Desde o anúncio do arcabouço fiscal, economistas vêm debatendo as regras fiscais que devem substituir o teto de gastos em vigor. Numa live nesta sexta-feira, 28 de abril, o economista Bruno Funchal, ex-secretário do Tesouro do governo Jair Bolsonaro e atual CEO da Bradesco Asset Management, chamou a atenção para um detalhe pouco explorado até agora: o possível impacto do pacote fiscal na redução sustentável da taxa de juros, o maior gargalo atual da economia brasileira.

Segundo ele, essa perspectiva não é boa. Funchal, que elogiou vários aspectos do arcabouço, observa que desde 2015 o Brasil vem tentando voltar a ter um resultado primário significativo, ou seja, um equilíbrio das contas públicas para evitar a expansão da dívida do governo, que hoje está numa proporção de 73% do PIB.

Para isso, adverte, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva depende de um aumento de receitas – se não conseguir esse aumento, os principais pilares do arcabouço ficam comprometidos, alimentando o cenário de incerteza que favorece o aumento da inflação e dos juros.

“Para conseguir chegar a uma queda de juros significativa, é preciso baixar a dívida pública, não basta desacelerá-la, como pretende o governo com o plano fiscal”, afirma o economista.

Em sua visão, o arcabouço dificilmente vai apresentar uma solução definitiva do gasto fiscal, um dos gatilhos para a inflação e, por tabela, da elevação dos juros da economia.

Funchal assinala que a maior dificuldade do governo será atingir as metas de resultado primário pelo lado da receita previstas pelo plano, pois depende de uma arrecadação extra de ao menos R$ 100 bilhões. Para isso, será necessário reverter isenções tributárias, também chamadas de gastos tributários, o que vai exigir aprovação do Congresso.

“O ministro Fernando Haddad tem feito um bom trabalho ao abordar essas isenções tributárias, que são distorções”, diz o economista, que no fim do ano passado foi sondado para ocupar a vaga do ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn no FMI, em Washington. “A justificativa para revisar esse gasto tributário existe, a dificuldade de obtê-la é política.”

Ele cita como exemplo a PEC emergencial, proposta pelo governo Bolsonaro no fim de 2019 para reequilibrar as finanças do Estado. Entre as propostas, a que previa reduzir pela metade os gastos tributários acabou anulada durante a tramitação no Congresso, que colocou tantas exceções na PEC que não sobrou nada para cortar.

“Se o governo não conseguir obter os R$ 100 bi extras fica a dúvida sobre a projeção da dívida e a entrega do gasto primário”, diz.

O economista Bruno Funchal, CEO do Bradesco Asset Management (Agência Brasil)
O economista Bruno Funchal, CEO do Bradesco Asset Management (Agência Brasil)

Pontos positivos do arcabouço fiscal

Funchal, porém, viu vários aspectos positivos no arcabouço. Segundo ele, um conjunto de regras fiscais eficiente deve ser simples, flexível e com boas possibilidades de implementação, ou enforcement, na literatura dos livros de economia.

O teto de gastos, segundo, tem a vantagem de ser simples. “O arcabouço é mais complexo, o governo precisa trabalhar para torná-lo simples e melhorar a comunicação”, diz.  Por outro lado, Funchal afirma que o plano do governo tem uma flexibilidade que o teto não tinha, “pois permite gastar mais em determinados períodos e menos em outros”.

Quanto à chamada implementação, observa que falta ao governo detalhar como controlar a sua execução se não atingir o resultado primário. “Não está claro, e o Congresso pode trabalhar nesse aspecto”, diz.

Funchal elogiou também as metas de resultado primário, com controle de aumento de despesa e receita. Segundo ele, o crescimento anual de gasto real no Brasil no início dos anos 2000 era de 5,5%.

“Quando se impõe limite de crescimento da despesa em 2,5%, como foi feito no arcabouço, mesmo crescendo a dívida, o aumento da despesa será menor que a média histórica, o que passa previsibilidade.”