Ao longo dos últimos dois anos, o fundo Kamay Ventures, um multi-corporate venture capital que conta com o capital da Coca-Cola Latin America e do grupo argentino de alimentos Arcor, construiu um portfólio com 12 startups em países como Argentina, Chile, Colômbia, Equador e México.
Agora, o objetivo do Kamay Ventures é abrir sua “carteira” no Brasil e investir em startups que atuem nas áreas de e-commerce, distribuição, logística, agtechs, biotecnologia, meio ambiente e fintechs.
“Começamos investindo em outros países da América Latina. Agora, o nosso foco será grande no Brasil”, diz Gabriela Ruggeri, sócia da Kamay Ventures, ao NeoFeed. “O nosso objetivo é investir entre oito e dez startups no Brasil.”
À primeira vista, pode parecer uma meta pequena, dado o tamanho e a oportunidade que existe no Brasil. O alvo da Kamay Ventures é investir em 30 startups na América Latina. Faltam 18 empresas. Portanto, por volta de 50% dos novos aportes devem acontecer no mercado brasileiro.
O primeiro passo para começar a investir no Brasil foi dado com a chegada de Humberto Matsuda, como venture partner da Kamay Ventures no ano passado. Parte da equipe de 12 pessoas da gestora já fala português. A própria Ruggeri é fluente no idioma, pois morou nove anos no Brasil.
Dois deals já estão avançados e devem ser anunciados em breve. A gestora mantém também relacionamento próximo com alguns fundos brasileiros, para que possa fazer co-investimentos. Entre eles estão a SP Ventures, a Vox Capital e a Monashees.
A Kamay Ventures, cuja sede fica na Argentina, se posiciona como um fundo early stage que assina cheques de US$ 300 mil a US$ 500 mil em rodadas seed ou pré-série A – uma parte do capital do fundo é reservado para follow ons nas companhias que estão se saindo melhor.
Embora não revele o tamanho do fundo, dado o volume de investimentos previstos, ele está entre R$ 50 milhões e R$ 75 milhões.
Além da Coca-Cola e da Arcor, que é dona das marcas Tortuguita e 7 Belo e fatura mais de R$ 1 bilhão no Brasil, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) investe também com a Kamay Ventures. Ruggeri diz que busca mais âncoras para investir no fundo.
O objetivo é seguir o playbook de um fundo de corporate venture capital (CVC) que se aproxima de startups com objetivos estratégicos, mas que também busca rentabilidade em uma possível saída do investimento. “Sempre procuramos estar alinhados e com um fit estratégico”, afirma Ruggeri.
Por esse motivo, as startups que são investidas precisam ter relação com o negócio de Coca-Cola e Arcor. Muitas vezes, as duas empresas servem como alavancas para essas empresas, ajudando-as em projetos. “Tanto a Coca-Cola como a Arcor querem afetar todo o seu ecossistema, através da digitalização e da inclusão digital”, afirma Ruggeri.
Um exemplo é a agtech argentina Kilimo, que ajuda produtores a otimizar o uso de água na agricultura. Hoje, ela está no Chile, México e Peru, além da Argentina, e segundo Ruggeri, tem ajudado a economizar milhões de litros de água.
Outro é a fintech equatoriana Altscore, que fornece uma solução B2B de “empréstimo as a service”. O alvo são pequenos negócios que precisam de crédito, um público carente de soluções financeiras na região latino-americana e essenciais para Coca-Cola e Arcor.
Mesmo sem ter startups brasileiras, algumas empresas do portfólio da Kamay Ventures já atuam no Brasil. São os casos das agtechs argentinas Auravant e Wiagro e da desenvolvedora de software de gestão de pneus colombiana Ruedata.
CVC decola no Brasil
Em meio a queda dos investimentos em startups, os CVCs estão em alta no mercado brasileiro, impulsionados pelo apetite das empresas por um quinhão estratégico no universo da inovação.
Em uma estimativa conservadora, mais de R$ 2 bilhões foram anunciados em fundos de CVCs em 2022. São mais de 100 empresas investindo em startups, a maioria delas usando capital do balanço em vez de estruturar um fundo de investimento.
Entre as empresas que criaram seus veículos de investimentos estão Telefônica/Wayra, que divulgou um fundo de R$ 320 milhões. A B3, dona da L4, com R$ 600 milhões. A Suzano, com R$ 350 milhões. A Vale vai apostar R$ 300 milhões. E a Braskem, R$ 500 milhões.
Mas o modelo de multi-corporate venture capital, em que um fundo reúne várias empresas debaixo da mesma estrutura, é raro. No Brasil, a gestora que atua dessa forma é a MSW Capital. Ela administra o BR Startups, que reúne Microsoft, Algar, BV, Monsanto e BB Seguros. O segundo fundo da gestora atraiu BB Seguros, Baterias Moura, Embraer e AgeRio.
Outro modelo é o da Valetec Capital, que adota a estratégia de um-"CVC as service", em que faz toda a gestão para as empresas. São sete CVCs que administra, como o da Eurofarma (Neuron Ventures), da ArcelorMittal (Açolab Ventures), da Ânima (Ânima Ventures), da Locaweb (LW Ventures) e da Dexco (DX Ventures) – outras duas empresas não divulgaram ainda seus fundos para o mercado.