No início do ano a moda jogou seus holofotes no mercado masculino com lançamentos na Itália e França. As indústrias de confecção, couro, malharia, entre outras, participaram da 101ª edição da Pitti Uomo, feira de Florença voltada a lojistas.

Mesmo com expositores de diversas partes do mundo, o evento que acontece na Fortezza del Basso do século XIV fortalece o “Made in Italy”, a tradição e a manufatura associada ao turismo.

Em seguida, compradores e jornalistas foram para Milão e Paris assistir os desfiles tão importantes como investimentos graças às redes sociais e as mídias. Os fashion shows podem ser grandes espetáculos ou mais intimistas, ou até substituídos por filmes. De toda forma, o objetivo é fortalecer o poder da marca e ajudam a vender outros produtos além da roupa.

Muitos desafios por conta da covid-19 cercaram a realização desses lançamentos. No caso da Pitti, o volume de compradores de outros países diminuiu muito e as Semanas de Moda tiveram que se adaptar ao grande número de profissionais contaminados.

Como vem acontecendo nos últimos dois anos, a saída foi o digital: as empresas tiveram que se preocupar mais com seus sites e as semanas de moda contaram com o recurso do fashion films. Ainda assim, principalmente a semana de Paris surpreendeu com excelentes coleções e apresentações.

Outro desafio do setor é observar a sociedade. Com tantas preocupações em descobrir saídas para seus negócios, muitos não dão conta das transformações do seu público e seu entorno. Com as questões de Gênero em pauta, termos como “Masculinidades” e “Identidades Fluidas” passaram a ser importantes para os negócios deixando mais claro que os homens não são todos iguais.

Para os negócios da moda que tratam de imagens e representações dos indivíduos isso deve ser primordial. Durante muito tempo as fábricas produziram “roupas para homens” imutáveis na forma, materiais e cores. Outras se concentraram apenas na qualidade da matéria prima e confecção e esqueceram o design. Principalmente quando falamos de grande distribuição, muitas marcas masculinas mantiveram por anos os mesmos produtos enquanto o comprimento e volume das roupas das mulheres mudam semestralmente.

Durante muito tempo as fábricas produziram “roupas para homens” imutáveis na forma, materiais e cores. Outras se concentraram apenas na qualidade da matéria prima e confecção e esqueceram o design

São fabricantes que “perderam o bonde da história” e se esqueceram da nova geração interessada em construir identidades próprias, para quem peças consideradas exclusivamente de homens ou mulheres não faz muito sentido.

Isso não é fácil para indústrias que se acostumaram com a estandartização – o que em si é um engano já que moda é mudança. O machismo, muito presente no mundo dos negócios, alimenta a ideia de que heterossexuais não aceitam novidades no vestir, mais bem vindas para gays.

Hoje, empresas e cônjuges preferem homens bem-vestidos e o mercado já entendeu que não existe relação entre estilo e preferências sexuais. Em 2022, vemos que além dos extremos do “clássico” e “vanguarda”, há dezenas de estilos.

Não que a estabelecida forma de um homem se vestir tenha terminado, mas os públicos exigem mais de um produto e vender nesses tempos definitivamente está associado ao termo “surpreender”.

Há muitos itens em comum a todos os estilos, um exemplo são os costumes (“ternos”) - usados das ocasiões mais formais aos figurinos de astros pops - recebendo hoje diferentes versões. As coleções outono/inverno 2022/2023 apresentaram paletós com cintura bem-marcada, outros com foco nos ombros, e ainda os despojados. Mesmo o “terno” sofre influência da chamada roupa de rua: o streetwear, aparecendo também em versões extralargas.

Há muitos itens em comum a todos os estilos, um exemplo são os costumes (“ternos”) - usados das ocasiões mais formais aos figurinos de astros pops - recebendo hoje diferentes versões

O conforto é herança desses dois últimos anos de home-office e se os conjuntos de moletom não podem ir para os escritórios, eles influenciam todos os estilos porque nenhum dos públicos parece tolerar sacrifícios em nome de um código de vestir.

As calças são bons exemplos: muitas ganham detalhes como o elástico na cintura como nos joggings e ganham volume nas pernas lembrando as baggys e clochard. As calças muito justas (skinny) ficaram para roqueiros ou completando looks de influência esportiva.

Assim como jogadores de futebol tornaram-se grandes apreciadores de grifes de moda também os designers buscaram inspiração nos esportes com referência de uniformes como os macacões da Fórmula 1.

Não é novidade que o tênis passou a ter o mesmo status dos sapatos, sendo outro exemplo da importância das marcas esportivas no circuito da moda e como os sneakers são apropriados até mesmo com um costume.

Com as gravatas em baixa, as camisas mereceram mais atenção, aparecendo em diversos estilos: com influência de uniformes às estampas e bordados. As peças masculinas virão mais estampadas e como outra influência dos joggings e pijamas do isolamento, também os conjuntos de camisa e calça com a mesma estampa total.

O tema das flores é recorrente: miúdas e discretas e também grandes e com cores fortes. Essa direção de “decorar” mais as roupas dos homens diz respeito a forma como hoje eles tingem cabelos, fazem sobrancelhas, se tatuam e usam cosméticos. Flores também podem apontar públicos masculinos cada vez mais sensíveis e bem-humorados. A maior das tendências pode ser essa: oferecer opções além do que é imposto pelo machismo.

*Mário Queiroz Designer, consultor e professor de moda é autor dos livros “Herói Desmascarado, a imagem do homem na moda” e “Homens e Moda no Século XXI”.  Em 15 de fevereiro apresenta o painel “Direções Moda Masculina 2022 / 2023” na plataforma Sympla.