No mercado de tecnologia, sobretudo no universo das fintechs, há uma corrida contra o tempo. Como queimam caixa de forma acelerada, muitas empresas estão buscando apertar os cintos para se tornarem mais “saudáveis”. Quem não consegue, acaba tendo de buscar mais dinheiro e um valuation menor.
A sueca Klarna, por exemplo, viu seu valor de mercado desabar de US$ 46 bilhões para US$ 7 bilhões. Isso tem colocado em dúvida os avanços globais de algumas fintechs. No caso da Revolut, avaliada em US$ 33 bilhões, com presença em 35 países, esse não parece ser um problema. Pelo menos, por enquanto.
“Demos sorte no timing. A Revolut captou mais de US$ 800 milhões há um ano, está preparada e gera caixa”, diz Glauber Mota, CEO da Revolut no Brasil e América do Sul, ao NeoFeed. A companhia anunciou sua entrada no País em março e, segundo Mota, os planos foram revisados para cima. “Para entrarmos mais rápidos no mercado.”
Isso acontece porque, segundo o executivo, a fintech já está testando o produto, que se encontra em uma fase avançada. “Andou mais rápido do que algumas operações que entrariam na Ásia”, diz ele. Hoje, a Revolut, com mais de 20 milhões de clientes no mundo, conta com 90 pessoas dedicadas à unidade brasileira e mais algumas dezenas serão contratadas até o fim do ano.
O Brasil será o 36º país a receber uma operação da Revolut. Atualmente, há uma fila de espera com dezenas de milhares de interessados em abrir conta. “Minha meta pessoal é inaugurar antes da Copa do Mundo do Catar (em novembro) e acredito que vamos conseguir.”
No longo prazo, o objetivo é ter entre 10 milhões e 20 milhões de clientes no Brasil. Não é uma tarefa simples. Na Faria Lima, a Revolut é até conhecida, mas no “Brasil grande” esse é um dos grandes desafios. Ainda mais com o tipo de produto que vai oferecer e a concorrência que vai encontrar.
Na conta voltada para pessoa física, a meta, segundo Mota, é se “tornar referência financeira global sem fronteiras”. Além disso, terá investimentos em ações globais, commodities e cripto. “Vamos entrar bem pesado em cripto. E virá muita evolução.”
Nessa primeira fase, diz ele, o cliente poderá operar com todas as ações listadas na bolsa americana. “E vamos viabilizar a compra de frações de ações. Com um dólar, vai poder comprar parte de ações da Apple”, diz ele. Se houver demanda, a Revolut poderá plugar outras bolsas globais.
Mas o mar não vai ser tão tranquilo quanto se imagina. Alguns players já estão bem estabelecidos e outros estão começando a navegar nesse segmento. A Avenue, por exemplo, criou essa categoria no Brasil e, em julho, vendeu uma participação de 35% da empresa para o Itaú – uma fatia que pode passar de 50,1% em até dois anos.
Outros concorrentes como Inter, que comprou a americana Usend; e C6 Bank, que tem o J.P.Morgan como acionista, também operam contas globais. No campo dos investimentos, a XP anunciou recentemente a sua conta internacional, assim como Genial e Warren.
Em cripto, onde a Revolut diz apostar muito de suas fichas, vai rivalizar com boa parte dessas companhias e ainda com Mercado Bitcoin, Binance, Coinbase, entre outras.
“Esse mercado ainda é pequeno e pouco explorado em termos de concorrência. Seremos o primeiro desafiante de fato e pretendo entregar uma experiência melhor”, diz Mota sobre a operação internacional.
Inicialmente, a fintech focará em banking. “A nossa conta opera em mais de 30 moedas e é possível mudar de euro para dólar, de dólar para iene em um clique”, diz Mota. “E ninguém tem a experiência de ser uma conta local completa e de fazer uma transferência multimoedas instantânea como a Revolut.”
Um tarimbado executivo do mercado financeiro, que conversou com o NeoFeed sobre esse mercado sob a condição de anonimato, diz que a grande dúvida até agora é como a Revolut vai operar. “Vai ser mais um cowboy agindo à margem do sistema financeiro?”, indaga ele.
“Onde fica o dinheiro? Dentro de qual sistema financeiro? Nos Estados Unidos ou em Malta?”, pergunta. E prossegue. “Vai ter uma DTVM para oferecer investimentos? Terá corretora de câmbio aqui no Brasil?”.
Mota explica que o dinheiro está “distribuído em todas as jurisdições em que a Revolut opera”. “Como temos fluxos de dinheiro em todas as direções e países acontecendo a todo instante, podemos gerenciar e fazer o settlement ‘instantaneamente’ para o cliente debitando a origem do recurso e creditando o destino de maneira consolidada para todos os movimentos”, afirma.
Depois disso, diz ele, “a companhia faz, no backoffice, os settlements normais via Swift (ou SEP na Europa)”. “Para o cliente é instantâneo, mas para nosso backoffice são fluxos normais do sistema financeiro. Obviamente todos os registros fiscais e regulatórios acontecem normalmente.”
Sobre ter uma corretora e uma DTVM, a Revolut está negociando parcerias locais, mas não descarta montar operações próprias. No paralelo, corre com o pedido para ter a autorização do Banco Central para operar como uma Sociedade de Crédito Direto (SCD), para poder ter uma conta local e oferecer cartão de crédito. “Acredito que isso deva acontecer no início de 2023.”
Na segunda fase, com a aprovação do BC, a empresa prevê todos os serviços de um banco digital, lançamento de cartão de crédito. E a criação de uma conta PJ voltada, sobretudo, para pequenas e médias empresas que – segundo Mota, são “mal atendidas no mercado internacional”.
Pela conta, batizada de Revolut Business, o cliente terá acesso a um sistema de ERP que ajuda na gestão de pessoas, pagamento de salário, gestão de câmbio futuro, entre outros serviços. “Ou seja, facilita a gestão da empresa”, diz Mota.