Nos últimos dois anos, o Banco Carrefour passou por uma transformação sob a liderança do CEO Felipe Gomes. Enfrentando um cenário de alta inadimplência no varejo e desafios regulatórios que impactaram o setor de crédito, o executivo conduziu uma reestruturação estratégica que reposicionou o banco, ampliando sua presença digital, diversificando produtos e reforçando sua governança.

No primeiro trimestre deste ano, os números apresentaram crescimento de dois dígitos e começaram a mostrar os resultados desse período de remodelação. A receita operacional líquida cresceu 29,1%, para R$ 1,6 bilhão, e o faturamento aumentou 12,1%, para R$ 17,8 bilhões. A carteira de crédito chegou a R$ 29 bilhões.

“A maior parte do faturamento do banco já não vem de dentro das lojas. O cartão está sendo usado fora”, diz Gomes, em entrevista ao NeoFeed.

Agora, o Banco Carrefour vai avançar na diversificação de produtos financeiros. Os cartões vinculados às marcas do grupo passarão por um processo de unificação. A ideia é que não exista mais um plástico para o Carrefour, outro para o Atacadão e um terceiro para o Sam’s Club. O banco vai criar um produto só e, dentro dele, haverá a segmentação de acordo com o perfil de renda e risco de cada um.

Essa mudança teve uma fase inicial com a chamada "transversalização" dos benefícios dos cartões. Tradicionalmente, os descontos e benefícios eram restritos ao uso dentro de cada bandeira: Carrefour no Carrefour, Atacadão no Atacadão e assim sucessivamente. A unificação permitiu que os clientes utilizassem suas vantagens em qualquer operação do grupo varejista.

Essa alteração provocou um aumento de 50% no gasto médio dos usuários, refletindo uma maior adesão ao uso dos cartões. Os números do primeiro trimestre de 2025 mostram um crescimento do cartão Atacadão de 14,6%, do cartão Carrefour de 9% e do cartão Sam's Club de 50,4%. A receita dessa linha de negócio chegou a R$ 661 milhões.

"O cartão deixou de ser apenas um meio de pagamento dentro das nossas lojas e passou a ser uma solução financeira para o consumidor", afirma Gomes.

Além disso, a operação passou a captar mais clientes fora das lojas físicas, com 33% das novas aquisições de cartões já acontecendo no mercado digital. Isso transformou o banco em uma instituição financeira menos dependente do varejo e mais integrada ao ecossistema financeiro nacional - é o sexto maior emissor de cartões do País.

Outra estratégia é fortalecer sua atuação no crédito pessoal - que cresceu 4,6% no primeiro trimestre -, a instituição está apostando em soluções como o Pix Crédito, que permitem oferecer financiamentos pontuais sem a necessidade de um novo cartão de crédito.

Essa solução, que passa a ficar disponível até o fim do segundo semestre, surge como alternativa ao modelo tradicional de crédito rotativo, permitindo que consumidores adquiram bens de maior valor com parcelas mais adequadas ao seu perfil financeiro. E sem comprometer o limite nos cartões de crédito que estão nos bolsos.

“Temos que buscar produtos que mais se aderem ao tipo de cliente que temos. Há uma série de produtos sendo colocados em prática, como o Pix Crédito”, afirma Gomes. “Mas nunca vou ter um produto imobiliário de 2 milhões de reais porque o perfil do meu cliente não é esse.”

Em paralelo a esses movimentos, o Banco Carrefour aprimorou o uso de inteligência artificial em processos como cobranças automatizadas e análises de crédito.

Em parceria com a fintech Monest, desenvolveu um sistema de cobrança digital que supera o desempenho das interações humanas em negociações, oferecendo menos descontos sem comprometer as taxas de recuperação.

O atendimento digital chegou a 500 mil interações resolvidas via WhatsApp, com 80% dos casos solucionados sem necessidade de suporte humano. A URA resolveu 78% das interações, totalizando quase 2 milhões de atendimentos automatizados.

“A inteligência artificial está cobrando melhor do que o humano, dando menos desconto e conseguindo negociar melhor”, diz o CEO do banco.

A digitalização também transformou a concessão de crédito. Atualmente, 80% dos empréstimos do banco são realizados via app, permitindo que os clientes acessem, avaliem e aprovem operações de crédito sem necessidade de interação presencial.

Reequilíbrio financeiro e controle de custos

Ao assumir o comando do banco no segundo semestre de 2023, o primeiro grande desafio enfrentado pelo CEO foi o equilíbrio financeiro. Ele identificou uma operação que crescia rapidamente, mas com perdas significativas de clientes, mantendo uma base relativamente estável.

"O banco vendia muito, mas perdia clientes na mesma proporção. A receita não acompanhava o crescimento de custos, criando um desequilíbrio operacional", diz o CEO do banco.

Para corrigir essa trajetória, o executivo implementou uma série de ajustes estruturais. A revisão das políticas de crédito permitiu maior controle sobre a inadimplência, enquanto medidas de contenção de custos mantiveram as despesas zeradas em 2024, mesmo com uma expansão de 18% na carteira.

O Ebitda do banco apresentou crescimento de 21% no período, refletindo o impacto positivo das medidas adotadas.
O ROAE (return on average equity) anualizado é de 13,3%.

A reestruturação incluiu renegociação de todos os contratos, mudança de sede com redução de 70% nos custos de facility, e otimização da estrutura operacional por meio da formalização do home office.

Governança pós deslistagem das ações

No fim de abril deste ano, os acionistas do Carrefour Brasil aprovaram o fechamento de capital da companhia da B3. A deslistagem da bolsa brasileira se concretizou com a incorporação das ações pela matriz da rede varejista na França.

Apesar das mudanças estruturais e da reorganização societária no grupo Carrefour no Brasil, a governança do banco segue inalterada. A parceria com o Itaú permanece, com o banco dividindo sua composição acionária em 51% para o Carrefour e 49% para o Itaú.

"Nossa estrutura é extremamente bem definida, com conselho de administração e reuniões que garantem a continuidade da operação, sem interferências externas", diz Gomes.