No Brasil, ainda são minoria as histórias de projetos que nascem nos círculos acadêmicos e conseguem alcançar o mercado. Dona de uma plataforma que usa inteligência artificial na roteirização e gestão de entregas na última milha, a logtech RoutEasy é um dos casos que contrariam essa estatística.
Fundada em 2016, por Caio Reina, a startup começou a ser gestada nos corredores da Unesp, em 2008, e viu seu projeto ganhar corpo, mais tarde, no mestrado de engenharia de transportes, na Poli-USP. E agora, acaba de receber uma chancela definitiva para dar sequência à expansão da sua operação.
A empresa antecipou ao NeoFeed a captação de um investimento de R$ 5,8 milhões, realizado pela UVC, fundo de venture capital do Grupo Ultra, que reúne operações como os Postos Ipiranga e a Ultragaz. Até então, a RoutEasy havia captado R$ 400 mil em rodadas com investidores-anjo.
Ativo desde o início de 2020, o UVC tem ainda startups como a pernambucana Voltz, de motos elétricas, e a Kovi, de carros por assinatura, entre as investidas do seu portfólio.
“É uma realização ver algo que poderia ter virado uma tese de 100 páginas, esquecida em uma biblioteca, ser adotada pelo mercado”, diz Reina, ao NeoFeed. “E ainda mais agora com a validação de um grupo desse porte, que compartilha da mesma visão e que topou entrar nessa jornada.”
O coração da plataforma que atraiu o interesse do Grupo Ultra são os algoritmos de inteligência artificial desenvolvidos pela RoutEasy. A partir deles, a logtech analisa um leque amplo de variáveis para planejar as rotas mais eficientes nas entregas e coletas da última milha.
Além dos destinos e do histórico de trânsito nesses percursos, o espectro que alimenta o trabalho dos algoritmos inclui dados como a frota disponível, a capacidade de cada veículo, o peso e o tamanho das cargas, a janela de horário e o tipo de transporte preferencial para a entrega.
Definido o trajeto, a ferramenta permite ainda que, tanto o gestor como quem irá receber a carga ou encomenda, monitorem todo o processo. Comercializada no modelo de software como serviço, a plataforma contabiliza uma redução de até 40% nos custos de transporte, segundo os cálculos da RoutEasy.
Com atuação em segmentos como e-commerce (seu carro-chefe), transportadoras, indústrias e serviços de campo, a RoutEasy tem uma base de 310 clientes. E atende empresas como Magazine Luiza, Mercado Livre, Infracommerce, DHL, Dasa, Light, Royal Canin, Solística e IBL Logística.
A partir desse modelo e do aporte captado, a RoutEasy já definiu sua próxima etapa de expansão. Boa parte dos recursos será alocada na aceleração do desenvolvimento de mais um módulo da plataforma, batizado de Maestro, em linha com uma tendência em alta no mercado.
“Esse módulo vai fazer a orquestração e a roteirização das entregas no mesmo dia e, inclusive, na mesma hora”, afirma Reina. “Nossa ideia é automatizar todo esse processo, que hoje pressupõe muitas atividades manuais.”
A plataforma será lançada ainda neste trimestre. Primeiro, com uma base mais restrita de clientes, para ajustes no produto. E a previsão é de ser estendida a toda a carteira e ao mercado entre outubro e dezembro.
Entre outros recursos, o módulo vai permitir estabelecer uma ordem de prioridade dos pedidos mais urgentes e definir de quais pontos a mercadoria irá partir – mais próximos do local de entrega, o que pode envolver modelos como ship from store – e qual roteiro será seguido.
“Em um segundo passo, vamos integrar essa plataforma a aplicativos e agregadores e dar a opção de o cliente acessar a base desses parceiros”, explica. “Com a diferença que ele terá visibilidade tanto da sua frota própria como a de terceiros, em um único lugar.”
Há outros planos com a entrada do Grupo Ultra. Já estão em discussão, por exemplo, projetos-pilotos com o uso do sistema em empresas da holding. Ao mesmo tempo, a logtech vai dar início ao seu projeto de expansão no mercado brasileiro com a abertura de uma operação no Recife (PE), ainda neste ano.
Essa estratégia inclui passos fora do mercado brasileiro. Hoje, a RoutEasy já estendeu o atendimento de alguns clientes no País, como Mercado Livre e Royal Canin, a outros mercados. Entre eles, Colômbia, Argentina, Chile e Paraguai.
A startup avalia o investimento em uma infraestrutura própria na Colômbia e também está prospectando o mercado mexicano. Outros países em avaliação dentro dessa estratégia são Portugal e Estados Unidos. O plano se completa com a previsão de ampliar o time atual de 67 profissionais para 110 funcionários até o fim do desse ano.
“Se conseguir entregar o que promete, esse tipo de ferramenta tem um grande potencial de adoção no mercado”, diz Mauro Schluter, professor de logística do Mackenzie. “Não é surpresa que, assim como aconteceu com outras logtechs e grandes empresas, eles tenham chamado atenção do Ultra.”
As logtechs estão, de fato, na ordem do dia, seja para os fundos de venture capital, para grandes empresas, especialmente aquelas do varejo, como Magazine Luiza, ou mesmo para startups que já têm maior tração.
Entre alguns movimentos mais recentes nessa direção, a Cobli, que mescla internet das coisas e inteligência artificial na gestão de frotas, recebeu um aporte de R$ 175 milhões, liderado pelo Softbank, no fim de julho.
Um mês antes, a MadeiraMadeira, plataforma online de imóveis e artigos para casa, anunciou a aquisição da iTrack Brasil, startup de softwares de rastreamento e roteirização de entregas.
Já no fim de 2020, a Intelipost, também de logística, anunciou uma fusão com a catarinense AgileProcess, outro nome especializado em sistemas de roteirização.