Em 2012, Bill Hwang se declarou culpado de usar informações privilegiadas para negociar ações de bancos chineses e concordou em devolver US$ 16 milhões e pagar uma multa de US$ 44 milhões para encerrar a disputa legal na Securities Exchange Commission (SEC), o órgão regulador do mercado americano.
Hwang, do fundo Tiger Management Asia, era um dos veteranos remanescentes do Tiger Management, fundo do lendário Julian Robertson. Ele, assim como outras pessoas que trabalharam com Robertson, voltaram ao mercado de capitais e ficaram conhecidos como os Tiger Cubs (filhotes de tigre) – o mais famoso deles é Charles Payson Coleman III, que fundou a Tiger Global.
Com um histórico desses era de se esperar que ninguém mais quisesse fazer negócios com Hwang. Ledo engano. Ele não só voltou à ativa 12 meses depois de fechar acordo com a SEC com a Archegos Capital Management, como também passou a fazer negócios com os principais bancos de investimentos do mundo.
Na semana passada, a Archegos de Hwang esteve envolvida em operações que estão trazendo prejuízos bilionários a bancos de investimentos ao redor do mundo, em especial ao suíço Credit Suisse e ao japonês Nomura, ao não cumprir uma chamada de margem estimada em mais de US$ 20 bilhões.
O Credit Suisse pode ter perdas entre US$ 3 bilhões e US$ 5 bilhões, segundo três fontes ouvidas pelo jornal britânico Financial Times (FT) – oficialmente, a instituição disse que é “muito cedo para quantificar a perda exata”. O Nomura informou que as perdas podem somar US$ 2 bilhões.
As ações do Nomura tiveram uma queda de 16% na Bolsa de Tóquio, um recorde em um único dia nos papéis do banco de investimento japonês. As do Credit Suisse tombaram 13%, a maior queda desde março do ano passado.
Não está claro se outras instituições estavam expostas à Archegos. Mas os principais bancos de investimentos dos Estados Unidos e da Europa tiveram quedas, não tão acentuadas quanto Credit Suisse e Nomura, em seus papéis ao longo desta segunda-feira, 29 de março. São eles UBS, Morgan Stanley, Deutsche Bank, Citigroup, BNP Paribas e Goldman Sachs.
Credit Suisse e Nomura emprestaram dinheiro para que a Archegos montasse posições altamente alavancadas em empresas abertas dos Estados Unidos e da China. “É muito difícil para mim defender porque emprestamos tanto a ele”, disse um executivo de um banco com bilhões de dólares em exposição à Archegos ao FT.
As duas instituições prestaram serviços como corretoras primárias para a gestora de fundo hedge de Hwang. Uma corretora primária concede empréstimos em dinheiro e em ativos, além de processar suas operações de compra e venda.
Depois de construir uma exposição significativa em ações, a Archegos foi duramente atingida com a queda das ações do grupo de mídia ViacomCBS. Essa queda levou a uma chamada de margem de uma das corretoras primárias do fundo, desencadeando demandas semelhantes por dinheiro de outros bancos.
Como a Archegos não atendeu às chamadas de margens para cobrir as pesadas apostas em ações, os bancos tiveram que fazer vendas maciças dos papéis – eles eram a garantia para os empréstimos. A liquidação afetou até agora nove empresas: Baidu, Tencent Music, Discovery, Farfetch, GSX Techedu, Shopify, Vipshop, iQIYI e ViacomCBS.
Os bancos colocaram à venda blocos colossais de títulos - a maior coleção em pelo menos uma década, de acordo com uma nota de um analista de Wall Street.
As empresas Alibaba, Baidu, JD.com e Netease, as quatro gigantes chinesas da tecnologia listadas tanto na China quanto nos Estados Unidos, perderam coletivamente US$ 60 bilhões em valor de mercado na semana passada.
O Alibaba, avaliado em US$ 610 bilhões, perdeu, sozinho, US$ 39 bilhões. O Baidu, avaliado em US$ 67 bilhões, teve a segunda maior desvalorização, de cerca de US$ 13 bilhões. JD.Com (US$ 124 bilhões) e Netease (US$ 69 bilhões), perderam cerca de US$ 4 bilhões cada.
A ViacomCBS observou seu papel despencar mais de 50%, de US$ 100, cotado em 22 de março, a US$ 45 nesta segunda-feira, 29 de março. A queda abrupta teria sido provocada por uma oferta de ações de US$ 3 bilhões do grupo de mídia, que não prosperou.
No caso das empresas chinesas, o prejuízo foi potencializado pelo aumento na pressão por parte do SEC. Uma lei que entrou em vigor na semana passada ameaça retirar da bolsa americana as empresas que não cooperarem com as autoridades dos Estados Unidos. Elas devem provar que não são controladas por uma entidade governamental e devem apontar quais membros do conselho são oficiais do partido comunista chinês.
Esse não é o único imbróglio em que o Credit Suisse está metido. No início deste mês, o banco disse que enfrenta perdas potenciais com o colapso da empresa financeira britânica Greensill Capital, com a qual administrava US$ 10 bilhões em fundos de investimento.
Em fevereiro deste ano, o Credit Suisse relatou também uma perda no quarto trimestre de 2020 de mais de US$ 1 bilhão em encargos para resolver um caso no tribunal dos EUA sobre títulos tóxicos e para reduzir uma participação que detinha em um grande fundo de hedge dos EUA.