Em julho deste ano, quando o PicPay anunciou a compra do GuiaBolso, fintech especializada em open banking, o BV se viu diante de um problema: achar um novo parceiro para essa área de open finance. Mas Guilherme Horn, diretor de Inovação e Estratégia Digital do BV, tinha uma carta na manga e resolveu sacá-la.
O executivo comunicou para todo o ecossistema ao qual o banco está conectado a sua demanda. Daí veio a indicação do fundo de venture capital Maya Capital para que os executivos do BV conhecessem a startup colombiana Belvo, uma de suas investidas.
“A gente sabia que ela existia, mas não tínhamos muitos detalhes. Estamos marcando uma conversa com o CEO para os próximos dias”, diz Horn ao NeoFeed. Falar com o mercado, estar antenado aos hubs de inovação, não é uma novidade. O BV, entretanto, se diferencia de outros players devido a sua estratégia.
Dos seus R$ 300 milhões destinados ao seu fundo de corporate venture capital, 30% são alocados em 11 fundos de venture capital – algo totalmente incomum no mercado brasileiro. Ou seja, além dos investimentos diretos em startups como Neon, Weel, Olivia, Trademaster, Portal Solar, entre outras, o BV conta com investimento indireto em muitas dezenas de outras companhias.
É também um modo de ter acesso ao conhecimento deles, a estratégia de investimento adotada e, claro, estar próximo das startups que têm mais chance de “acontecer”. O modelo, adotado em meio a pandemia e até então pouco comentado pela instituição financeira, foi detalhado por Horn ao NeoFeed.
Os 11 fundos de venture capital que receberam cheques do BV são Alexia Ventures, Monashees, Redpoint eventures, Iporanga Ventures, Atlântico, Astella, BR Startups, Maya Capital, Mindset Ventures, o israelense Maverick e o Endeavor Catalyst. São alguns dos principais nomes do cenário de inovação no País e no exterior.
“O BV ganha conhecimento do processo e acesso ao deal flow. Além disso, no nosso caso, eles ganham exposição internacional e acesso ao que está acontecendo no setor deles nos EUA e em Israel”, diz ao NeoFeed, Daniel Ibri, sócio da Mindset Ventures.
Horn confirma a tese. “Quando fazemos só um investimento direto, você corre o risco de sofrer aquela seleção adversa”, diz o executivo. “O bom empreendedor vai procurar ou é procurado pelos fundos Tier 1. Não tem jeito. Esse cara dificilmente vai chegar em um investidor estratégico ou um corporate venture capital.”
Ao estar financeiramente conectado com fundos de venture capital como investidor, o BV, que pertence ao grupo Votorantim e ao Banco do Brasil, cria um ambiente para não "ficar de fora dessa festa". “Hoje, te diria que não tem uma fintech no Brasil que, de alguma forma, não esteja no nosso radar. Sabemos tudo o que está acontecendo”, diz Horn.
A ligação com os fundos também traz mais confiança no momento das indicações de fornecedores, caso da Maya Capital com a Belvo, por exemplo. “Ouvir de quem fez o investimento, analisou e tem um relacionamento, é completamente diferente do que fazer um call frio. Tem uma transferência de confiança, que é importante”, diz Horn.
Leonardo Teixeira, sócio do Iporanga Ventures, explica ao NeoFeed como funciona essa relação entre o investidor, o fundo e as investidas. “O BV tem sido um excelente LP (Limited Partner). São super engajados em conhecer o portfólio e adicionar valor”, afirma Teixeira. “A lógica de um investidor estratégico, como o BV, é ‘ver’ com os olhos do fundo.”
E, segundo o sócio do Iporanga, o banco é bem receptivo a escutar as empresas investidas do fundo. Ele dá o exemplo da Klavi, uma fintech que atua em open banking e é especializada em inteligência e processamento de dados financeiros com foco no segmento B2B.
Em agosto, a startup recebeu um aporte de R$ 6,5 milhões, em rodada liderada pela Iporanga Ventures em conjunto com a Parallax Ventures. “O Iporanga é nosso investidor e nos ajuda com network e oportunidades de negócios. Eles fizeram a ponte e estamos tentando ajudar a BV com soluções de open banking”, diz Bruno Chan, fundador e CEO da Klavi, ao NeoFeed.
Mentalidade da inovação
Horn, do BV, é um dos executivos que mais entendem de inovação e empreendedorismo no Brasil. Foi fundador da Ágora, vendida para o Bradesco; criou a Órama; ocupou o cargo de managing director da Accenture e, recentemente, lançou o livro “Mindset da inovação”. Como bem diz o nome da obra, a mentalidade da inovação tem de ser aberta.
“Não dá para pensar que eu vou ter as melhores soluções dentro de casa, quando a gente tem, no mundo todo, alguém tentando resolver qualquer problema que você pensar. É até uma posição arrogante como empresa achar que eu tenho capacidade para ter as melhores soluções sozinho”, diz Horn. “Esse é o princípio que rege a nossa estratégia ao lado dos fundos de venture capital.”
“Tem um aprendizado enorme. Saber onde esses caras estão colocando dinheiro, se é no blockchain, em realidade aumentada ou virtual, em metaverso”, afirma Horn. Os investimentos são usados para identificar as tendências que vão ditar as regras no mercado.
Para isso, os executivos do BV têm reuniões bimestrais com os fundos e, claro, papos informais com seus gestores. Se o banco se interessa por uma startup e deseja fazer investimento direto nela ou contratar seus serviços, aí entra em cena a necessidade.
No caso de crédito, o core de um banco, é mais fácil. “Se a gente testa e funciona, contratamos mais rápido.” No caso da busca exploratória, o ciclo é mais longo. “Em computação quântica, por exemplo, pode ser que eu leve anos para contratar uma startup porque não é uma coisa tão óbvia assim”, diz Horn.
Mas o executivo trabalha identificando oportunidades em várias áreas e teses. Uma delas é relacionada a mobilidade. Como o financiamento de veículos é um dos mais importantes para a empresa, hoje com uma carteira de crédito de R$ 41,8 bilhões, e está passando por uma grande revolução, o BV analisa tudo: compartilhamento de veículos, assinatura de carro, entre outros.
Outras teses envolvem startups de energia solar e de dados. Por último, o banco olha tecnologias emergentes como computação quântica, blockchain, metaverso, realidade virtual. “A computação quântica vai vir mais rápido do que o mercado está prevendo e temos de estar preparados.” Para isso, não faltam boas conexões.