Coreografias e trilhas sonoras virais, público adolescente, conteúdo pouco sério. Se você ainda acha que o TikTok se restringe a esse tipo de abordagem, está na hora de mudar o passo. É verdade que os vídeos de entretenimento e de dança continuam a dominar a plataforma criada na China, em 2016, e que hoje soma mais de 3 bilhões de downloads em todo o mundo, segundo a Sensor Tower.
Mas um espaço considerável e crescente já se abriu para usuários dispostos a assistir a uma variedade bem mais ampla de temas, que vão de macetes para acelerar o aprendizado de idiomas a vídeos de viagem com qualidade impressionante.
Com 56,2 bilhões de visualizações da hashtag #travel, o TikTok está se tornando cada vez mais influente entre os produtores de conteúdo de viagem. São vídeos com imagens de cenários bucólicos, piscinas de água inacreditavelmente azul e suítes de hotéis de luxo que funcionaram como válvulas de escape durante a fase mais crítica de distanciamento social durante a pandemia.
"É provável que você tenha o primeiro vislumbre de um destino quase por acidente no TikTok e, uma vez inspirado, pesquise em outros canais antes de reservar a viagem em uma terceira plataforma digital", afirma Chris Pomeroy, CEO da agência de marketing de turismo ITG Spain.
E acrescenta: "Sites de resenhas como TripAdvisor e avaliações no Google ou em agências de turismo online ainda são muito importantes, mas são apenas um funil um pouco menor do que os canais de conteúdo baseado em vídeo."
Pomeroy foi um dos palestrantes de um fórum realizado em Madri no mês passado, que discutiu os novos rumos do turismo de luxo pós-pandemia. Ele compartilhou dados obtidos a partir de uma pesquisa encomendada pelo ICT à plataforma de inteligência em viagens Travellyze.
De acordo com o estudo, feito com viajantes de 10 países europeus com orçamento anual de viagem de mais de € 30 mil por família, o novo perfil de turistas com alto poder aquisitivo se caracteriza por valorizar experiências autênticas. Isso inclui, por exemplo, ter contato com habitantes locais no destino visitado.
Outro exemplo são as atividades outdoor tendo a natureza como cenário, que hoje são mais procuradas por esses viajantes do que experiências exclusivas no spa de um hotel de luxo.
E experimentar a gastronomia genuína de uma região passa a ser tão ou mais importante do que um jantar em um restaurante estrelado ou da moda. O mesmo vale para destinos e estabelecimentos engajados com sustentabilidade e meio ambiente, hoje entre os mais requisitados.
São características que vão ao encontro do movimento observado entre muitos influenciadores de viagem no TikTok. A impossibilidade de viajar durante a fase mais crítica da pandemia fez com que muitos lançassem mão da criatividade para também apresentar aspectos e lugares curiosos e incomuns em suas próprias cidades. Do restaurante favorito e pouco divulgado ao dia a dia em um mercado popular.
"Siga-me para obter meus segredos sobre viagens preciosas", sugere em seu perfil a fotógrafa Madeline Lu, autora de muitos dos vídeos de viagem mais compartilhados no aplicativo, que complementa: "Os detalhes estão no Instagram".
Dessa forma, a influenciadora indica um dos principais diferenciais entre as duas mídias sociais. O TikTok não tem comprometimento nenhum com a informação. Sua proposta é a de inspirar. "Inspiração não é conversão nem clique, é algo que permanece na sua mente e que você deseja porque assistiu e achou incrível", diz a consultora de mídias sociais e professora da Esalq/USP, Liliane Ferrari.
Outro exemplo é o do pescador norueguês Harald Sandvik, que tem quase 250 mil seguidores na plataforma, e compartilha em seu perfil desde imagens panorâmicas da Atlantic Road, estrada que atravessa o mar ligando a ilha de Averøy à Noruega, até cenas de uma tempestade assustadora no oceano. Seu vídeo de maior sucesso mostra o resultado da pesca do dia, com impressionantes 8,2 milhões de visualizações.
Esse olhar insider, com dicas e informações autênticas, é especialmente verdadeiro e desperta ainda mais o interesse sobre os destinos abordados entre os usuários da faixa predominante na plataforma de compartilhamento de vídeos curtos: são jovens das gerações Y e Z, aqueles que nasceram a partir da década de 1980.
Trata-se de um público que já não gasta visando símbolos de status social, mas busca uma relação mais inclusiva com marcas e estabelecimentos, adquirindo produtos de acordo com os valores que eles transmitem, como a preocupação com diversidade e inclusão.
O algoritmo do TikTok também ajuda. "Pela dinâmica, não é necessário seguir ninguém, porque a intenção é mais importante do que seguir pessoas", diz a consultora Liliane Ferrari. "O algoritmo do TikTok é brilhante ao ler seu interesse e ele vai te mostrar mais e mais daquilo que você já gosta".
E no ritmo dessa dancinha que de boba não tem nada, o tempo médio gasto por usuário no TikTok já superou o dedicado aos vídeos do YouTube, como indicam dados do estudo da App Annie, obtidos a partir de pesquisa realizada nos Estados Unidos e no Reino Unido.