A iniciativa de estruturar um corporate venture capital (CVC) exige esforço extra das corporações. Um relatório da consultoria Bain & Company bem pontua que esta é uma atividade com mentalidade "não corporativa", na qual os prazos, incentivos e tolerância ao erro são completamente diferentes.

Apesar da aparente exuberância atual, me preocupo que esse cenário não se sustente por desafios de execução. Nesse ritmo, em dois ou três anos, 90% dos atuais CVCs no Brasil não devem ser renovados e devem deixar de existir.

Essa constatação vem de conversas, observações e da minha experiência de hoje como sócio da Iporanga Ventures, gestora de fundos de venture capital (VC), e anteriormente como líder no Brasil do programa de CVC da Telefônica.

Mas por que escrever isso agora? Porque ainda há tempo para as coisas mudarem.

O relatório da Bain traz informações interessantes e aponta boas práticas reais, mas faltam alguns pontos vitais, frutos da experiência prática operando CVCs e VCs. Destaco dois aspectos:

Vintages

Um programa de CVC deve idealmente ser submetido à aprovação dos Conselhos de Administração considerando pelo menos três ciclos.

Esses ciclos representam três fundos que sustentarão o programa por pelo menos dez anos (cada fundo tem duração de 10 anos, em média, pois investe durante três ou quatro anos e desinveste em seis ou sete ).

Este é um prazo necessário para começar a ter retornos significativos, reciclar capital, gerar confiança na liderança corporativa e assegurar a perenidade do programa.

Além disso, essa estruturação passa uma mensagem poderosa ao mercado. Mostra o quanto a empresa entende os ciclos, dissipando desconfianças de empreendedores sobre ser apenas uma parte do "teatro da inovação".

Portfólio

A diversificação em um portfólio, com investimentos diretos e indiretos, é essencial para gerar retorno financeiro e estratégico. Construir um portfólio amplo só é possível por meio de investimentos diretos em startups e indiretos via fundos de venture capital.

A relação com VCs deve ser simbiótica. Primeiro, pela troca de conhecimento, tendências e insights de mercado. Segundo, para ter acesso às melhores oportunidades.

Os melhores empreendedores não querem CVCs, principalmente no começo da jornada. Eles querem ser os novos incumbentes. São esses que vão mudar os mercados, são os que vão incomodar. E eles querem capital apenas dos VCs.

A forma de se proteger é investir como um limited partner (LP) em um VC e, assim ter informação estratégica do que está acontecendo, além de poder antever movimentos, construir teses de defensibilidade e ataque, poder eventualmente co-investir, ou mesmo se aproveitar de janelas importantes de M&A.

Os melhores CVCs entendem que são followers nas rodadas e os investimentos diretos têm maior probabilidade de dar certo se forem liderados ou indicados por um VC parceiro.

Os CVCs são parte fundamental para o desenvolvimento do ecossistema de inovação brasileiro e mundial. O mercado é cíclico. Hoje, estamos no inverno dos VCs (que deve durar mais dois ou três anos) e temos risco real de os CVCs não terem dry powder quando o mercado virar.

Dito isso, discutir e difundir as boas práticas dos melhores players é um dever de quem tem dedicado a última década a esse desenvolvimento e aprendeu alguma coisa. Fazer um investimento em uma startup é a coisa mais fácil do mundo, o desafio é estar ali pelos próximos dez anos para colher os louros e também os fracassos.

* Renato Valente é sócio da Iporanga Ventures, gestora de venture capital investindo no "Future of Finance". Antes foi empreendedor e líder do programa de inovação aberta da Telefónica no Brasil.