Em meados de março, quando as escolas de todo o País tiveram que fechar por conta da pandemia da Covid-19, o grupo educacional britânico Pearson teve de correr para migrar para o ensino online os mais de 400 mil alunos que estudavam idiomas na Wizard.

Em duas semanas, esse contingente gigantesco de alunos já podia assistir suas aulas com os mesmos professores que ensinavam nas mais de 1,3 mil franquias espalhadas por 800 cidades de todos os Estados brasileiros.

O que surgiu como um paliativo para resolver uma situação emergencial agora está se transformando em um negócio. Nesta semana, a Wizard anuncia o Wizard On, o seu curso de idiomas online, entrando com força em um segmento dominado por escolas exclusivamente virtuais, como English Live e Open English.

“O curso não é uma live com professores através do Zoom”, afirma Piero Franceschi, vice-presidente de marketing e inovação para a América Latina da Pearson, com exclusividade ao NeoFeed. “Ela é uma escola virtual que une o melhor dos dois mundos: o físico e o online.”

Ao contrário dos cursos exclusivamente online, a Pearson, que comprou a Wizard do empresário Carlos Wizard Martins, em dezembro de 2013, por R$ 1,95 bilhão, está adaptando o seu método de ensino de idiomas ao mundo online, sem tirar do jogo os seus franqueados.

O Wizard On é um curso que pode ser feito todo online. Mas o aluno terá horário para assistir às aulas, que serão sempre com o mesmo professor e em companhia dos mesmos colegas de classe.

“A questão de estudar a qualquer momento dá uma sensação de flexibilidade, mas baixa o compromisso”, diz Franceschi, sobre a questão de a Wizard optar por ter um horário fixo. “É a mesma coisa de ter uma academia no prédio e contratar um personal trainer.”

Todo estudante será também ligado a uma escola física. Em geral, a unidade mais próxima da cidade ou da residência onde mora o aluno. “Estou apenas em 800  cidades”, afirma Franceschi. “Agora, posso abraçar o Brasil.”

Piero Franceschi, vice-presidente de marketing e inovação para a América Latina da Pearson

A meta do grupo Pearson com o novo curso é conseguir aumentar em até 20% as matrículas em seu curso de idiomas, no qual as aulas de inglês são as mais procuradas – a Wizard ensina também espanhol, francês, italiano, alemão, chinês, japonês e português. Franceschi não abre os dados de matrículas que são esperadas.

A Pearson, considerado o maior grupo educacional do mundo, teve uma queda em seu faturamento global de 17% para quase 1,5 bilhão de libras esterlinas (aproximadamente R$ 10,5 bilhões) no primeiro semestre de 2020.

O impacto da Covid-19 foi de 260 milhões de libras esterlinas (cerca de R$ 1,8 bilhão), o que ocasionou um prejuízo ajustado de 23 milhões de libras esterlinas (R$ 158 milhões) nos primeiros seis meses de 2020.

No ano passado, o Brasil representou 3% das vendas totais da Pearson, que foram de 3,8 bilhões de libras esterlinas (R$ 26,2 bilhões). Por aqui, o grupo atua, além de ensino de idiomas, em educação básica (sistemas de ensino como COC e Dom Bosco), em ensino superior e em treinamento corporativo para empresas. No País, ela é dona ainda do Yázigi e da Skill.

Pioneiro

O Brasil é o primeiro lugar do mundo em que o grupo Pearson vai testar esse método de ensino nos cursos de idiomas - o grupo está presente em 70 países. Nos Estados Unidos, onde atua em educação básica, a companhia britânica adotou esse modelo que mescla aulas físicas com atividades presenciais.

No caso do curso de idiomas online brasileiro, os alunos poderão participar do “Conversation Club”, encontros mensais na escola em que estão matriculados para praticar o idioma de forma presencial.

A metodologia de ensino, de acordo com Franceschi, inclui ainda o Wiz.me, um assistente virtual que ajuda o aluno com testes e exercícios para desenvolver fala, audição, leitura e escrita.

Os professores, que dão as aulas na sede da escola e não de suas casas, usam também diversas tecnologias, como quadro branco interativo, upload de arquivos, salas para falar de forma privada com os estudantes e quizzes interativos. “Integramos diversas soluções tecnológicas na plataforma”, diz Franceschi.

As turmas têm limite máximo de 12 alunos e o preço começa a partir de R$ 249. O executivo da Pearson diz que não dá para comparar o custo dos cursos, pois cada franqueado define o preço no presencial. No caso do Wizard On, o valor é padronizado para todo o Brasil.

Em um mundo em que o digital ganha cada vez mais importância e muitas empresas mudam para o modelo direct-to-consumer, a Pearson tinha um dilema pela frente, quando resolveu apostar nos cursos online.

As escolas de inglês se expandiram nacionalmente a partir de um modelo baseado em franquias, que são chave para o negócio. A Wizard é o curso de idiomas com a maior quantidade de franqueados do Brasil. Ela é seguida pela Fisk, CCAA e CNA, de acordo com dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF).

Todas essas escolas também tiveram que se adaptar aos novos tempos e lançaram versões online de seus cursos de idiomas. Elas brigam por um mercado gigantesco em número de potenciais alunos ao lado de companhias que nasceram exclusivamente online, como English Live e Open English.

Uma pesquisa do British Council, organização que promove a cooperação entre o Reino Unido e o Brasil nas áreas de língua inglesa, artes, sociedade e educação, mostra que apenas 10,3% dos jovens, de 18 a 24 anos, dizem saber inglês. O percentual é menor se consideradas as pessoas mais velhas, com mais de 16 anos: 5,1%.

Apenas 5,1% dos brasileiros com mais de 16 anos sabem falar inglês, segundo pesquisa do British Council

O desafio desses grupos tradicionais é investir em aulas online de idiomas e, ao mesmo tempo, não criar um conflito com os franqueados para não colocar o negócio em risco.

“O online é percebido como um concorrente pelo franqueado”, diz Marcelo Cherto, presidente da consultoria Cherto, especializada em franquias. “É fundamental descobrir um jeito de envolver os franqueados no modelo omnichannel.”

Cherto cita o exemplo de O Boticário, maior rede de franquias do Brasil, que aderiu ao comércio eletrônico, mas optou que a entrega fosse feita pelo franqueado mais próximo do endereço do consumidor que comprou o produto pelo site.

Questionado sobre a estratégia, Franceschi alega que a Wizard conta com mais de 10 mil professores treinados e que faz sentido aproveitar toda essa escala. “Não estamos começando do zero”, diz o executivo da Pearson, em uma referência as escolas exclusivamente virtuais.

Franceschi diz também que a polêmica envolvendo o nome do empresário Carlos Wizard Martins, ex-dono da rede de idiomas, não afetou os negócios da empresa.

Martins, em junho deste ano, foi convidado para assumir uma secretaria no Ministério da Saúde. Mas, antes aceitar o convite, deu uma série de entrevistas polêmicas.

Em uma delas, o empresário teria questionado a veracidade dos dados referentes às mortes pelo novo coronavírus que eram repassadas por equipes de saúde de Estados e municípios. Segundo Martins, as supostas fraudes serviriam para inflacionar o repasse de recursos federais. Em entrevista ao NeoFeed, ele disse que as declarações foram tiradas do contexto.

Por conta disso, muitos usuários em redes sociais começaram a pedir boicote às empresas de Martins. E entre elas estava a escola de idiomas comprada pelo grupo Pearson. “Foi uma confusão. Fizemos um comunicado e não afetou em nada os negócios”, afirma Franceschi.

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