Depois da reviravolta na economia global provocada pela pandemia, que desestruturou as cadeias de suprimento com efeitos que perduraram nos últimos três anos, como o aumento da inflação e das taxas de juros, o mundo já está entrando num novo superciclo de crescimento impulsionado por dois fatores: o desenvolvimento da inteligência artificial (IA) e o avanço do processo de descarbonização.
O alerta - ou a boa notícia - é do economista britânico Peter C. Oppenheimer, estrategista-chefe de ações globais e chefe de Investigação Macro na Europa do Goldman Sachs. Em entrevista à rede americana CNBC, Oppenheimer ressalta que, embora os superciclos sejam um fenômeno recorrente na economia global, o atual guarda características próprias, semelhantes às verificadas apenas no final do século 19.
“Estamos claramente caminhando para um superciclo diferente”, diz Oppenheimer, autor de dois livros sobre o tema, incluindo o recém-lançado Any Happy Returns. (“Qualquer retorno feliz”, em tradução livre).
Segundo ele, os superciclos são normalmente definidos como longos períodos de expansão econômica, muitas vezes acompanhados por um PIB crescente, uma forte procura de bens que conduz a preços mais elevados e a elevados níveis de emprego.
“O mais recente superciclo significativo que a economia mundial viveu começou no início da década de 1980”, observa Oppenheimer, lembrando que esse ciclo foi caracterizado pelo pico das taxas de juro e da inflação, mas antecedido por um período de décadas de queda dos custos de capital, da inflação e de juros, e outros fatores macroeconômicos, como a desregulamentação e a privatização.
Entre os efeitos desse superciclo recente, Oppenheimer cita a redução de riscos geopolíticos e o avanço da globalização da economia. Mas adverte que nem todos estes fatores deverão manter essa trajetória neste novo período.
“Não é provável uma tendência de descida tão agressiva das taxas de juro ao longo da próxima década, da mesma forma, estamos assistindo a um retrocesso na globalização, além do aumento das tensões geopolíticas”, diz.
Ele cita a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, as tensões entre os EUA e a China, em grande parte relacionadas com o comércio, e o conflito Israel-Hamas como fatores negativos ligados a tensões geopolíticas.
Embora a atual evolução econômica deva, teoricamente, levar a um abrandamento do ritmo dos retornos financeiros, a diferença em relação ao ciclo anterior, na visão do especialista, se baseia nos dois fatores que poderão causar um impacto positivo à economia global: a inteligência artificial e a descarbonização.
“A IA ainda está numa fase inicial, mas à medida que é cada vez mais utilizada como base para novos produtos e serviços, poderá levar a um efeito positivo na economia”, afirma Oppenheimer,
“O segundo fator, que ainda não vimos, e acho que estamos relativamente certos de que veremos, é uma melhoria na produtividade apoiada nas aplicações de IA, o que poderia ser positivo para o crescimento e, é claro, para as margens de lucro”, disse Oppenheimer.
Paralelos históricos
Apesar de a IA e a descarbonização serem conceitos relativamente novos, Oppenheimer diz que existem paralelos históricos, referentes a fatores macroeconômicos.
Um deles é do início da década de 1970 e outro, do início da década de 1980. Segundo ele, esses dois ciclos “não são tão diferentes” dos desenvolvimentos atuais.
“A inflação e as taxas de juro elevadas foram talvez questões mais estruturais do que as atuais, mas fatores como as crescentes tensões geopolíticas, o aumento dos impostos e o reforço da regulamentação parecem semelhantes”, observa.
Oppenheimer vê paralelo entre esse novo ciclo com outro, muito mais antigo, em termos históricos. “Devido a este tremendo choque duplo que provavelmente veremos, um choque positivo de inovação tecnológica a um ritmo muito rápido, juntamente com a reestruturação das economias para avançar em direção à descarbonização, penso que é um período que é realmente mais parecido com o que vimos no final do século 19”, relata.
Segundo ele, este período histórico foi marcado pela modernização e a industrialização, alimentadas por infraestruturas e desenvolvimentos tecnológicos, juntamente com aumentos significativos de produtividade.
“Crucialmente, estes paralelos históricos podem fornecer lições para o futuro”, afirma o especialista do Goldman Sachs, enfatizando que os ciclos e as rupturas estruturais se repetem, mas nunca exatamente da mesma maneira.
“Precisamos aprender com a história quais são as inferências que podemos observar para nos posicionarmos melhor para o tipo de ambiente para o qual estamos nos movendo”, sugere Oppenheimer.