A indicação de Gabriel Galípolo, de 42 anos, para assumir a presidência do Banco Central pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, anunciada na tarde desta quarta-feira, 28 de agosto, não surpreendeu o mercado financeiro. Mas, caso o nome seja confirmado pelo Senado, o futuro novo presidente do BC tem várias armadilhas que precisa se desviar para não perder a credibilidade.
Ao longo dos últimos dois anos, o presidente Lula foi um crítico contumaz da política monetária do Banco Central e, em especial, de Roberto Campos Neto, o atual presidente.
Agora, com um nome indicado por Lula, a pergunta que muita gente no mercado financeiro se faz é se Galípolo conseguirá manter a sua independência ou cederá aos apelos do presidente Lula para baixar os juros.
Essa é uma resposta que só o tempo dirá. Mas, em agosto, Galípolo começou a endurecer o tom em suas participações públicas para acenar uma correção na taxa. Mas, em vez de cair, indicou que poderia subir.
Isso levou o sócio da Verde Asset, Luis Stuhlberger, em um evento, a dizer que “Galípolo vai em baile de debutante e diz que vai subir a Selic, espontaneamente, sem ninguém perguntar”.
No mesmo evento, André Jakurski, sócio da JGP, a comentar, em tom de ironia, disse que Campos Neto ficou dovish (brando) e Galípolo, hawkish (agressivo). E acrescentou: “O Brasil não vai ser um país de juro real baixo tão cedo”, disse o gestor.
Para o economista Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, que hoje leciona na Universidade Georgetown, nos Estados Unidos, a grande fragilidade de Galípolo poder ser um trunfo: seu relacionamento muito próximo ao governo.
“Isso coloca a questão do compromisso com o sistema de metas versus a tentativa de olhar várias coisas ao mesmo tempo, como muitos fizeram no passado e que não funcionou muito bem”, afirma Volpon, referindo-se a eventuais armadilhas a serem enfrentadas por Galípolo.
Volpon, no entanto, diz que o novo indicado poderá usar esse relacionamento próximo para explicar ao Planalto, quando for necessário, que a melhor coisa é seguir a política monetária de forma austera, ter esse compromisso com a meta e, com isso, diminuir o ruído da relação difícil dos últimos anos entre Roberto Campos Neto e Lula.
“Já que agora foi nomeado, a decisão que Galípolo tomará na reunião do Copom em setembro e nas seguintes serão importantes para sinalizar ao mercado o compromisso que tenha ou não com o sistema de metas”, diz Volpon.
Dois presidentes
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, observa que as reuniões do Copom contarão com dois presidentes até dezembro deste ano. Por conta disso, a comunicação de Galípolo será mais considerada do que as falas de Campos Neto.
“Na semana passada, teve uma construção mais dura do Galípolo, que ele até tentou reverter um pouco, mas é difícil dissociar o fato de que ele sabia da indicação, quando deu as declarações e ponderou isso depois”, diz. “Pode ser indicativo de que falas futuras dele serão menos incisivas ou imprudentes do que as feitas na semana passada.”
Sanchez, porém, acredita que as falas de Galípolo representaram uma tentativa de buscar credibilidade, algo que não se faz da noite para o dia. “Não acho que será parecido com o Tombini, que hoje sabemos ter tido uma condução imprudente da política monetária”, afirma Sanchez.
O economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, chama a atenção para um dos focos da disputa entre o presidente Lula e Roberto Campos Neto - a autonomia do BC, aprovada pelo Congresso Nacional em 2021. "A nomeação de Galípolo vai ser importante para consolidar a agenda de um Banco Central independente", afirma.
Isaac Sidney, presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirma que o fato de Galípolo já fazer parte da diretoria do BC há mais de um ano, participando de todas as discussões e decisões sobre política monetária, deu a ele plenas condições para assumir a presidência da autoridade monetária.
“Fui diretor do BC, integrei o Copom e pude entender o quanto é importante essa vivência interna no coração do BC”, diz Sidney, que elogiou a escolha, em nota.
A escolha de Galípolo foi elogiada por Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Conselho de Administração do Bradesco. Segundo ele, as qualidades técnicas do novo indicado foram comprovadas em sua gestão à frente da Diretoria de Política Monetária do BC.
“Galípolo demonstra ser um homem de visão ampla, preocupado com o bem maior da economia e da Nação”, afirma Trabuco Cappi, em nota. “Nossa expectativa é que exercerá uma gestão vitoriosa em sua missão principal de manter a inflação sob controle, mas com a visão ampliada das circunstâncias de um Banco Central que ocupa hoje papel central na formação da estabilidade dos mercados.”
A carreira de Galípolo
Mestre em economia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Galípolo tem no currículo passagens pelo governo do Estado de São Paulo, atuando na secretaria dos Transportes Metropolitanos em 2007 e na secretaria de Economia e Planejamento em 2008.
Ele fundou sua própria consultoria, a Galípolo Consultoria, em 2009, e entre 2017 e 2021 foi presidente do Banco Fator, além de ter sido conselheiro da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em 2022.
Já no governo Lula, foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda até ser nomeado, em julho do ano passado, como diretor de Política Monetária do BC.