O executivo Augusto Martins já atuava como CEO da JHSF Capital, a gestora da companhia focada no público de alta renda. Mas, no fim do ano passado, José Auriemo Neto, o Zeco, presidente do conselho de administração e controlador da JHSF, fez o convite para que Martins assumisse o manche de todo o grupo, o que engloba, além da Capital, a área de real estate, varejo, shoppings, hotelaria, gastronomia, aviação e até clubes de surf.

Martins, que fez carreira no Banco Alfa e teve o lendário banqueiro Aloysio de Andrade Faria como mentor, não só topou como começa hoje no novo cargo e já avisa qual é a sua missão na nova cadeira. “Meu mandato é o de aumentar a renda recorrente do grupo”, diz Martins ao NeoFeed. A incorporação continuará sendo importante para a JHSF, mas a meta é fazer com que dois terços da receita venham de renda recorrente até 2029.

A meta é fruto de uma percepção – sentida na prática – de que a incorporação é mais suscetível a ciclos econômicos que fazem a empresa sofrer em tempos mais difíceis. No quarto trimestre do ano passado, de acordo com prévias operacionais divulgadas em janeiro deste ano, as vendas de contratação de incorporação tiveram queda de 43,6%, atingindo R$ 236,6 milhões. Nos shoppings, as vendas atingiram R$ 1,4 bilhão em um salto de 18,7%.

O “rebalanceamento” da companhia, como o novo CEO frisa, é fruto de investimentos realizados nos últimos anos na expansão do shopping Cidade Jardim, Catarina Outlet, aeroporto, hotelaria, varejo e gastronomia. “Há três anos, a composição da geração de caixa da companhia era de 85% vinda dos negócios de incorporação e 15% de renda recorrente”, afirma Martins. “Hoje é quase meio a meio.”

Para aumentar ainda mais essa proporção e trazer negócios que garantam mais previsibilidade do resultado, ele avisa que vai continuar acelerando em projetos como o do shopping Cidade Jardim, que no ano passado expandiu 50 mil metros quadrados de ABL (área bruta locável); o do aeroporto Catarina, que saiu de 9 para 12 hangares; e o do Catarina Outlet, que dobrou de tamanho. O plano é continuar expandindo esses tipos de operações.

O aeroporto Catarina, por exemplo, vai expandir dos atuais 12 para 16 hangares. Outra estratégia foi o desenvolvimento de unidades de locação de apartamentos e casas. “Temos casas no Fazenda Boa Vista, unidades no Fasano Cidade Jardim e um pipeline de novas unidades no que chamamos de JHSF Residences”, diz Martins.

No total, são 56 unidades e locações com contratos de longo prazo. “Hoje, já representam R$ 80 milhões anuais de receita. Isso vai dobrar em um curto período de tempo” diz Martins. Afinal, nos novos projetos que estão sendo erguidos pela incorporadora, algumas unidades estão sendo separadas para a locação. “Além da questão da renda recorrente, isso é uma demanda dos nossos clientes.”

Alguns não querem desembolsar R$ 30 milhões em uma casa no condomínio Fazenda Boa Vista, mas estão dispostos a pagar um aluguel de R$ 100 mil mensais por um imóvel de cerca de 800 metros quadrados. “A gente cria um serviço profissional de locação com o nosso DNA. Um apartamento nosso vem com o enxoval todo pronto, mobiliado e decorado por nós, com serviço de concierge.”

A piscina de onda do Boa Vista Village

Apartamentos com a marca Fasano que podem ser alugados

CJ Shops, um shopping menor, para trazer mais recorrência

O aeroporto de aviação executiva Catarina

As golf residences, no Boa Vista Village, hoje são alugadas a partir de R$ 35 mil por mês. Os apartamentos no Fasano Residences, na Cidade Jardim, são locados por R$ 70 mil mensais com o serviço de hotelaria. Além das residências, os clubes de surf também entram nos planos de recorrência.

A JHSF conta com o Boa Vista Village Club e vai inaugurar o São Paulo Surf Club, na capital paulista. Os títulos individuais custam cerca de R$ 600 mil e os familiares ao redor de R$ 900 mil. As anuidades chegam a R$ 25 mil. Ainda tem dois novos shoppings prestes a saírem do forno: o Town Center, no Boa Vista Village, que será inaugurado neste ano, e o Shops Faria Lima, na avenida Faria Lima com a Leopoldo Couto de Magalhães, em 2026.

