O governo Lula encerra um ciclo na sexta-feira, 1º de março, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciar a taxa de crescimento da economia brasileira no quarto trimestre e em 2023.
Apesar da agenda carregada de indicadores domésticos e internacionais nos próximos dias – entre eles inflação e atividade na Europa e China e desempenho da economia americana no quarto trimestre – as atenções do mercado e do governo estarão voltadas ao Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Informação de elevado potencial midiático.
Na véspera, quinta-feira 29 de fevereiro, o Banco Central (BC) divulgará o resultado consolidado das contas públicas em janeiro. O primeiro sob o novo arcabouço fiscal e no embalo da arrecadação histórica também de janeiro. Os dados são relevantes para o balizamento de projeções para o ano.
Mas o resultado do PIB é a informação que representará um marco para o governo, deverá fortalecer ainda mais Fernando Haddad e impor um desafio para o BC. A conservadora gestão monetária não aniquilou a atividade, mas a desaceleração já identificada contrata delicada tarefa para 2024.
A perspectiva de expansão do PIB de 2023, entre 2,9% e 3%, coloca o governo em vantagem ante uma centena de agentes financeiros que descredenciavam, até pouco tempo atrás, a possibilidade de a economia ter um desempenho promissor.
O fôlego do setor agrícola e o empenho do governo em promover expansão fiscal resultou numa aposta certeira: o PIB poderá reprisar a alta de 2,9% de 2022 e com um “chorinho”. Entretanto, o resultado do quarto trimestre poderá ser levemente negativo ou ter um avanço pífio.
Trajetória que desautoriza otimismo rasgado para 2024, ainda que o cenário externo seja mais favorável porque as grandes economias não devem desabar e os maiores bancos centrais do planeta devem cortar os juros. Essa iniciativa, contudo, pode não ser tão rápida a ponto de sancionar uma aceleração de cortes pelo BC de Roberto Campos Neto.
Divulgada na quarta-feira, 21 de fevereiro, a ata do comitê de política monetária do Federal Reserve (Fed) indicou que o BC americano não tem pressa para reduzir sua taxa básica por não estar convencido de que a inflação seguirá em queda consistente. E por observar que a economia está firme apesar da política monetária em curso.
Já a economia brasileira não segue de vento em popa. Publicados na segunda-feira, 19 de fevereiro, o Índice de Atividade do Banco Central (IBC-Br) e o Monitor do PIB do FGV Ibre apontaram expansão anual do PIB de 2,45% e 3%.
Entretanto, as variações apuradas no último trimestre – de 0,22% no IBC-Br e de 0,1% no Monitor – confirmaram desaquecimento nos últimos meses captado pelo IBGE em estatísticas já divulgadas.
“Escadinha” do PIB dispara alertas
De janeiro a março de 2023, informou o Instituto, o PIB cresceu 1,4%; de abril a junho, 1%; e, de julho a setembro, 0,1%. Essa “escadinha” declinante não deverá, porém, ofuscar a capitalização pelo governo dos efeitos positivos da política econômica praticada. E que, para além da força da agropecuária, foi sustentada pela renda expandida por salários e programas sociais.
É justa a celebração do crescimento econômico que poderá reverberar favoravelmente em índices de confiança de consumidores e empresários e na avaliação popular do governo. Porém, a comemoração não dispensa uma dose de cautela quanto ao comportamento futuro da atividade.
E há ao menos uma razão para isso. Em 2024 ainda estará ativo o constrangimento imposto pela política monetária restritiva executada pelo BC que não dá sinal de que poderá ser leniente no combate à inflação e, sobretudo, no controle das expectativas que seguem desancoradas.
Na terça-feira, 27, a inflação medida pelo IPCA-15 de fevereiro poderá alcançar 4,50% em 12 meses, após cravar 4,47%, em janeiro. Portanto, mantendo distância da meta contínua de 3% perseguida pelo BC, a partir deste ano.
E a última edição da Pesquisa Focus, publicada na quinta-feira, 22 de fevereiro, não trouxe refresco. A estimativa para o IPCA desse ano ficou em 3,81% e, para os anos seguintes, no patamar de 3,50%.
A mesma rigidez observada nas projeções de inflação se aplica à Selic. O mercado mantém a aposta em 9% no final do ano e em 8,5% até 2027. A partir desses parâmetros, o juro real cairá de quase 7% em 2023 para cerca de 5%. Bem salgado, ainda que próximo ao neutro preconizado pelo BC.
É fato que a economia seguirá embalada por transferências governamentais, salário mínimo maior e, adicionalmente, pelo pagamentos de precatórios. Em dezembro, o governo creditou R$ 90,7 bilhões para quitar essas dívidas judiciais referentes a ações movidas por pessoas físicas e empresas. E, em 2024, mais R$ 80 bilhões poderão ser injetados na economia.
Mas o juro, talvez em queda menos pronunciada quanto deseja o Executivo, ganhará relevância como propulsor do crescimento via crédito bancário e por abrir espaço às emissões de dívidas corporativas e ações – instrumentos que melhoram o perfil de capital das empresas e reduzem custos.
É imprudente, porém, contar com expansão generosa do crédito convencional. Pesquisa de Economia Bancária e Expectativas da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), divulgada na segunda-feira 19 de fevereiro, prevê aumento de 8,4% no estoque de crédito em 2024, acréscimo discreto ante a expansão de 7,9% no ano anterior. Mas muito inferior à alta de 14,5% em 2022.
Não à toa, o governo ensaia fortalecer o crédito direcionado, criando um portal que permitirá aos tomadores comparar taxas e prazos e escolher instituições para obter recursos, o que não é permitido hoje; estender o Desenrola Brasil às empresas; e popularizar o marco de garantias que poderá reduzir o custo de captação dos bancos e produzir efeito positivo sobre o custo final do crédito.