Quem passa em frente à loja da Motchimu, inaugurada há pouco mais de um mês na rua Dr. Mello Alves, pode facilmente achar que se trata de uma nova joalheria no bairro paulistano do Jardins, em São Paulo. Não deixa de ser. Mas a joia em questão é feita apenas de arroz, pesa menos de 20g e atende pelo nome de motchi, bolinho típico da culinária japonesa.
Tradicionalmente consumido nas festas de ano novo ou como símbolo de fartura e prosperidade para celebrar nascimentos e casamentos, o doce agora foi elevado à posição de iguaria pelas mãos da família Murakami. Mais especificamente pela esposa do premiado chef de cozinha Tsuyoshi Murakami, Suzana, que vem desenvolvendo a receita há mais de 50 anos, e pelo filho Jun, que está à frente do empreendimento.
Feita apenas com o arroz de mesmo nome, demolhado, triturado e cozido no vapor, a massa glutinosa, leve e delicada pode ser consumida pura ou recheada com diferentes sabores. “No Japão, eles comem o motchi com pratos salgados, como caldos e algas, ou doce, recheado com doce de feijão ou grelhado na brasa com shoyu e açúcar”, conta Suzana ao NeoFeed.
A artista plástica e confeiteira autodidata, que começou a produzir os quitutes para o restaurante da família antes mesmo de se casar com Murakami. Na época, a casa que viria a ficar famosa ainda ficava no bairro da Liberdade e era tocada por seu pai, Toshio Kinoshita.
Com investimento de R$ 1,2 milhão, a Motchimu combina o conceito de “motchiteria” com casa de chá, ambas seguindo o mesmo padrão de alta qualidade e sofisticação estabelecidos no restaurante de Murakami, onde os bolinhos já faziam sucesso como sobremesa.
O projeto minimalista assinado pelo escritório de arquitetura e design Naoki Otake remete ao de uma joalheria e uma arte do grafiteiro Speto finalizada com folhas de ouro dão o clima local. Numa mesa para nove comensais é possível provar o doce e harmonizá-los com chás.
No balcão de vidro com abertura tipo gaveta são ofertados a cada dia no máximo 12 variedades do doce. Indo das mais tradicionais, com o de feijão azuki e matcha, até criações próprias e sazonais, como a com ganache de chocolate amazônico bean-to-bar, manteiga de amendoim ou doce de dekopon (variedade de tangerina). Cada esfera com cerca de 5 cm de diâmetro, “para comer em duas bocadas”, é vendida a R$ 10 (apenas a de matcha sai R$ 12).
Para acompanhar uma carta de chás trazidos de produtores exclusivos (alguns com mais de 450 anos de tradição) está sendo montada para aumentar a experiência. Infusionados em Acqua Panna “para trazer mais leveza e elegância”, um guenmaicha (chá verde com arroz torrado) sai R$ 30 a xícara e um matcha tradicional, R$ 50.
Quem quiser uma degustação guiada poderá optar por menus harmonizados cujos preços variam de R$ 120 a R$ 300 e devem ser agendados com antecedência. “De tempos em tempos, também teremos cardápios especiais para as pessoas experimentarem o motchi de outras formas, incluindo a versão salgada”, diz o jovem empresário, que no momento estuda formas de colocar a marca nas plataformas de delivery sem prejuízo ao produto.
Para ele, a abertura de uma segunda loja em Nova York, “no bairro do Soho”, já no próximo ano, é o único movimento de expansão possível para a marca. “Esse tipo de motchi e o conceito de marca são únicos no mundo todo. O que fazemos aqui é arte”, garante. “Conseguimos colocar um olhar cool e moderno sobre um produto tradicional”, completa.
Um corner da marca voltado para eventos a partir de 100 pessoas (ou 1.500 motchis), entretanto, já está sendo providenciado para aflição de Suzana. “Já tive tendinite boleando 200 motchis para eventos. Imagina agora”, lembra. Mas a maior dificuldade para escalonar a produção é arrumar mão de obra qualificada para fazer a massa.
“Não é uma questão de técnica, é preciso ter sensibilidade e dom para saber exatamente o ponto, que pode variar de textura dependendo do grão, da umidade”, explica ela, que hoje conta com quatro funcionárias para garantir diariamente 3 kg de massa.
Para minimizar o gargalo, a ideia é que o número de ajudantes dobre e, nos eventos, os bolinhos sejam recheados e boleados na hora, em frente ao cliente, aumentando a dose de espetáculo do serviço ainda sem preço fechado.
Jun ainda conta com a popularização da confeitaria japonesa, principalmente a yogashi, que combina ingredientes orientais, como matchá, yuzu e missô, com técnicas francesas - fusão iniciada no pós-guerra e acelerada principalmente na década de 1990, quando muitos confeiteiros franceses começaram a desembarcar no Japão, dando início a uma nova fase da doçaria oriental – para expandir em outras frentes de negócio, tendo o motchi como base.
O docinho de arroz, que recentemente ganhou ainda mais notoriedade após ser lançado como desafio culinário aos participantes do programa MasterChef Brasil e já extrapolou os redutos orientais para ser vendido como sorvete na rede Pão de Açúcar, será o mote para uma segunda marca ainda mantida em segredo.
Inspirado no Milk Bar de Nova York, da chef confeiteira Christina Tosi, o novo empreendimento de Jun Murakami, previsto para ser aberto no primeiro semestre de 2023, será uma versão mais pop do próprio Motchimu, com mais de 50 produtos variados, de sorvetes a doces de vitrine, chás para take away, salgadinhos, congelados e chocolates, com possibilidade de expansão por franquias e venda em redes varejistas.
A primeira parceria para a empreitada já foi firmada com a chocolatier Luiza Abram, que assumiu a produção das barras de chocolate branco com matcha já disponíveis na Motchimu. “São negócios que no futuro estarão todos amarrados e conversando entre si”, adianta Jun sem dar mais detalhes.