Corria o ano de 2017. Dono de uma distribuidora de motopeças em Recife (PE), Renato Villar decidiu avançar e desbravar um outro terreno nessa cadeia: o desenvolvimento de motos elétricas. Nascia a Voltz, com um investimento inicial de R$ 5 milhões, do próprio empresário.

Quatro anos depois, a startup pernambucana está recarregando suas baterias para acelerar. A empresa anuncia nesta segunda-feira a captação de seu primeiro aporte, no valor de R$ 100 milhões, liderado pela Creditas e com a participação do UVC, fundo de venture capital do Grupo Ultra.

“Nós já vínhamos conversando com diversos fundos e escolhemos a dedo com quem queríamos seguir”, diz Villar, em entrevista ao NeoFeed. “A Creditas e o Grupo Ultra não trazem só o dinheiro. Eles são, de fato, parceiros estratégicos e sinérgicos para a nossa operação.”

Não são poucos os caminhos nos quais a Voltz planeja acelerar, agora, com a bateria cheia de energia. Um dos projetos já estava aprovado e esperava apenas o sinal verde dado pela chegada de investidores à operação.

Trata-se da instalação de uma fábrica na Zona Franca de Manaus, iniciativa que vai demandar um investimento inicial de R$ 10 milhões. Hoje, as motos da companhia são montadas em uma unidade em Cabo de Santo Agostinho (PE), a partir de kits de componentes vindos da China.

A previsão é que a nova fábrica entre em operação em novembro deste ano, com cerca de 200 funcionários e capacidade de produção inicial de 15 mil motos por mês, e a possibilidade de ampliar rapidamente esse volume para 35 mil unidades.

Além de atender ao esperado aumento da demanda, a instalação traz outros benefícios. A partir dos incentivos fiscais concedidos no polo de Manaus, Villar acredita que será possível reduzir em até 15% os preços dos modelos da Voltz que, hoje, variam entre R$ 11,9 mil e R$ 20,9 mil.

Uma parcela do investimento também será aplicada em outra frente diretamente ligada à produção. Como outras indústrias, a startup tem enfrentado problemas em sua cadeia de fornecimento, em função da pandemia e de impactos na logística para trazer os componentes da China.

Como reflexo, a Voltz tem hoje 2 mil consumidores à espera de suas motos e um prazo médio de entrega de 11 semanas. “O aporte veio na hora certa”, diz Villar. “Já conversamos com fornecedores e vamos reservar parte dos recursos para formar um estoque maior e estabilizar esse fluxo.”

Sinergias

Os planos também passam por pegar carona em fortalezas dos novos sócios para superar percalços que hoje travam parte das vendas da startup. No caso da Creditas, a ideia é lançar, em junho, modelos de financiamento mais atrativos para os compradores.

As condições começam a ser desenhadas a quatro mãos, mas Villar ressalta que serão bem mais agressivas do que é ofertado atualmente. Hoje, a Voltz conta com financiamentos pelos bancos Santander e Votorantim.

“Mas a taxa de aprovação é irrisória. Dos 2 mil CPFs que são analisados mensalmente, apenas 15% passam por esse crivo”, afirma. “Isso é o oposto da média do mercado, de 55%, e estava nos limitando. Precisávamos redefinir essa oferta.”

Ele também entende que a parceria com a Creditas permite construir modelos e produtos que reduzem o risco desses financiamentos. Com todos os sistemas de suas motos conectados via nuvem, a Voltz consegue, por exemplo, bloquear o uso, no caso de inadimplência ou mesmo de roubo ou furto.

Renato Villar, fundador da Voltz

Com as alternativas atuais, em 2020, a Voltz vendeu 3,3 mil motos e alcançou uma receita de R$ 42 milhões. Para esse ano, a meta é chegar a 15 mil motos vendidas e a uma receita superior a R$ 200 milhões.

“Hoje, cerca de 40% dos nossos consumidores são pessoas entre 35 e 45 anos, entusiastas e early adopters”, observa Villar. “Se conseguirmos virar a chave e dar mais crédito, vamos alcançar outros públicos.”

Outro plano é expor as motos da marca na rede de revendas e showrooms que a Creditas começa a estruturar para automóveis seminovos na Grande São Paulo, com um investimento inicial de R$ 50 milhões.

Nesse percurso, já há projetos também com o Grupo Ultra. A principal aposta reside nos postos Ipiranga. Um dos planos é usar essas unidades para a instalação de estações de recarga de baterias. “Vamos ganhar escala, pois eles estão no Brasil inteiro e 80% do mercado de motos está no interior do País”, diz Villar.

Os postos também serão usados para desenvolver um novo modelo, de planos de assinatura. Com um valor mensal, a princípio, de R$ 250, os proprietários de motos da Voltz poderão trocar as baterias nessas unidades.

“A bateria representa 40% do custo da moto”, explica Villar. “Esse modelo elimina a necessidade de aquisição desses componentes e oferece uma alternativa mais acessível para os compradores.”

O formato começará a ser testado em julho, por meio de um projeto-piloto com o iFood, que envolverá, inicialmente, os entregadores do aplicativo em São Paulo. A migração dessa base para as motos elétricas deve contar com subsídios da MovilePay, fintech do grupo Movile, que controla o serviço de delivery.

“Com esses modelos, eles vão explorar os principais gargalos do segmento de elétricos, que são a bateria e a infraestrutura de recarga”, diz Milad Kalume, analista da consultoria Jato Dynamics. “E, no caso do crédito, é sempre mais interessante ter um parceiro dentro de casa.”

Dos showrooms ao portfólio

Villar enxerga ainda uma possível via de expansão dos showrooms da marca nos Postos Ipiranga. Independentemente dessa parceria, a Voltz tem um plano ambicioso nesse formato, trabalhado por meio de franquias e de unidades instaladas em contêineres, de 3 a 6 metros quadrados.

Com investimento entre R$ 180 mil e R$ 220 mil, essa rede é formada atualmente por 33 showrooms. A meta é fechar o ano com 150 unidades, das quais, 40 já estão contratadas. Já em 2024, o objetivo é chegar a 700 pontos.

No modelo de negócio da startup, todas as vendas são online. Os showrooms, assim como as lojas próprias, são usados para dar visibilidade à marca e para que o consumidor conhecer as motos e fazer test drives. Os franqueados recebem comissões pelos contratos fechados em suas unidades.

No âmbito das lojas próprias, a Voltz tem unidades em São Paulo e no Recife. “Queremos chegar a todas as capitais até o fim de 2022 e a mais de 12 nesse ano”, diz Villar. Para 2021, o mapa de expansão passará por cidades como Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

A loja da Voltz em São Paulo

No portfólio, a entrada em categorias como off road está no radar. Hoje, a Voltz conta com a linha EV1, de scooters, e a EVS, no segmento de street. Nessa última, as motos têm autonomia de 120 km, com uma velocidade média de 35 km/h e podem chegar a uma velocidade de até 120 km/h.

A startup ainda encontra pouca companhia nesse trajeto no País. Entre essas empresas, está a chinesa Aima, cujas scooters desembarcaram no Brasil em 2019. Outra marca que prepara sua chegada oficial é a australiana Super Soco, que já tem suas motos comercializadas aqui pela brasileira Energie Mobi.

Enquanto o Brasil ainda engatinha, globalmente, o segmento começa a ganhar tração. Segundo a consultoria Valuate Reports, a projeção é de que esse mercado saia de um faturamento de US$ 5,2 bilhões, em 2019, para US$ 7,2 bilhões, em 2026.