A chegada recente ao Brasil da primeira coleção de relógios de luxo da estilista inglesa Victoria Beckham ilustra à perfeição duas fortes tendências da alta relojoaria.

A primeira é a parceria cada vez mais frequente com as grifes de moda. E a segunda, a aposta no mercado brasileiro como um dos mais promissores da indústria relojoeira suíça.

Batizada Chronomat Automatic 36 Victoria Beckham, a linha criada pela ex-Spice Girl foi desenvolvida em colaboração com a Breitling.

Fundada em 1884, em Saint-Imier, no Cantão de Berna, a fabricante é uma das mais tradicionais e reverenciadas no universo dos relógios de grife.

Com seis modelos, a série de Victoria Beckham está limitada a 1,5 mil peças. Os de ouro amarelo 18 quilates são oferecidos no site brasileiro da Breitling a US$ 34,22 mil, cada um - R$ 170 mil, aproximadamente. E, os de aço, US$ 6,5 mil (cerca de R$ 32 mil).

Pulseira rouleaux de metal e abas levantadas na marca dos 15 minutos, os relógios seguem a estética minimalista e o estilo quiet luxury da designer inglesa.

Em tons de areia, cinza, azul meia-noite e hortelã-pimenta, os mostradores trazem discretamente a logo da Breitling e as iniciais VB, no ponteiro dos segundos.

Não são esses, no entanto, o símbolo maior da exclusividade da nova coleção. A indicação “1 de 100”, nas peças de ouro, e “1 de 400”, nas de aço, indicam as quantidades reduzidas nas quais os relógios foram produzidos.

E os brasileiros gastam; como gastam

Depois de muitos altos e baixos, o Brasil parece finalmente ter acertado os ponteiros com a alta relojoaria suíça. Em 2023, o País importou 43,7 milhões de francos suíços (CHF) em relógios. Um aumento de 16,2% em relação a 2015 e de 6,8% em comparação ao ano anterior.

Os brasileiros investiram, no ano passado, CHF 3,6 mil, em média, por relógio – o equivalente a R$ 20 mil, aproximadamente. É o dobro do índice global, aponta relatório da Federação da Indústria Relojoeira Suíça (FH).

Uma série de fatores explicam o fenômeno. O primeiro deles é também o mais óbvio. Os ricos brasileiros estão cada vez mais ricos. Ao lado da Rússia, em 2022, o Brasil apresentou um dos maiores percentuais de indivíduos UNHW (Ultra High Net Worth), tanto nas faixas das fortunas até US$ 50 milhões como nas de US$ 100 milhões.

Conforme o relatório Global Wealth Report 2023, do UBS, nos próximos cinco anos, o público de alta renda deve dobrar no País. Frente à promessa de tamanha riqueza, as marcas de luxo voltam a apostar no Brasil.

O luxo está de volta

Depois de suspender suas operações no país, em 2019, a suíça IWC e a italiana Panerai, do grupo Richemont, retornaram no ano passado, com lojas monobrand, administradas pela joalheria paulista Frattina.

A relojoaria Tudor, marca-irmã da suíça Rolex, já é representada por cinco joalherias, em quatro estados. Administrado pela Corsage, o corner temporário no requintado Shopping Cidade Jardim, em São Paulo, teve seu funcionamento estendido até abril.

No mesmo endereço, a italiana Bulgari, do conglomerado LVMH, acaba de inaugurar sua segunda loja. Lá também, a loja Breitling, sob gestão da joalheria Grifith, acaba de ser totalmente reformada.

“O Brasil é um mercado muito importante para a indústria relojoeira em geral. Renovar nossa boutique em São Paulo é apenas um elemento da nossa estratégia para desenvolver nossa marca no país”, diz Antoine Loron, diretor geral da Breitling para a América Latina, em entrevista ao NeoFeed.

Em seis modelos, a série da estilista inglesa conta com uma edição limitada de 1,5 mil peças (Imagem: Breitling)

O modelo Lake Tahoe, da IWC, custa R$ $ 231,9 mil (Imagem: IWC)

Da Bulgari, o Serpenti Tubogas, em ouro rosa, cravejado com diamantes, é oferecido a R$ 138 mil (Imagem: Bulgari)

Depois de interromper suas atividades no Brasil, em 2019, a italiana Panerai retornou ao País, no ano passado (Imagem: Divulgação)

A IWC foi outra marca de luxo que voltou a operar no mercado brasileiro (Imagem: Divulgação)

Outro fator importante para alimentar a sanha brasileira pela alta relojoaria está no acesso cada vez mais desembaraçado às peças. “Atualmente é possível adquirir um IWC ou um Panerai por praticamente o mesmo preço praticado no exterior”, diz Julio Sato, CEO da Frattina, em conversa com o NeoFeed. “E isso com facilidade de pagamento.”

Cerca de 30% das grandes coleções só são vendidas em boutique. E, agora, as marcas estão fisicamente aqui. Algumas lojas, como as da IWC e da Panerai, são as únicas da América do Sul, atraindo clientes da Argentina e do Chile, por exemplo.

“A chegada dessas grifes tem um impacto importante para a valorização do tíquete médio do relógio trazido ao Brasil”, avalia Rosana de Moraes, professora de Educação Executiva, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Símbolos de status e exclusividade

Há de se levar em conta ainda a chegada dos smartwatches ao mercado, em especial do Apple Watch Ultra, comercializados a cerca de R$ 9,7 mil.

“Como o consumidor deixa de adquirir relógios mecânicos para comprar o relógio inteligente, passa a buscar uma peça tradicional de maior valor agregado”, explica Roberto Kanter, professor de MBA, da FGV.

Com isso, as peças mecânicas vão (muito) além de meros acessórios funcionais e oferecem (muito) mais do que apenas cronometragem de precisão. Viram itens de realização pessoal, define Kanter.

Na plataforma brasileira da Bulgari, por exemplo, o modelo feminino Serpenti Tubogas, de duas voltas com caixa em aço inoxidável, moldura em ouro rosa 18 quilates, cravejado com diamantes, é oferecido a R$ 138 mil.

Já o Big Pilot Perpetual Calendar Top Gun Lake Tahoe, da IWC, sai por R$ 231,9 mil. Seu diferencial: calendário perpétuo com indicação da data, dia da semana e mês e das fases da lua, dupla lua para os hemisférios norte e sul... e por aí vai, tudo em uma caixa de cerâmica branca, com fundo de safira.