Com uma receita de R$ 150 bilhões e 25 milhões de usuários, o mercado de benefícios de vale-refeição e vale-alimentação, regido pelo Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), é historicamente dominado por quatro players. Mas, cada vez mais, atrai investimentos de outras empresas.

O iFood dominou o delivery de refeições e se tornou incumbente. E, desde 2021, quando o PAT passou por mudanças em suas regras, ele decidiu enfrentar os gigantes dos benefícios Alelo, Ticket, Pluxee (ex-Sodexo) e VR. Três anos depois, comendo pelas beiradas, a startup começa a entregar resultados nessa área.

Em dados revelados com exclusividade ao NeoFeed, o iFood Benefícios, seu braço no setor, saiu de uma base de 400 mil usuários ativos, em março deste ano, para 650 mil, em setembro. E já tem projetos recém-saídos do forno para expandir ainda mais esse cardápio.

‘O mercado de benefícios é uma das principais apostas do iFood”, diz Arthur Freitas, diretor-geral do iFood Benefícios. “Em um ano, vamos mais do que dobrar essa operação. Nossa expectativa é chegar a 1 milhão de usuários no fim do nosso ano fiscal, em março de 2025.”

Essa projeção vem acompanhada da meta de alcançar um volume mensal transacionado de R$ 500 milhões, o que, em base anualizada, resultaria em R$ 6 bilhões. Hoje, a cifra movimentada por mês na plataforma é de R$ 400 milhões.

Para despertar o apetite de mais usuários e tornar esses números realidade, uma das principais iniciativas é um projeto-piloto iniciado há seis meses e que, após esse período de testes, começará a ser escalado.

Batizada de Comer Fora, a ação envolve a oferta de cupons de desconto, em média, de 10%, para estimular o consumo nos salões de aproximadamente 250 restaurantes. Desde a sua implantação na região da Grande São Paulo, o projeto já ofereceu 100 mil vouchers a cerca de 15 mil usuários.

“Muitas vezes, o vale dura pouco tempo, então, é importante que o usuário possa usar esse saldo da forma mais barata possível”, diz Freitas. A ideia é chegar a pelo menos mil restaurantes em São Paulo e região metropolitana até março do ano que vem. “Aí sim, vamos expandir pelo Brasil.”

O projeto já começou a ser testado neste mês em Fortaleza (CE). Em novembro, o plano é dar o pontapé dessa oferta na categoria de supermercados. Para os usuários do cartão iFood Benefícios, os descontos são concedidos automaticamente no pagamento das contas.

Além de uma rede de aceitação de 4 milhões de estabelecimentos, viabilizada por um arranjo aberto com a Elo, o iFood Benefícios encorpa sua oferta com os 350 mil restaurantes cadastrados em seu app. Aqui, seus cartões também dão acesso gratuito ao Clube iFood, com fretes grátis e mais descontos.

Com um cartão multibenefícios que permite segregar os saldos do PAT de recursos em áreas como mobilidade, cultura, educação, saúde e bem-estar, o portfólio inclui ainda um pacote opcional de produtos e serviços além do programa com os parceiros Wellhub (ex-Gympass), Dasa, Starbem e Avus.

Arthur Freitas, diretor-geral do iFood Benefícios

Outros negócios do ecossistema do iFood reforçam a oferta, especialmente na ponta dos restaurantes. Com um time dedicado de 250 pessoas, o iFood Benefícios está debaixo do guarda-chuva da fintech iFood Pago, que oferece crédito aos estabelecimentos e já tem uma carteira de R$ 1,5 bilhão.

Já para o terceiro elo dessa cadeia, os departamentos de RH, um passo recente é um projeto-piloto com o uso de inteligência artificial para capturar e organizar os dados – muitas vezes em papel e desestruturados – que são a base para calcular o saldo mensal a ser depositado para cada funcionário.

Hoje, a carteira do iFood Benefícios tem cerca de 20 mil companhias clientes. A lista inclui nomes como XP, Ambev, Petro, Pague Menos, B3, Fiat, CCR, Unico, Multi, Cultura Inglesa e Puma.

Fim dos rebates?

O caminho que vem permitindo ao iFood e a empresas como Flash, Swile, Caju, PicPay e Raiô avançarem no mercado de benefícios passa por decretos que estabeleceram novas regras e suspenderam práticas até então comuns no setor, em uma tentativa de tornar a competição menos desigual.

Uma das novas regras proibiu o rebate, como ficou conhecida os descontos, em média, de 2% a 5%, concedidos pelas empresas de benefícios às companhias que contratavam os seus serviços no âmbito do PAT.

Em um exemplo dessa prática, uma empresa que gastava R$ 2 milhões mensais com o PAT, repassava, de fato, às operadoras, R$ 1,9 milhão. Para compensar a diferença, as empresas de benefícios cobravam taxas entre 7% e 10% dos estabelecimentos, que, por sua vez, “transferiam” essa conta aos usuários.

Apesar da proibição, em julho, a brasileira Flash e a francesa Swile registraram uma denúncia no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) alegando que as quatro incumbentes seguiam adotando a prática. Agora, porém, camuflada na oferta de serviços como academias e planos de saúde.

Coincidência ou não, o fato é que, há duas semanas, o Ministério do Trabalho e Emprego publicou uma nova portaria reforçando, entre outras questões, a proibição dos rebates e a contratação de serviços que não estejam diretamente ligados à segurança alimentar no âmbito do PAT.

“A portaria explicou um pouco melhor o rebate, já que, até então, a redação era mais ampla”, diz Freitas. Ele cita que, mesmo nesse contexto de ajustes, houve avanços. Entre eles, os arranjos abertos, que permitiram levar as taxas cobradas dos estabelecimentos a um índice, em média, de 3%.

Em outros dados, um estudo encomendado pelo iFood a consultoria LCA estima que as mudanças no PAT podem gerar uma economia de R$ 5,2 bilhões ao setor de bares e restaurantes e ampliar a base atual de cerca de 600 mil estabelecimentos que aceitam os vales-refeições em mais de cinco vezes.

Ao mesmo tempo, a pesquisa mostra que, há dois anos, as quatro incumbentes detinham uma participação de mercado somada de mais de 90%. E que, de lá para cá, o market share combinado das empresas entrantes saiu de 5,5% para uma faixa de 11,5% a 12%.