A 140 quilômetros de São Paulo, Amparo sempre foi tida apenas como “corredor de passagem” para os turistas rumo a Serra Negra. Apesar de sua localização privilegiada na Serra da Mantiqueira, a cidade de 70 mil habitantes nunca chamou a atenção dos forasteiros. Mas duas famílias tradicionais da região, gigantes em seus negócios, se uniram para tornar o lugar digno de parada. E a estratégia encontrada por elas foi conquistar os viajantes pelo estômago.

De um lado, os Rezende, donos da Fazenda Atalaia, produtora de laticínios e famosa por seu queijo Tulha, já eleito o melhor do mundo. E, do outro, os Beira, proprietários da Química Amparo, da qual faz parte a marca Ypê, de produtos de higiene e limpeza, que cultivam em suas terras o café Flor da Montanha. Com um investimento de R$ 300 mil, em fevereiro, lançaram a Casa Origem, um misto de empório e restaurante, comandada pela chef Eduarda Botton. 

“Era difícil provar que Amparo não é corredor para outras localidades se a cidade não oferecia nada que valesse a pena parar para ver”, diz Paulo José Matta de Rezende, filho, 59 anos, neto dos fundadores da Fazenda Atalaia, ao NeoFeed. “A partir do momento que você começa a abrir espaços que chamam a atenção, a cidade ganha uma dimensão maior. E é isso que queremos com a Casa Origem”.

Nas prateleiras do estabelecimento é possível achar um pouco de tudo que é produzido no terroir da região. “Unir as forças das marcas dentro da Casa Origem nos permitiu criar um espaço que não é apenas um ponto de venda, mas um ambiente onde os consumidores podem vivenciar e degustar produtos que traduzem a cultura e a excelência da nossa região”, afirma Raul Caleffi, gerente do Café Flor da Montanha, ao NeoFeed. “Esse conceito fortalece a identidade de ambos os negócios e reforça a conexão entre campo e cidade”.

Os donos do negócio já sonham em alçar voos mais altos. Eles pretendem tornar os produtos made in Amparo conhecidos em outras cidades do Brasil. E, esse movimento, deve passar ao largo da internet. A vontade é inaugurar filias físicas da Casa Origem pelo País. 

“Com a boa recepção do projeto, já estamos avaliando formas de expandir o conceito e aprimorar ainda mais a experiência do consumidor”, diz Caleffi. “À medida que formos amadurecendo a proposta e identificando novas oportunidades, não descartamos a possibilidade de replicar esse modelo em outras localidades estratégicas.”

Ao que Rezende completa: “É preciso pensar na logística e na produção, mas tudo isso é viável. Espaço não falta”. Não mesmo. Na onda global de valorização dos produtos naturais e celebração das tradições, os alimentos artesanais são cada vez mais procurados.

Para se ter ideia, os queijos feitos com os cuidados de antigamente já representam 20% do mercado brasileiro. E isso é muita coisa. Conforme dados da Embrapa, o Brasil produz anualmente um milhão de toneladas de queijo, de todos os tipos. 

Os donos da Casa Origem sonham em levar o negócio para outras cidades brasileiras (Foto: Divulgação)

O queijo Tulha foi eleito em 2016, o melhor do mundo. Foi o primeiro brasileiro a ganhar uma medalha no World Cheese Awards (Foto: Divulgação)

O café Flor da Montanha chegou ao mercado junto com a Casa Origem (Foto: Divulgação)

Datada de 1870, a Fazenda Atalaia se dedicou, originalmente, apenas ao café. Ao longo do tempo, conforme a propriedade passava de geração em geração, houve uma diversificação das atividades. Em meados dos anos 2000, os herdeiros e atuais proprietários, Paulo, Rosana e José Rezende decidiram produzir queijo.

A decisão não poderia ter sido mais acertada. Em 2016, o  Queijo Tulha, foi o primeiro produto brasileiro a conquistar uma medalha de ouro no World Cheese Awards, o Oscar da indústria queijeira, organizado pela editora espanhola Guild of Fine Food. 

Produzido a partir de uma massa cozida com leite de vaca tipo A, com baixo teor de gordura e três tipos de maturação (oito, 12 e 18 meses), ele tem esse nome porque é fabricado na antiga tulha de café da fazenda. Depois dele, vieram outros. O Mogiana, maturado por 120 dias, e o Mantiqueira, também estão entre os mais vendidos. 

Ao todo, a fazenda produz 13 variedades de maturados, além de outros produtos derivados do leite, como requeijão, yogurt e queijos frescos.  Hoje, são produzidos cerca de 10 mil litros de leite por dia, que resultam em aproximadamente uma tonelada de queijo. O consagrado Tulha representa cerca de 25% do faturamento da Atalaia.

Para chegar a esse tamanho, a Atalaia precisou se profissionalizar, fase que ainda não chegou ao fim. Esse processo, porém, não tirou o toque artesanal da produção feita por lá, garante José.

“As pessoas têm a visão de que quem trabalha no campo tem de sempre se manter pequeno, mas isso não é verdade”, defende. “A nossa missão é, além de ter produtos do melhor padrão possível, dar uma boa vida aos nossos funcionários, que só se beneficiam dessa profissionalização”.

Com o Café Flor da Montanha, não é muito diferente. “A nossa produção começou há 35 anos. Com a incorporação Fazenda Imigrantes em 2012, nós aumentamos a área produzida [hoje são 320 hectares] e iniciamos os cultivos de novas variedades, sempre tendo como princípio a valorização das origens e da excelência no cultivo”, afirma Caleffi. “A oficialização da marca e sua chegada ao mercado aconteceram agora, em fevereiro, com o lançamento na Casa Origem."

Antes, o produto só era vendido diretamente na fazenda da família, para um público composto sobretudo pro amparenses. A Fazenda Atalaia já tem uma loja da marca em Campinas, também no interior paulista. Os Rezende vendem ainda seus produtos na internet. Em abril, os Beira lançam sua primeira cafeteria. Onde? Em Amparo, claro.