O diretor de Política Monetária do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, admitiu na sexta-feira, 16 de fevereiro, que a meta da equipe econômica do governo federal de atingir déficit zero nas contas pública em 2024 não será cumprida. Galípolo demonstrou estar alinhado à expectativa do mercado financeiro, refletida na pesquisa Focus, do BC, que aponta 90% de possibilidade de que o déficit feche o ano em 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB).

“Observando o que já está refletido nas expectativas do mercado, deveremos fechar o ano com déficit de 0,8% do PIB”, afirmou Galípolo ao economista-chefe da Bradesco Asset, Marcelo Toledo, que conduz um programa mensal de entrevistas no YouTube.

O déficit primário zero consta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, aprovada pelo Congresso em dezembro. Segundo Galípolo, é preciso ter coerência entre essa expectativa de déficit em 0,8% do PIB com outras variáveis para projetar o impacto nos preços.

“A grande maioria das pesquisas de mercado prevê mudança da meta. A expectativa maior é como será percebido o compromisso do governo em torno do equilíbrio fiscal do que efetivamente o debate em torno de um número”, acrescentou.

O diretor de Política Monetária do BC traçou um cenário positivo da economia brasileira em meio a um período turbulento dos últimos meses, com as autoridades monetárias de vários países, em especial do Primeiro Mundo, ainda lutando para desacelerar a inflação para começar a cortar os juros, processo que o BC deu início em agosto de 2023.

“Estamos vivendo um momento paradoxal, com autoridades monetárias e agentes do mercado atuando com cautela em razão de surpresas positivas”, afirmou, referindo-se aos números positivos de atividade econômica e da resiliência do mercado de trabalho em meio a um processo de desinflação global, roteiro que foge dos manuais de economia.

“A insegurança dos agentes se deve à diferença entre o que era previsto e o que de fato ocorreu, trata-se de uma marca do período atual”, disse Galípolo, citando ainda o excelente desempenho da balança comercial, mesmo num cenário contracionista global.

Surpresas positivas

Entre as surpresas positivas da economia brasileira, o diretor do BC aponta, além do crescimento do PIB e da queda da inflação em 2023, o pequeno efeito de impactos ocorridos na economia global, como a súbita elevação dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos e a desaceleração econômica da China.

“O primeiro corte da taxa Selic, em agosto, coincidiu com as elevações das Treasuries, tínhamos preocupação com o impacto no câmbio e na inflação corrente, mas o real se comportou bem”, disse, lembrando que não foi necessária nenhuma intervenção adicional do BC no segundo semestre para regular a taxa de câmbio.

Nem mesmo a divulgação, no início a semana, do índice de inflação nos EUA acima do esperado – o que deve adiar o início do ciclo de cortes de juros pelo Federal Reserve (o BC americano) para o meio do ano – preocupa a autoridade monetária brasileira.

“Não vemos grandes impactos na revisão de expectativas em relação ao Brasil, devemos seguir nossa trajetória de voo”, afirmou Galípolo, referindo-se à manutenção do ritmo de cortes da Selic, em 0,5 ponto percentual por reunião do Copom.

O mesmo ocorre quanto a um ponto de preocupação de contágio da inflação corrente com a perspectiva de inflação futura.

“Tive duas reuniões com diferentes agentes do mercado nos últimos dias e ambos traçaram correlações entre um reajuste maior do salário mínimo e a inflação, mas estamos com dificuldade de prever uma correlação elevada na transmissão, o que é intuitivamente esperado pelo BC”, disse.

Segundo ele, até o calendário está favorável ao BC, que terá 45 dias entre as reuniões do Copom para avaliar o corte da Selic: "Teremos três medições de IPCA entre as reuniões do Copom para saber se vai se configurar algum tipo de tendência de aumento da inflação."