Professor da Universidade de Nova York e uma das vozes mais respeitadas quando o tema é o Vale do Silício, Scott Galloway afirmou no ano passado que, até 2025, a Amazon será a empresa de saúde que mais cresce no mundo.

Quatro anos separam essa projeção do cenário que será observado no setor em 2025. Mas o fato é que a gigante fundada por Jeff Bezos e, agora, sob o comando do CEO Andy Jassy, não está medindo esforços para que essa previsão se torne realidade.

Como parte de uma estratégia ampla para expandir sua presença nos mais variados momentos da vida dos consumidores, a Amazon vem lançando uma série de iniciativas na área da saúde, o que inclui desde serviços próprios até a oferta de infraestrutura e aplicações para instituições e empresas do setor.

A partir dessa estratégia, a empresa busca se consolidar como a principal alternativa em um contexto no qual os gastos com saúde podem chegar a US$ 5 trilhões nos Estados Unidos em 2025, segundo o US Centers for Medicare and Medicaid Services.

Um dos movimentos mais recentes da companhia no segmento se deu por meio da Amazon Web Services (AWS), seu braço de infraestrutura de tecnologia na nuvem. Em julho, a empresa lançou o AWS for Health, pacote de serviços destinado especificamente a instituições de saúde.

Entre outros recursos, a oferta envolve tecnologias e conceitos como armazenagem, estruturação e análise de dados em grande escala, machine learning e a definição de formatos dentro dos padrões da indústria, para facilitar a troca de informações entre todos os atores do setor.

Curiosamente, para ocupar espaço na área da saúde, a Amazon parece estar usando a mesma abordagem adotada com o desenvolvimento da AWS. Criada inicialmente para atender as demandas da própria empresa, essa infraestrutura ganhou corpo e passou a ser ofertada a outras companhias.

Em saúde, um dos projetos que segue essa orientação é a Amazon Care, plataforma que mescla serviços de telemedicina, 24 horas, sete dias por semana, e atendimento presencial. A oferta nasceu com foco nos próprios funcionários da Amazon e com instalações próximas à sede da empresa, em Seattle.

Na semana passada, o portal americano Business Insider revelou, porém, os planos da Amazon de expandir o atendimento da Amazon Care para mais de 20 cidades nos Estados Unidos em 2022, além de estender a oferta a outras empresas. Hoje, a plataforma tem uma base de cerca de 40 mil usuários cadastrados.

“Há muitos grandes empregadores que desejam reduzir significativamente seus custos médicos”, disse Jeff Becker, analista de saúde da consultoria CB Insights, em reportagem publicada pelo jornal britânico Financial Times. “Se a Amazon cumprir esse objetivo, terá outra linha de negócios lucrativa em suas mãos. No momento, eles parecem estar se movendo muito rapidamente por esse caminho.”

Outras iniciativas reforçam o plano da Amazon de consolidar uma oferta ampla no setor. Um dos projetos é a seleção de aplicativos de saúde para serem incubados pela empresa. As ferramentas incluem aplicações de inteligência artificial e assistentes digitais, entre outras soluções.

Em julho, a Amazon lançou também o Amazon DX, serviço que oferece testes caseiros de Covid-19 por meio de um kit fornecido pela empresa. Os consumidores enviam de volta o teste e recebem os resultados em 24 horas.

Já no fim de 2020, a gigante lançou a Amazon Pharmacy, plataforma que reúne entrega e descontos em medicamentos em lojas físicas. Antes, em 2018, a Amazon havia adquirido a PillPack, dona de um serviço de prescrição online.

Foi também em 2018, mais precisamente, em janeiro daquele ano, que a Amazon fez uma de suas primeiras incursões no segmento, por meio de uma joint venture com a Berkshire Hathaway, gestora de Warren Buffett, e o J.P. Morgan.

Batizado de Haven, a empresa não foi, no entanto, bem-sucedida. Em janeiro deste ano, o trio anunciou o encerramento da operação. Para analistas ouvidos na época, o fato de a Amazon começar a avançar com suas próprias pernas contribuiu para essa decisão.

Concorrência

A Amazon não está sozinha na busca por fincar seus pés no setor. Outras big techs, como Microsoft e Google já têm ofertas destinadas a esse segmento, especialmente no plano de infraestrutura de computação em nuvem e de inteligência artificial.

De acordo com uma pesquisa divulgada pela consultoria CB Insights, os investimentos somados de empresas como Amazon, Google, Microsoft, Apple e Facebook em saúde foram de US$ 3,7 bilhões em 2020. Nesse ano, o montante acumulado já está em US$ 3,1 bilhões.

Além das big techs, outra rival no horizonte da Amazon é o Walmart. Em junho, a varejista lançou sua própria marca de insulina, com a proposta de oferecer preços mais acessíveis. Antes, a rede já vinha investindo na aberta de clínicas de atenção primária nos Estados Unidos e também na aquisição de healthtechs.

A concorrência não é a única ameaça aos planos da companhia na área. A Amazon vive sob a pressão crescente de parlamentares americanos para desmembrar seus negócios em operações independentes, dado o alcance que a gigante vem consolidando no mercado.

A construção de um novo braço, especialmente em um setor crítico e extremamente relacionado a dados, só ampliaria essa ofensiva contra a empresa.

“Se a Amazon conseguir trazer mais pacientes diretamente com o seu nome, a empresa também começará a obter registros médicos”, disse Robert Huckman, professor e presidente da área de saúde da Harvard Business School, ao Financial Times. “A pergunta que os reguladores farão é: até onde estamos dispostos a deixar essas empresas de varejo e tecnologia irem?.”