Gênio da lâmpada

O economista espanhol elogiou a política monetária do Banco Central, afirmando que o trabalho bem-feito durante o ciclo de inflação e juros altos está agora colhendo resultados. Ele citou a importância de conter a inflação, comparando o Brasil com a Argentina.

“A inflação é como o gênio da lâmpada, uma vez que sai da garrafa, é difícil colocá-lo de volta dentro, porque é isso que as autoridades monetárias têm que fazer e quem age primeiro e age com mais intensidade, como o Brasil, é aquele que tem mais garantias de sucesso”, observa.

Ele diz que o grande beneficiário dessa estratégia tem sido a moeda brasileira, que segundo ele permitiu ao País importar deflação. “Se você não controla a inflação a moeda se desvaloriza, e o efeito disso é importar mais inflação e acelerar o processo inflacionário interno”, afirma.

A Argentina, com inflação anual em 140%, é o melhor exemplo, diz Fusté. “As taxas reais de juros lá são muito negativas, o que gera o colapso da moeda e importa nova inflação.”

O problema se agrava na Argentina porque a impressão é que os políticos não querem estabilizar a economia, o que exigiria forte ajuste fiscal, acabando com o sistema de subsídios. “Mas isso não traz votos”, lamenta, acrescentando que o ciclo se completa com pedidos de empréstimos seguidos de calotes.

Fusté também se mostrou pessimista em relação à China. Segundo ele, o milagre chinês já terminou há muitos anos e não há indícios de que retornará.

"Os investidores estrangeiros perderam a confiança em investir no mercado de capitais chinês, tanto que têm ocorrido enormes saídas de fluxos de capital, por isso a depreciação do yuan”, afirma. Fusté diz que o governo é o principal culpado, pois está obrigando os bancos privados a não aceitarem ingressos ou solicitações de investidores nacionais para trocarem yuans por dólares.

Ele cita o caso de empresas estrangeiras que levam dólares para o país para operar uma fábrica, por exemplo. “O empresário compra yuans para pagar aluguel do espaço e salários dos funcionários, mas na hora de trocar os yuans por dólares, o governo bloqueia essa operação”, diz.

Segundo Fusté, a estratégia do capital externo para aproveitar o mercado consumidor chinês não é mais investir no país, e sim no Vietnã. “É isso que está acontecendo, a China entrou num território onde as reformas são antimercado.”