Desde que Jeane Tsutsui assumiu o comando do Fleury, em abril do ano passado, o grupo imprimiu um ritmo acelerado de M&As. Foram sete aquisições que consumiram mais de R$ 1 bilhão – nesta conta não está a compra do laboratório Hermes Pardini, uma transação em dinheiro e ações, anunciada em junho deste ano, que ainda precisa de aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
As operações reforçaram o negócio principal do Fleury, que é o braço de medicina diagnóstica, com as aquisições dos Laboratórios Pretti e Bioclínico, no Espírito Santo; e Marcelo Magalhães, em Pernambuco. Mas também abriram novas fronteiras de receita ao grupo com as compras do CIP (Centro de Infusões Pacaembu), da Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha, do Instituto Vita de Ortopedia e do Saha.
“Estamos criando um ecossistema que une medicina diagnóstica com novos serviços voltados para algumas especialidades”, diz Tsutsui, ao NeoFeed. “Deixamos de ser uma empresa que faz só o diagnóstico.” Pois o Fleury está colocando em prática esse discurso com um plano orgânico para avançar para além da medicina diagnóstica, usando como fortaleza dessa expansão o seu principal ativo: as suas próprias unidades de atendimento.
Na prática, vai abrir clínicas ao lado ou dentro de suas unidades de análises clínicas. Um exemplo dessa estratégia acontece nesta quinta-feira, 15 de setembro, quando o Fleury inaugura uma clínica ortopédica Vita, em São Paulo, colada a uma unidade de medicina diagnóstica do Fleury. É a terceira deste ano, das seis previstas para 2022. Quando comprou 66% do Vita, por R$ 136,8 milhões, o Fleury herdou oito clínicas ortopédicas.
Com a nova clínica, a ideia é que o paciente, após passar por uma consulta, possa já ser atendido no laboratório para realizar exames de imagens ou outros pedidos realizados pelos médicos. Atualmente, 60% dos clientes da Vita já realizam exame no Fleury. O plano é aumentar esse percentual.
As áreas de infusão de medicamentos e de oftalmologia seguirão expansão semelhante. Mas em vez de inaugurar clínicas contíguas ou próximas às unidades de atendimento de medicina diagnóstica, a ideia é usar os espaços já existentes para realizar os atendimentos.
No caso da Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha, já existem três unidades do Fleury que estão realizando atendimento oftalmológicos. Em infusão, são quatro centrais de atendimento. “Estamos usando a mesma estrutura e o mesmo metro quadrado existente”, afirma Tsutsui.
O Fleury não dá guidance sobre o plano de expansão das áreas de ortopedia, oftalmologia e infusão. Neste primeiro momento, São Paulo será o cenário do avanço. Mas Tsutsui diz que é preciso primeiro testar o modelo para depois pensar em uma expansão para outras cidades e Estados.
Atualmente, a companhia conta com quase 300 unidades de atendimento espalhadas por 9 Estados e no Distrito Federal. Se a compra do Hermes Pardini for aprovada pelo Cade, o grupo vai acrescentar mais 172 unidades, localizadas principalmente em Minas Gerais, Goiás e Pará, onde o Fleury não tem presença.
No segundo trimestre de 2022, os novos elos e plataforma de saúde (que inclui o marketplace Saúde iD) viu sua receita bruta crescer 115% quando comparada com o mesmo período do ano passado. Isso representou 7,4% da receita total do grupo. Há um ano, era 5%. A receita bruta total, de R$ 1,2 bilhão, avançou 19%.
O plano de Tsutsui é seguir crescendo a área de medicina diagnóstica, que responde por mais de 90% da receita do Fleury e atingiu R$ 4,2 bilhões em 2021. Mas, ao mesmo tempo, os novos elos vão pouco a pouco ganhando mais participação no bolo total.
Ao expandir para novas áreas, o Fleury busca, ao seu estilo, mostrar que está se movimentando no setor de saúde para incorporar novas fontes de receita, assim como seus principais concorrentes, que ganharam corpo e musculatura nos últimos anos.
A Dasa, dona das marcas Alta, Delboni Auriemo, Lavoisier e Salomão Zopp, por exemplo, integrou as suas unidades de medicina diagnóstica com a rede de hospitais Ímpar. A Rede D’Or comprou a SulAmérica, entrando em planos de saúde (a transação precisa ainda ser aprovada pelo Cade). E a Notredame Intermédica e Hapvida se uniram, em uma a aposta na verticalização dos serviços de saúde.
Em comum, essas empresas contam com avaliações bilionárias na bolsa de valores. A Rede D’Or vale R$ 65,5 bilhões. A Notredame Intermédica é avaliada em R$ 55,7 bilhões. E a Dasa, R$ 12,9 bilhões. O Fleury, por sua vez, tem valuation de R$ 5,1 bilhões. Neste ano, suas ações caem 4,3%.
A questão é se a diversificação do Fleury para outras áreas será suficiente aos olhos do mercado para fazer as ações se movimentarem. “O ramp-up de novas vias de crescimento deve gerar perspectivas, mas mantemos nossa postura conservadora na geração de valor devido ao seu estágio inicial de maturação”, escreveram Vinicius Figueiredo, Lucca Generali Marquezini e Felipe Amancio, analistas do Itaú BBA.
O Goldman Sachs estimou que as seis unidades da Vita que serão abertas em 2022 devem contribuir com R$ 40 milhões de receita, com baixo impacto no lucro. “Por enquanto, não deve mover o ponteiro da empresa”, escreveram os analistas Gustavo Miele e Emerson Vieira, em relatório.
A compra da Hermes Pardini, se aprovada, vai acrescentar R$ 2 bilhões de receita ao Fleury
O Fleury se movimenta também em outras áreas. Em maio deste ano, anunciou uma joint venture com a Bradesco Seguros e a BP (Beneficência Portuguesa) para criar uma empresa de oncologia, que vai oferecer diagnósticos, consultas e tratamento para pacientes, em um investimento de R$ 671 milhões em cinco anos.
A compra da Hermes Pardini, se aprovada, vai acrescentar R$ 2 bilhões de receita ao Fleury e deve gerar sinergias entre R$ 160 milhões e R$ 190 milhões (10% do Ebitda combinado), por conta de custos de aquisição menores, melhor infraestrutura logística e maior capacidade de processamento de exame (a conta não inclui ainda sinergias por conta de impostos e receitas.)
Novos M&As ainda estão no horizonte do Fleury, de acordo com Tsutsui. “Temos um pipeline de aquisições e olhamos tanto para medicina diagnóstica, como novos elos”, afirma a CEO do Fleury. O mercado espera também que o crescimento orgânico, em especial das novas especialidades, comece aos poucos a girar a roda.