Em 2009, Daniel Izzo era uma espécie de “pastor” que pregava no deserto sobre investimentos de impacto para a sua recém-fundada Vox Capital, algo que não estava no radar de dez em cada dez investidores.

Na época, a casa escolheu a classe de ativos de venture capital para realizar seus primeiros investimentos e sofreu para convencer os investidores sobre sua tese, baseada em educação, saúde, serviços financeiros e habitação.

Agora, 13 anos depois, três fundos de venture capital levantados e mais de 50 aportes realizados em startups como Celcoin, Sanar e Isa Lab, além de R$ 600 milhões de ativos sob gestão, a Vox Capital está querendo romper uma nova fronteira.

A gestora começou, de forma discreta, a investir em outras classes de ativos: a primeira delas são dois fundos de renda fixa. Mas esta é a ponta do iceberg de um projeto maior que deve incluir, ao longo do tempo, fundos de ação, fundos de previdência e fundos imobiliários.

“Sempre vi a Vox como uma empresa de geração de impacto através de produtos financeiros”, afirma Izzo, ao NeoFeed. “Mas hoje, com os fundos de venture capital, somos mais exclusivos do que as grifes de luxo do Shopping JK e Cidade Jardim.”

Para atingir um público maior, a Vox Capital está se posicionando como um one-stop-shop para investimentos de impacto. Para desenvolver outras classes de ativos, a gestora recebeu um aporte, de valor não revelado, de alguns de seus principais LPs (limited partners) - o nome dos investidores está também sendo preservado.

O dinheiro está sendo usado para a gestora se estruturar para além do venture capital. Um exemplo é o número de funcionários, que está crescendo. Em 2020, eram 11 pessoas. Hoje, são quase 50. A Vox Capital buscou profissionais no Nubank, XP, Itaú e BTG e estruturou área de backoffice para atender toda a empresa. Uma equipe comercial foi também contratada, bem como de tecnologia.

Os dois primeiros fundos são o VOX Renda Fixa Desenvolvimento Sustentável e o Empírica VOX Impacto Crédito Privado. O primeiro permite investimentos a partir de R$ 100 e já captou R$ 12 milhões até agora. O segundo exige R$ 5.000 de investimento mínimo e levantou R$ 10,5 milhões.

O desafio, de acordo com Izzo, foi encontrar uma metodologia para escolher as empresas nas quais o fundo investe, parte essencial da estratégia da Vox Capital, que pretende que o cotista saiba o impacto que o seu dinheiro está causando. “Era precisa explicar o porquê um ativo estar lá e acompanhar esse porquê”, afirma o fundador da gestora.

A solução foi criar uma metodologia própria a partir dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), um conjunto de 17 objetivos que vão desde erradicar a pobreza, passando por fome zero e agricultura sustentável e chegando até energia limpa e sustentável.

A Vox Capital escolheu 10 objetivos, deixando de fora aqueles relacionadas a políticas públicas. “Olhamos para empresas de capital aberto que têm parte das receitas que vêm de alguns serviços que impactam algumas das submetas das ODS da ONU”, explica Izzo.

O capital do VOX Renda Fixa Desenvolvimento Sustentável, por exemplo, está alocado 53% em debêntures, 8% em letra financeira e 39% do investimento está em caixa. A carteira está concentrada em saúde e bem-estar, com foco em serviços hospitalares e saneamento básico; fome zero e agricultura, com empresas com agricultura sustentável; e cidades e comunidades sustentáveis, que inclui companhias que atuam em soluções de mobilidade, logística sustentável e gestão de resíduos.

Na carta de agosto aos cotistas, a Vox Capital informou ter 14 empresas no portfólio que contam com receitas em 7 ODS. São elas Aegea, AES, Ambipar, Cosan, Grupo Vamos, Movida, Natura, Omega, Origon, Pague Menos, Pão de Açúcar, Rede D’Or, Simpar e Sicredi.

Ainda não é possível apurar a rentabilidade do fundo. Pelas regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), é necessário um período de silêncio de seis meses antes de divulgar os ganhos (ou as perdas) do fundo.

Atualmente, um dos produtos (o Renda Fixa Desenvolvimento Sustentável) é distribuído via uma plataforma white label da Waren. O Empírica Vox Impacto Crédito Privado já está na Órama, Vitreo e Modalmais. “Mas estamos conversando com todas as plataformas do mercado”, afirma Izzo.

O baixo valor captado pelos dois fundos, de acordo com Izzo, é porque a Vox Capital está dando os primeiros passos no varejo. Boa parte dos recursos foi levantando junto a investidores próximos a gestora. Aos poucos, a ideia é começar a distribuir os produtos na maior quantidade possível de plataformas, ganhando força no varejo além da rede de relacionamento da Vox Capital.

Izzo acredita que o Brasil só está arranhando a superfície dos investimentos de impacto. De acordo com o International Finance Corporation (IFC), braço privado do Banco Mundial, esse foi um mercado de US$ 2,2 trilhões em 2020 (dado mais atual).

Globalmente, 17% dos investimentos de impacto estão concentrados em venture capital e private equity. Na América Latina, esse percentual é de 70%. “O Brasil vai ficar mais parecido com o mundo”, acredita Izzo.

Além da Vox Capital, outras casas de venture capital nasceram de olho nos investimentos de impacto. São os casos de Positive Ventures, fundada por Bruna Constantino, Fábio Kestenbaum, Andrea Oliveira e Murilo Menezes, e da GK Ventures, de Eduardo Mufarej.

Os fundos ESG, por sua vez, movimentaram mais de R$ 800 bilhões em 2021 no Brasil, segundo dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).

Mas esses fundos são diferentes do investimento de impacto na qual a Vox Capital está se propondo a fazer. De acordo com Izzo, os fundos ESG são complementares e se preocupam como as coisas são feitas por uma empresa. O impacto olha o que a empresa está, de fato, fazendo. “São movimentos que são irmãos”, diz o sócio da Vox Capital.