Após um 2023 difícil para o mercado de investimentos, em que o CDI reinou pela segurança e alto retorno, 2024 pode ser o ano da volta dos ativos de risco no portfólio. Os estrategistas e CIOs dos seis maiores private bankings do Brasil estão otimistas e contam onde estão alocando os recursos das grandes fortunas e o que movimentará o mercado financeiro.
Na visão de Itaú Unibanco, Bradesco, Santander, BTG Pactual, Banco do Brasil e UBS, o cenário macroeconômico local será ditado pelo corte da taxa de juros, com previsão de terminar o ano em torno de 9%.
O grande risco está do lado fiscal e da trajetória dos juros nos Estados Unidos. Já em relação à atividade econômica, todos os bancos preveem uma desaceleração, com expectativa de crescimento de apenas 1,5%, em média, principalmente com a queda da atividade agrícola.
Com esse cenário, a renda fixa continua sendo a estrela dos portfólios, com uma recomendação média de alocação de 65% em uma carteira de perfil moderado ao risco.
“Nosso cenário base é benigno para a inflação com desaceleração econômica moderada, o que deve promover não só o fechamento das taxas de juros, como também dos spreads, proporcionando ganhos interessantes para quem possui um portfólio diversificado com estes ativos”, afirma Juliana Laham, CIO do Bradesco Global Private Bank.
Mas, na composição, menos CDI. A preferência está para os ativos prefixados, com a percepção de prêmio com o fechamento das taxas, e indexados à inflação, com os juros reais ainda em níveis muito atrativos. As NTN-Bs longas pagando juros reais acima de 5% são unanimidade nos portfólios.
Os títulos corporativos, que ficaram de fora das carteiras em grande parte do ano passado após o mercado de crédito ser abalado pelas crises de Americanas e Light e outros tantos pedidos de recuperação judicial, estão entre as grandes apostas de aumento de exposição.
“Os títulos corporativos se encontram com spreads atrativos, contando com liquidez crescente em um mercado cada vez mais aquecido, dando opções não só de carregar posições até o vencimento como por antecipar retornos em momentos de fechamento de taxa. No geral, preferimos prefixados, e indexados à inflação, com taxa na casa dos IPCA + 5,7%”, diz Janaína Klichowski, estrategista-chefe do private do Banco do Brasil.
Entre os títulos corporativos, é esperada uma maior demanda pelos isentos de impostos (como CRI/CRA e debêntures incentivadas), com os clientes de grandes fortunas buscando eficiência tributária após a decisão de tributação dos fundos exclusivos.
Apesar de atrativos, é necessário ver se os spreads não serão comprimidos com o excesso de procura. Fundos de crédito com esse perfil também estão na mira dos alocadores.
Já os fundos multimercado estão ganhando um voto de confiança, após 2023 ter sido um ano para esquecer. Segundo levantamento elaborado pelo consultor Einar Rivero com dados da plataforma Mais Retorno, apenas cerca de 25% dos fundos bateram o CDI. Entre os de estratégica macro, foram apenas 10%, e com retornos que não justificaram o risco e volatilidade da alocação.
“Os fundos macro se diferenciam quando há uma boa leitura de cenário. Em 2023, houve um erro de leitura, achando que os juros lá fora iam cair, mas subiram. Mas, agora, o cenário parece mais claro em tendência, mas difícil em timing, sendo uma oportunidade para eles fazerem posições”, diz Rafael Mazzer, sócio e head de portfolio solutions Brasil do BTG Pactual, que recomenda uma alocação estrutural de cerca de 40% em multimercados.
Quem conseguiu um retorno melhor em 2023 e continua sendo uma boa aposta para este ano são os fundos multimercado long biased, aparecendo como uma opção mais cautelosa de investimento na bolsa. Os multiestratégia, que trabalham com alocação em diversas classes de ativos, também prometem performar bem no ambiente macroeconômico.
“A maior parte do que investimos em bolsa é através dos fundos long biased. E os multiestratégia podem ter um 2024 bom se mantiverem exposição estrutural e direcional a ativos como pré-fixados e ativos ligados à inflação e bolsa, caso o cenário-base se confirme e a discussão de corte de juros nos EUA se aprofunde”, afirma Luciano Telo, CIO para o Brasil no UBS Global Wealth Management, que recomenda exposição às três grandes estratégias de multimercado para o ano.
É a hora da bolsa?
Depois de andar meio que de lado por 2023 inteiro, tendo reagido apenas nos últimos meses do ano, a bolsa não é uma unanimidade entre os private banks. A maioria - BB, Itaú, Santander e UBS - está com posição neutra para o ano.
