De 2008 a 2011, mais de 10 mil moradores de São Francisco embarcaram em um jogo de realidade alternativa que os convidava a ver a cidade com outros olhos. Fazia parte do jogo, cercado de mistério, aceitar “missões” por telefone ou e-mail, sem ter a menor ideia de quem estava por trás de tudo.

É um pouco dessa sensação de estranheza e aventura que Jason Segel quer resgatar em “Dispatches From Elsewhere”. A graça da série, uma das novidades de maio da plataforma de streaming da Amazon, está em não deixar o espectador perceber onde o jogo termina e onde começa a realidade para os personagens.

“Para definir a série, gosto de dizer que somos o oposto do filme ‘Clube de Luta’ (1999)”, contou Segel, rindo, ao NeoFeed. Mais conhecido pela série “How I Met Your Mother” (2005-2014), o ator se refere ao drama de ação dirigido por David Fincher pelos seus protagonistas encontrarem na pancadaria um significado para a vida.

Longe das brigas épicas que Brad Pitt e Edward Norton patrocinavam, os personagens de “Dispatches From Elsewhere’’ buscam novas conexões com o mundo que os cerca e com os outros. Pelos participantes correrem atrás de um tipo de epifania espiritual, suas atividades foram muitas vezes confundidas com as de um culto religioso.

Após ter localizado o criador do jogo, o artista conceitual Jeff Hull, Segel o trouxe para colaborar com o roteiro da série.  Hull foi o fundador do Jejune Institute, que teve sede no distrito financeiro de São Francisco e hoje se encontra desativado.

Tratava-se de uma espécie de sociedade secreta que virou um fenômeno nas ruas da cidade californiana. Também foi tema do documentário “The Institute” (2013), com direção de Spencer McCall.

“Ao assistir ao filme, me dei conta de que era sobre isso que eu queria falar. Dessa vontade de que a vida fosse algo mais, sobretudo nos tempos atuais”, afirmou Segel, no lançamento da série no Festival de Berlim. “Dispatches From Elsewhere” foi selecionada para a mostra Berlinale Series antes de a Alemanha impor o distanciamento social.

Por ter completado 40 anos em janeiro último, o ator diz entender o que levou tantas pessoas a embarcarem em um “jogo vivo”. O mais curioso é que nem elas sabiam o propósito do instituto, o que não as impediu de fazer a inscrição.

“Chega um ponto na vida em que precisamos de certa magia, de alguma coisa que nos tire da mesmice”, disse o ator, também visto em “Sex Tape: Perdido da Nuvem” (2014) e “Os Muppets” (2011).

Foi exatamente essa a promessa que seduziu o personagem de Segel na série, Peter, um expert em computação, preso no percurso de casa para o trabalho e vice-versa.

Depois que ele liga para o número de um telefone publicado em anúncio bizarro, buscando candidatos para “testar comunicação com golfinhos”, Peter acaba no instituto. Intrigado com o que vê, ele sente ter finalmente a chance de escapar de seu cotidiano maçante e da sua invisibilidade.

Ao aceitar participar, depois que o apresentador do instituto explica que “existir não é o mesmo que viver”, Peter forma uma equipe com mais três pessoas. Como ele, elas sentem um vazio existencial. E nem entendem bem o motivo.

Tudo é contato do ponto de vista dos personagens, para que o espectador se sinta como se estivesse no jogo. Simone (Eve Lindley) é uma jovem apaixonada por arte. Janice (Sally Field) é uma senhora que cuida do marido acamado depois de um derrame cerebral. Já Fredwynn (André Benjamin) é um milionário obcecado por teorias da conspiração.

Por se tratar de um “jogo vivo”, o quarteto passa a interagir, sem ter muita noção dos personagens que vão interpretar ou das missões que precisam cumprir. Assim como aconteceu com os moradores de São Francisco, os participantes aqui, transferidos para a Filadélfia, são convocados para fazer coisas no mundo real, tornando-se parte da história.

Por se tratar de um “jogo vivo”, o quarteto passa a interagir, sem ter muita noção dos personagens que vão interpretar ou das missões que precisam cumprir

Eles seguem as pistas escondidas na paisagem urbana e buscam decifrar os enigmas. No caminho, tentam descobrir segredos do próprio instituto e o que aconteceu com Clara (Cecilia Balagot). A garota, que está desaparecida, supostamente teria criado um aparelho capaz de reviver o passado.

Conforme a trama avança, o quarteto vai questionar se tudo é apenas um jogo. Ou seria uma instalação de arte? Ou uma seita? Ou uma forma de manipulação e controle social? É isso que os faz procurar por um sentido mais profundo por trás das missões que recebem.

“Eu mesmo tive de entrar no jogo para entender como tudo funcionava”, contou Segel, que é o produtor da série e diretor de um dos dez episódios, além de criador e protagonista.

“Quando procurei Hull para falar do projeto, ele desligou o telefone na minha cara. Só um mês depois é que fui contatado por e-mail, pedindo que eu estivesse em certa data e um determinado local”, recordou o ator.

Segel topou, assim como faziam os participantes do jogo original. Ao chegar ao endereço designado, teve o celular apreendido, recebeu as instruções e começou a desvendar mistérios pelas ruas.

“Foi um rito de passagem”, lembrou ele, rindo. “Tudo o que eu precisava para entender o que fascinava tanto os participantes do jogo. Todos nós, mesmo não admitindo, estamos em constante busca por significados.”

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