Inflação é tema dominante nas duas maiores economias do mundo e no Brasil em semana mais curta pelo feriado do Dia de Nossa Senhora Aparecida, na quinta-feira, 12 de outubro. A interrupção dos negócios locais na quinta-feira e a queda na liquidez na sexta pós-feriado recomendam cautela. A atualização de dados, sobretudo nos EUA e China, amplia riscos para investidores já ressabiados pela intensa volatilidade nos preços dos ativos.
A probabilidade de recrudescimento na escalada dos juros americanos não é desprezível e pode promover mais estragos nas bolsas de valores e no câmbio internacional, onde o vigor do dólar abate todas as moedas. Maior desvalorização é reservada às emergentes. E o real não escapa.
Após três meses no patamar de R$ 4, o dólar escalou até R$ 5,18 na quinta-feira, 5 de outubro, preço mais elevado em sete meses. Ganhos acumulados do Ibovespa derreteram numa sucessão de pregões apáticos e no embalo da migração de investidores estrangeiros para outros mercados e recolhimento dos locais – ainda atraídos pela renda fixa bem remunerada.
É improvável uma mudança do cenário local de agenda esvaziada no Brasil, onde o IPCA de setembro será divulgado na quarta-feira, 11 de outubro. O indicador deve avançar de 4,61% em 12 meses até agosto, para 5,26% até setembro, aponta a LCA Consultores. Esse ajuste não justifica, porém, desvio de rota pelo Copom já comprometido com mais cortes da Selic.
No calendário norte-americano uma profusão de informações sobre inflação poderá afetar os ativos, a partir de revisões de apostas para decisões do Federal Reserve (Fed) sobre juros em novembro e dezembro.
O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) dos EUA de setembro sai na quinta-feira de feriado no Brasil e após a publicação na quarta-feira, 11 de outubro, da ata do Comitê Federal de Mercado Aberto referente à última reunião do colegiado que manteve a taxa básica na faixa de 5,25% a 5,50% – nível mais elevado em 22 anos.
Analistas internacionais estimam para o IPC americano variação mensal de 0,3% e de 3,6% em 12 meses até setembro – ligeiramente inferior aos 3,7% observados até agosto. O núcleo da inflação, que exclui preços de alimentos e energia, também deve recuar de 4,3% até agosto, para 4,1% até setembro.
Na sexta, 13 de outubro, será divulgada pesquisa da Universidade de Michigan com projeções para inflação de 1 e 5 anos à frente. Na sondagem publicada em setembro, a expectativa era de, respectivamente, 3,2% e 2,8%. Embora declinante, a inflação americana segue bem acima da meta de 2%.
Sem impacto líquido e certo nos mercados, a inflação ao consumidor e ao produtor na China será publicada na quinta, 12 de outubro. E a repercussão desses indicadores pode ser reforçada, porém, por dados da balança comercial e crédito – sempre revelador sobre incentivos de Pequim à atividade.
Guinada histórica do juro real americano
No universo dos investimentos impera, contudo, a atração exercida pelos Treasuries, graças ao baixo risco e ao ganho real embutido nas taxas de retorno que saíram, em meses, de níveis extraordinariamente negativos para positivos e crescentes. E sem sinal de queda pela frente.
Em junho de 2022, quando o IPC norte-americano alcançou 9,1% em 12 meses, o retorno dos Treasuries de 10 anos era 3%. Negativo em termos reais em mais de 5%. Em setembro deste ano, a taxa alcançou 4,6%, ante inflação esperada de 3,6%. Nos últimos dias, a taxa atingiu 4,8%. De novo, a maior desde 2007.
O juro real americano é nanico, ante 6,5% ou 7% oferecido pelo Brasil em título de prazo semelhante. A perspectiva por aqui é de queda, mas a médio e longo prazo. Insuficiente para ofuscar o interesse de estrangeiros por aplicações no país, onde os recursos internalizados podem transitar da renda fixa para ações.
De todo modo, o nível dos juros – elevados aqui e em alta lá fora – interferem no comportamento das bolsas, aponta a estrategista de ações da XP, Jennie Li.
Em conversa com a Coluna sobre a movimentação dos estrangeiros na B3, ela observa que a bolsa brasileira continua alvo de interesse. Porém, o cenário macroeconômico global de maior aversão ao risco levou investidores a buscar alternativas, observa a economista.
Esse é o fator mais relevante a debandada de estrangeiros da bolsa brasileira. Em 2022, a injeção líquida na B3 aproximou-se de R$ 120 bilhões – um recorde. Neste ano, os ingressos acumulados no ano ultrapassaram R$ 23 bilhões em julho, mas declinaram a menos de R$ 10 bilhões em setembro. E, em dois pregões de outubro, o saldo caiu a pouco mais de R$ 8 bilhões.
A estrategista da XP lembra que a alta das taxas nos EUA tem implicação no mundo inteiro. Porém, ocorreu um aumento na correlação entre as taxas longas locais e as norte-americanas. “Movimento que afetou o ‘valuation’ das empresas lá e aqui”.
Jennie Li avalia que a questão fiscal no Brasil – focada neste momento no cumprimento da meta fiscal zero em 2024 ou eventual alteração – é um risco monitorado pelo investidor estrangeiro. Entretanto, pesquisa XP realizada em no fim de setembro mostra que a alta dos juros americanos se tornou um risco preponderante para as decisões de investimento.
De agosto para setembro, o apetite dos estrangeiros por ações brasileiras diminuiu, mas discretamente. A parcela de investidores que planejam reduzir exposição em Brasil passou de 11% para 15%.
A parcela dos investidores que espera que o Ibovespa supere 120 mil pontos até o fim do ano caiu de 76% para 45% também de agosto para setembro. A média das estimativas é de que o índice atingirá cerca de 118 mil pontos.
Existem, porém, gatilhos que podem patrocinar revisões de carteiras. “E o mais relevante, no momento, é um discurso do Fed mais brando que o higher for longer, sinal de juro mais alto por mais tempo, acenado pelo comando do banco. Mas não é isso o que estamos vendo”, alerta a estrategista.