ITAPETINGA (BA) - Bastou apenas uma safra para a baunilha cultivada pelo engenheiro agrônomo Aderbal de Castro, em Itapetinga, no centro-sul da Bahia, conquistar clientes como o grupo Fasano, os hotéis Rosewood e Grand Hyatt, e os premiados confeiteiros Vivianne Wakuda, Lucas Corazza e Pedro Frade.
Plantadas em 2020 em uma estufa que mimetiza o ambiente quente e úmido das matas nativas, as seis mil mudas da variedade tahitensis trazidas do Equador pela Vanilla Brasil, primeira empresa a dedicar-se ao cultivo de baunilha em solo nacional em grande escala, já não têm dado conta de atender toda a demanda gerada.
O que inclui mais de 500 pontos de venda pelo Brasil, abrangendo grandes redes varejistas como os supermercados Zona Sul (RJ), Angeloni (RS), Casa Santa Luzia, Mundo Verde (SP), e Barra Doce (especializada em confeitaria).
Segunda especiaria mais cara do mundo – perdendo apenas para o açafrão –, a baunilha “in natura” de alta qualidade é vendida hoje no mercado internacional por cerca de R$ 5 mil o quilo. Valor muito distante do encontrado nos extratos sintéticos que dominam 95% do mercado justamente pelo baixo custo.
Mas a necessidade de mão de obra intensiva que cada planta demanda ao longo de cada safra e o tempo de investimento entre o plantio e a gôndola do mercado justificam o alto valor cobrado por cada grama.
![](https://neofeed.com.br/wp-content/uploads/2023/03/fava-baunilha-vanilla-brasil.jpg)
Realizada no ano passado, a primeira colheita da Vanilla Brasil contabilizou 60 mil favas, o equivalente a 200 kg de baunilha beneficiada. Para este ano, a expectativa é chegar a 180 mil favas (450 kg) e, em 2024, dar um salto ainda maior com a expansão da plantação para 20 mil pés.
O que deverá ser suficiente para então suprir a demanda atual. Hoje, a empresa complementa a necessidade do mercado com a importação anual de cerca de 800 kg de baunilha de Equador e Indonésia.
“Atualmente, apenas 20% da baunilha que usamos vem da fazenda. Mas a projeção é inverter essa balança até o fim de 2024 e parar totalmente de importar em mais dois ou três anos”, disse ao NeoFeed Aderbal de Castro, o idealizador do projeto, que ao lado do filho Tarcísio Machado já investiu mais de R$ 6 milhões no negócio.
![Orquídea da baunilha](https://neofeed.com.br/wp-content/uploads/2023/03/flor-baunilha-vanilla-brasil-200x300.jpg)
“A expansão vai exigir outros R$ 3 milhões de investimento”, acrescenta Machado, que decidiu abandonar a carreira no setor público para cuidar das áreas comercial e de marketing da empresa criada pelo pai.
Originária da América Central, a orquídea de baunilha é explorada no Brasil desde a década de 1950 de forma extrativista nas regiões de Mata Atlântica e Cerrado na Bahia, Pará, Espírito Santo e Goiás. Mas está em Madagascar o epicentro de um mercado estimado em 3 mil toneladas ao ano para abastecer as indústrias de alimentação, cosméticos e fragrâncias.
Sozinha, a ilha produz cerca de 80% do volume total. Indonésia, Índia, México e China também aparecem no ranking onde, no longo prazo, o Brasil almeja figurar, ainda que minimamente.
“Esse ainda é um mercado muito recente no País. Há alguns anos, variedades nativas como a pompona (também conhecida como baunilha do cerrado) e bahiana caíram no radar dos chefs de cozinha, mas não há volume de produção e nem o aroma que as grandes indústrias precisam”, aponta Roberto Vieira, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.
Baunilha "brasiliana"
Estimulado pelo movimento, nos últimos dois anos o órgão governamental mapeou cerca de 10 variedades aromáticas de baunilha endêmicas em 110 procedências nacionais. Mas enquanto a vanilla pompona, por exemplo, gera poucas favas de cerca de 60 g por planta ao ano, a tahitensis, variedade importada e amplamente difundida assim como a planifolia, chega a ter 20 favas por planta, num total de 300 g ao longo de duas colheitas anuais.
Foram esses números que fizeram com que a Castro literalmente queimasse toda a plantação de baunilhas nativas que originou o projeto em 2018 para investir nas variedades mais difundidas mundialmente.
![Fava cortada para preparo de outros produtos da marca](https://neofeed.com.br/wp-content/uploads/2023/03/fava-cortada-baunilha-vanilla-brasil-200x300.jpg)
Hermafroditas, mas incapazes de autopolinização, as flores de baunilha dependem da ajuda do homem para serem fecundadas. “Se não for polinizada manualmente uma a uma, no mesmo dia, ela murcha e morre”, explica o engenheiro agrônomo. Na natureza, apenas com a ajuda do vento, da chuva ou de insetos estima-se que menos de 6% das flores sejam polinizadas.
Na fazenda da Vanilla Brasil, no ápice do período de floração que vai de janeiro a março, e se repete entre julho e outubro, chega-se a polinizar manualmente mais de 10 mil flores em um único dia.
Ainda assim a taxa de perda natural é de 40%. Caso a fecundação tenha dado certo, ao longo dos próximos nove meses será tempo de esperar a natureza fazer seu papel transformando cada flor em uma vagem repleta de pintinhas pretas cheias de sabor e aroma.
Por enquanto, a empresa tem concentrado seus esforços para atender apenas o setor de alimentação. É nele em que as favas inteiras, com 17 a 18 cm, mais suculentas e com cerca de 4 gramas, classificadas como grau A, são mais valorizadas e vendidas ao preço máximo. No site da Vanilla Brasil, por exemplo, duas favas A saem R$ 80, enquanto a concorrente Bombay Herbs & Spices as vende por R$ 64,90.
Apesar de ser capaz de produzir vários cachos com até 20 favas a cada temporada, apenas 30% do que brota é grau A. Quarenta por cento será grau B (de 3 gramas e com até 16 cm, vendidas inteiras por cerca de R$ 4 mil). O restante, de 10 cm a 15 cm, será destinado à produção de extratos e pastas. “Da baunilha não se perde nada”, aponta Castro.
Daí a estratégia de, com o incremento da produção, também diversificar os produtos derivados para assim equilibrar as contas e tentar tornar a fava nacional mais acessível e competitiva.
![Estufa para cultivo da flor de baunilha](https://neofeed.com.br/wp-content/uploads/2023/03/baunilha-vanilla-brasil-estufa-200x300.jpg)
Atualmente, a empresa conta com quatro produtos no portfólio próprio: as favas, que apesar de representarem 10% do volume de vendas respondem por 45% do faturamento; a pasta, que domina o volume de vendas (51%) mas garante somente 32% do faturamento; o extrato e o açúcar baunilhado, lançado no início do ano.
Colabs com outras marcas também estão nos planos como as realizadas com a Namu Matcha, para o desenvolvimento de um chá verde com baunilha, e com a Manteigaria Nacional, para uma manteiga de baunilha.
Outras parcerias com marcas de chocolates, cafés e cachaças também estão em estudo, assim como o lançamento mais produtos de marca própria, incluindo a abertura de uma flagship store em São Paulo, “talvez ainda este ano. O mercado está totalmente aberto”, diz Machado.