Na hotelaria, a nova marca Surf Lodge, operada pelo Fasano, ganhará vida, no Boa Vista Village, na metade do ano. E a expansão internacional da grife Fasano vai seguir a todo vapor. Depois do Las Piedras, em Punta del Este, e do Fasano Nova York, o grupo se prepara para inaugurar um hotel em Miami em 2025 e outro em Londres, previsto para 2026. “Estamos olhando 20 pontos internacionais para a expansão da marca”, diz Martins.

Para colocar esse plano de expansão de pé sem usar o balanço da companhia, a JHSF Capital é crucial. “Vamos trazer mais capital de terceiros no desenvolvimento imobiliário, seja para incorporação, seja para renda recorrente”, afirma Martins. “Criamos fundos imobiliários e vamos criar outros para termos um balanço mais leve e cumprirmos o nosso plano de crescimento. E traz o cliente que queria investir conosco entrando na estratégia do ativo.”

Com um ano de vida, a JHSF Capital já conta com R$ 1,2 bilhão sob gestão e a meta é chegar em R$ 3 bilhões dentro de dois anos – focando exclusivamente em propriedades voltadas para a alta renda. Para o hotel Fasano Londres, por exemplo, a gestora está levantando 70 milhões de libras esterlinas (quase US$ 90 milhões). Além da JHSF UK, da família Auriemo, outros single family offices estão entrando. “Esse modelo de Londres vai ser replicado em outros locais”, diz Martins.

Na opinião de Ygor Altero, head de real estate da XP, o que a companhia está fazendo para mudar o perfil de sua receita faz todo o sentido, mas o efeito disso vai aparecer mais para frente. “No curto prazo, é um ajuste mais duro para a JHSF.”, diz Altero. “O ponto negativo é que demanda de mais capex e que demora a ter retorno. O positivo é que é uma receita mais resiliente.”

O papel da JHSF era negociado na B3 a R$ 4,29, na cotação de 26 de fevereiro, e seu valuation estava em R$ 2,9 bilhões. A XP mantém recomendação de compra enxergando um upside que pode levar a ação para R$ 6,50. Os analistas do BTG Pactual, Gustavo Cambauba e Elvis Credendio, afirmam que “a JHSF está enfrentando um momento difícil (principalmente devido à lentidão nas vendas de imóveis por conta das altas taxas de juros).” Mesmo assim, mantêm a recomendação de compra.

O trabalho de Martins vai levar tempo e ele sabe disso. A favor do executivo, formado em administração na PUC-SP e especializações na Kellog School of Management, Harvard e Insead, conta o desempenho em pouco tempo de JHSF.

Depois de colocar a Capital em pé, outras áreas foram passadas para seu comando. Entre elas, a área digital da companhia, principalmente o marketplace CJ Fashion. “A gente começou a perceber que 80% dos clientes que entravam no nosso e-commerce e não terminavam a transação através do e-commerce”, diz Martins.

Depois do diagnóstico, a empresa reduziu de 1 mil para 150 marcas e criou um serviço 100% baseado em private shoppers. Em julho do ano passado, a empresa foi relançada nesse novo formato. “Em agosto as vendas foram 20% inferiores às do modelo antigo. Setembro equilibramos. Em outubro, viemos com 20% superiores. No fim deste ano vamos chegar ao dobro de vendas.”

Em fevereiro de 2023, Martins assumiu também o varejo do grupo, que representa algumas das principais marcas de luxo do mundo no Brasil. É o caso de Céline, Brunello Cuccinelli, entre outras. No fim de 2023, ele conseguiu apresentar números 40% melhores do que em relação a 2022. Hoje, são 13 marcas e mais uma deve desembarcar no País.

Com o track record em menos de dois anos de atuação, Martins diz que ainda pode ser dar o luxo de ter ao seu lado Zeco Auriemo, o dono que moldou a transformação da companhia, na presidência do conselho, e de Thiago Alonso de Oliveira, o antigo CEO que passou a comandar a JHSF UK e também estará no conselho do grupo. Agora, é aguardar pela recorrência tão almejada.