“Os elevados prêmios dos papéis de renda fixa apresentam uma melhor relação risco/retorno. Contudo, ainda nos primeiros meses de 2024, a continuidade do ciclo de queda da taxa Selic, a expectativa de cortes futuros nos juros americanos e a inflação em convergência à meta nos países desenvolvidos devem abrir espaço para adicionarmos mais risco em nossas carteiras”, diz Christiano Clemente, CIO do Santander Private Banking, que hoje recomenda uma posição estrutural neutra de 7% para os perfis moderados.
Para Nicholas McCarthy, CIO do Itaú Unibanco, apesar de haver um ambiente mais favorável a ativos de risco, ainda há alguns riscos envolvidos, principalmente vindos dos Estados Unidos, onde a queda de juros deve ficar para o segundo semestre e o risco de uma queda maior na atividade econômica está presente. A recomendação é neutra, sendo 14% para os perfis moderados.
“Se houver recessão, os ativos mundiais devem sofrer, refletindo no Brasil. Num cenário mais positivo, haverá espaço para mais valorização das ações e mais queda nas taxas na renda fixa. Mas aqui também teremos volatilidade, e por isso não esperamos uma linha reta de melhora”, afirma McCarthy.
Já Bradesco e BTG estão sobrealocados em bolsa, de forma cautelosa, monitorando os riscos e fazendo uma boa seleção das ações.
“Acreditamos que a bolsa brasileira ainda se encontra em um patamar barato se comparado aos níveis de valuations históricos. Os lucros das empresas estão passando por um momento de inflexão e os fluxos para mercados emergentes devem ser positivos no próximo ano”, diz Laham, do Bradesco.
Onde não há dúvida sobre a atratividade em 2024 é nos fundos imobiliários. Todos os grandes privates estão positivos com a classe de ativo e acreditam que o ciclo de queda na taxa de juros é um bom momento para se posicionar. E ganham atratividade extra por terem dividendos isentos de imposto para a pessoa física.
“Vemos muitos fundos de tijolo negociando abaixo do valor patrimonial, com níveis estáveis de vacância e ainda gerando pontos de entrada. O mercado de emissões e captações de FIIs também deve seguir aquecido, à medida que os fundos voltam a operar em níveis de preços mais elevados, e os gestores podem contar com entrada de recursos para seguir com suas estratégias de aquisição e expansão dos portfólios”, afirma Klichowski, do BB.
Mercado privado e alocação internacional
Se para a bolsa há, de forma geral, uma posição cautelosa, porém construtiva, com a queda de juros, para os investimentos em mercados privados, como private equity e venture capital, os privates bankings estão mais céticos no curto prazo, com posição neutra acreditando que a classe de ativo precisa estar de forma estrutural no portfólio.
“Ao longo do tempo, essa classe demonstrou uma capacidade de agregar valor para os portfólios. Uma estratégia bem construída aliada a uma seletividade de gestores diversificados globalmente, permite ao investidor aproveitar as oportunidades com preços mais atrativos, mesmo que seja um momento em que o acesso a capital é mais escasso”, diz McCarthy, do Itaú Unibanco.
Para novas alocações é preciso estar atento à nova dinâmica do mercado, em que os juros irão se acomodar em patamar mais elevado que na última década.
“Com juros maiores fica mais difícil indústrias nascentes obterem financiamento. Mas, como vimos com o caso das empresas de tecnologia listadas em bolsa, quando há a perspectiva de uma nova tecnologia que revolucione a forma de se oferecer produtos e serviços, o mercado reconhece e valoriza na frente”, afirma Telo, do UBS.
E, olhando para o mercado internacional, há a dúvida se a desaceleração da economia americana será suave ou mais acelerada. E essa expectativa irá ditar os preços dos ativos americanos e globais. Por outro lado, a inflação parece que será resiliente.
Por isso, os privates estão sobrealocados em renda fixa internacional, acreditando haver grandes oportunidades de exposição a títulos do governo americano. Já em relação às ações, a posição é de neutra para baixo.
“Ativos de renda fixa devem continuar apresentando retornos atraentes e, ao mesmo tempo, mantemos cautela em relação aos ativos de renda variável, considerando que esses deveriam sofrer com a desaceleração do crescimento, que afeta os retornos das empresas”, diz Clemente, do Santander.
O BTG acredita que o S&P está caro, com a perspectiva de a economia ter que desacelerar, e ainda avalia o risco da volatilidade com as eleições no ano que vem nos Estados Unidos. E o câmbio não deve ajudar na valorização, pois a perspectiva é de estabilidade com o dólar por volta de R$ 5.
Carteiras de investimento são constantemente revisadas caso o cenário base mude. Eventos de cauda podem sacudir o mercado a qualquer momento. Mas a perspectiva geral é que 2024 seja um ano melhor para os investimentos e termine com o CDI na direção que deve estar: só no caixa.