Durante a crise financeira de 2008, Leonard Lauder, um dos herdeiros da empresa de cosméticos francesa Estée Lauder, criou o lipstick index. O "índice do batom" é um indicador econômico segundo o qual, em tempos de incertezas econômicas, os consumidores se permitem pequenos luxos — uma espécie de válvula de escape emocional nos períodos de recessão. Durante muito tempo, a teoria do empresário se provou verdadeira.
No pós-pandemia de Covid-19, por exemplo, o mercado de beleza e cuidados com a pele apresentou um crescimento astronômico tanto em vendas quanto em investimentos. Apenas em 2021, as empresas do setor receberam cerca de US$ 1,5 bilhão em empresas de beleza — US$ 600 milhões acima dos aportes de 2019, antes da crise sanitária, conforme a consultoria americana Pitchbook. Mas, pela primeira vez, desde sua formulação, a tese de Lauder parece não se provar mais.
No primeiro trimestre de 2025, os balanços financeiros das grandes empresas de beleza indicaram um desempenho fraco, aquém das expectativas. A Coty é um exemplo. Dona de mais de 40 marcas, a companhia registrou um recuo de 6% em suas vendas — o que obrigou a empresa a reduzir sua previsão de lucro anual e a anunciar a demissão de 700 funcionários, cerca de 5% de sua força de trabalho.
A lista de empresas com desempenho aquém do esperado, no entanto, é mais extensa. Na LVMH, maior conglomerado de luxo do mundo, as divisões de varejo que incluem marcas como Sephora e as unidades próprias de perfumes e cosméticos não apresentaram crescimento no trimestre — o que é raro.
A L’Oréal, líder global de beleza e cosméticos, apresentou um crescimento de 3,5% nos três primeiros meses do ano. Uma evolução tida como "simbólica" frente aos ganhos de dois dígitos atingidos com frequência pela marca. E a receita da Shiseido, gigante japonesa do setor, caiu 9% na comparação com o ano anterior, apesar de vendas consistentes no país asiático.
Os representantes das marcas afirmaram que a atual desaceleração se deve a uma redução de estoques por parte dos varejistas, que estão controlando mais as suas compras.
Por outro lado, os executivos também afirmaram que a incerteza econômica e a tensão sobre o futuro das tarifas de Donald Trump estão impactando o mercado como um todo.
Outro fator que parece estar enfraquecendo o desempenho dessas companhias é a queda no consumo na China. Até pouco tempo atrás, as gigantes do setor contavam com os bolsos cheios dos chineses, que aproveitavam para fazer compras em lojas duty free durante suas viagens, para impulsionar o crescimento dos ganhos. Em 2024, porém, essa bonança passou — pelo menos por enquanto. Em 2025, a desaceleração continua.
Na visão dos analistas ouvidos pelo portal The Business of Fashion (BOF), o real motivo para as perdas está na mudança de comportamento dos consumidores.
Para eles, o mercado entrou em uma era de maior seletividade por parte dos clientes, que passam a moderar suas compras e focar no que “realmente importa”.
Para o analista da TD Cowen, Oliver Chen, a mudança de rumo é clara: “Não é como comida, você não precisa de cosméticos”. A publicidade também pode estar contribuindo para o novo cenário. No último ano, as marcas têm focado em divulgar seus produtos mais caros, buscando menos vendas e receitas superiores.
Um problema, porém. Grande parte dessas empresas precisa dos consumidores de classe média, que costumam ser a base de suas vendas, mas agora estão receosos em abrir a carteira.