A Blackstone, gestora americana de private equity que se transformou num gigante financeiro, deverá anunciar nesta quinta-feira, 20 de julho, durante a divulgação dos resultados do segundo trimestre, um marco: US$ 1 trilhão em ativos sob gestão.

A trajetória da Blackstone, criada em 1985, ilustra a pujança do mercado de capitais dos Estados Unidos, com suas oportunidades, riscos, lucros e, mais recentemente - com a escalada das taxas de juros -, as exposições dos investimentos financeiros à mercê das transformações da economia.

Após praticamente dobrar seus ativos nos últimos cinco anos, a Blackstone chega ao seu primeiro trilhão de ativos sob gestão na mira da SEC, agência reguladora do mercado de capitais dos Estados Unidos.

O primeiro grande salto da Blackstone ocorreu em meio à crise financeira de 2008, quando comprou a empresa de investimentos em dívidas GSO Capital Partners, abrindo caminho para se tornar uma importante fonte de financiamento, ocupando o espaço aberto pelos bancos, alvo de regulamentações mais rígidas.

Desde então, a gestora aumentou seus ativos mais de dez vezes. Apenas entre 2011 e o ano passado, a Blackstone recebeu cerca de US$ 1 trilhão em fluxos líquidos de investidores.

Embora os investimentos imobiliários e de private equity representem a maior parte dos ativos gerais da Blackstone, a gestora construiu enormes operações que abrangem crédito, seguros, investimentos orientados a fundos de hedge e outras estratégias de investimento privado, financiando cerca de 3.100 empresas e muitos dos acordos de aquisição do setor financeiro.

A mudança da Blackstone do private equity para o vasto mundo dos investimentos alternativos a levou a se tornar a maior proprietária de imóveis comerciais dos EUA.

Seu portfólio inclui de apartamentos a dormitórios universitários, passando por condomínios unifamiliares (onde todas as unidades são oferecidas para aluguel), prédios comerciais e data centers.

Crise recente com fundos

Alguns percalços recentes, no entanto, ofuscam seu sucesso.

Com o enfraquecimento do boom do private equity, a Blackstone enfrenta a pressão dos acionistas para continuar desenvolvendo um negócio cada vez mais complexo, com concorrência acirrada e, com a escalada das taxas de juros, sem as facilidades da última década, de dinheiro fácil.

Um exemplo foi o tombo levado no ano passado com o Blackstone Real Estate Income Trust, ou Breit - seu principal fundo imobiliário, avaliado em US$ 70 bilhões.

O Breit ajudou a consolidar o setor imobiliário como o negócio de crescimento mais rápido da Blackstone, gerando fortes retornos anuais de cerca de 12%, depois de contornar a crise no setor imobiliário comercial e investir em propriedades de alta qualidade.

Foi graças ao Breit e ao Bcred, um fundo de empréstimos corporativos, que a Blackstone deu seu segundo grande impulso depois de 2008, ao mudar seu perfil de clientes – além dos executivos de alta renda, investidores de varejo atraídos pelos retornos dos fundos quando as taxas de juros estavam baixas.

Nos últimos cinco anos, foram esses investidores de varejo que alimentaram o crescimento do Breit e do Bcred, lançadas em 2017 e 2021, respectivamente.

Juntos, os dois fundos atraíram mais de US$ 100 bilhões em dinheiro novo desde 2020 e, no ano passado, representaram quase um quarto dos ganhos totais baseados em taxas da Blackstone.

Os fundos foram estruturados num cenário de juros baixos e, por isso, como perpétuos por natureza, o que significa que a Blackstone não tinha obrigação de vender ativos e devolver dinheiro aos investidores.

Mas esses fundos ofereciam direitos de liquidez limitados. Na prática, isso significava que os investidores no total podiam sacar até 5% dos ativos do fundo em qualquer trimestre antes que os limites entrassem em vigor.

Reviravolta

O caldo começou a entornar em meados de 2022, quando uma série de investidores exigiu sacar seu dinheiro quando as taxas de juros começaram a subir e o setor imobiliário ficou sob pressão.

Depois de o Breit impor um limite de saques em novembro, conhecido como “portão” no setor, as ações da Blackstone começaram a despencar e perderam quase 20% de seu valor antes do final do ano.

O CEO da Blackstone, Jon Gray, e o cofundador Stephen Schwarzman começaram a fazer aparições regulares na CNBC, o canal financeiro de TV a cabo amado por investidores de varejo e comerciantes, para reverter a crise de imagem da empresa.

O episódio serviu de alerta sobre os perigos de investir em nome de indivíduos, que podem ser mais inconstantes do que as instituições.

A SEC, por sua vez, quis saber como as restrições do Breit afetavam os mercados. Como efeito, algumas plataformas bancárias passaram a ser mais cautelosas ao oferecer produtos ilíquidos a pessoas físicas, demonstrando como as ações da Blackstone repercutem nos mercados.

O episódio também levou conselheiros do Banco Central Europeu (BCE) a citarem os pedidos de resgate e os limites de retirada como “eventos de estresse” que mostraram como o setor imobiliário comercial pode atrapalhar os fundos.

A crise, no entanto, foi contornada. As ações da Blackstone se recuperaram da liquidação do ano passado, ganhando quase 40% desde o início de 2023, e agora são negociadas a uma avaliação de mercado de US$ 129 bilhões - superior às do Goldman Sachs.

Esse crescimento levou os reguladores a apertar novamente o cerco.

Sob o comando do presidente da SEC, Gary Gensler, a agência intensificou a fiscalização das taxas e exigiu mais divulgação dos fundos de private equity, que são menos regulados do que os fundos mútuos.

Além da Blackstone, outros fundos de private equity miram cifras trilionárias. A Brookfield Asset Management pretende atingir pelo menos US$ 1,5 trilhão nos próximos cinco anos, e a Apollo Global Management espera alcançar US$ 1 trilhão até 2026.

Enquanto isso, a Blackstone prepara seu terceiro grande salto. Depois que a crise regional derrubou três bancos americanos e forçou outros a cortar seus balanços, a gestora gigante está explorando parcerias com bancos para assumir participações em seus empréstimos.