Se no varejo a notícia de que uma empresa voltou aos resultados que tinha antes da pandemia é motivo para comemoração, o mesmo não pode ser dito para o streaming. Na Netflix, por exemplo, o clima está bem longe de ser de festa.
Nesta segunda-feira, 14 de março, as ações da companhia de Los Gatos caíram mais de 2% e estavam sendo negociadas por volta de US$ 331. É o menor valor desde março de 2020, quando começaram a ser impostas políticas de lockdown para evitar a propagação da covid-19 em diferentes lugares do mundo.
Com salas de cinema fechadas e sem opções de lazer fora de casa, os serviços de streaming cresceram agressivamente durante o período mais crítico da pandemia. Avaliada atualmente em US$ 147,5 bilhões, a Netflix chegou a valer mais de US$ 305 bilhões em novembro do ano passado.
Os acionistas parecem preocupados com o futuro da Netflix que antes reinava praticamente sozinha e hoje, mesmo liderando o setor com mais de 220 milhões de assinantes, enfrenta a concorrência de gigantes como Apple, Amazon, Disney, entre outras plataformas de streaming.
A Disney é quem aparece mais perto no retrovisor. Somados os assinantes da plataforma de streaming própria e dos serviços Hulu e ESPN, já são mais 179 milhões de assinaturas ativas. A base deve aumentar consideravelmente com a expansão geográfica do streaming Disney+ para o dobro dos países em que o serviço opera atualmente até o fim do ano fiscal de 2023.
O cenário é pessimista porque, para o próximo período financeiro, que corresponde aos primeiros três meses de 2022, a projeção da Netflix é aumentar a base de assinantes em 2,5 milhões – bem abaixo dos 4 milhões de assinantes conquistados no primeiro trimestre de 2021.
O que não deve ajudar neste sentido foi o aumento dos preços das assinaturas. Nos Estados Unidos, o plano padrão do serviço aumentou de US$ 13,99 para US$ 15,49, enquanto a assinatura premium subiu de US$ 17,99 para US$ 19,99.
Cinema, esportes e jogos
O relaxamento das medidas de quarentena que culminou na reabertura dos cinemas, inclusive, está entre os motivos que podem ser utilizados para explicar o declínio nas ações da Netflix.
Produções blockbuster como Spider-Man: No Way Home e The Batman trouxeram o público de volta aos cinemas. O primeiro, por sinal, ocupa a sexta posição entre as produções com maior bilheteria na história do cinema, com mais de US$ 1,8 bilhão. O líder é “Avatar”, lançado em 2009, com mais de US$ 2,8 bilhões de bilheteria.
Um relatório produzido pelo J.P. Morgan em agosto do ano passado, aliás, já apontava que a Netflix estava atenta a isso e negociava para ser a plataforma para o lançamento de filmes no lugar das telonas. Ou, pelo menos, para disponibilizar o conteúdo exibido nos cinemas o quanto antes em sua plataforma.
No primeiro caso, vale o exemplo do filme Ataque de Cães, lançado pela companhia no ano passado, e que é o recordista do Oscar deste ano com 12 indicações. No segundo caso, vale destacar que a companhia conseguiu diminuir o intervalo entre os lançamentos no cinema e no streaming de 90 para 45 dias.
Mas os esforços neste sentido não foram suficientes para que a companhia conseguisse manter o ritmo de crescimento num mercado mais competitivo.
A chegada de rivais de peso gerou um empobrecimento no catálogo da Netflix. Franquias como Star Wars e Harry Potter agora são exibidas somente em plataformas concorrentes.
Mais recentemente, a Netflix viu terminar o seu contrato para a exibição de produções da Marvel como Daredevil, Jessica Jones, Luke Cage, entre outras.
Em meio a tudo isso, a Netflix ainda vê de longe o crescimento de suas rivais num mercado que até então pouco explorou: o de esportes. Transmissões esportivas, principalmente de futebol, tornaram-se frequentes em serviços como Prime Video, HBO Max e até no YouTube.
Entrar nesta competição custa dinheiro. Nos EUA, por exemplo, a Amazon firmou um acordo de 11 anos em que vai pagar US$ 1 bilhão por temporada para a exibição dos jogos de futebol americano exibidos às quintas-feiras da NFL. Já a DirecTV paga US$ 2,5 bilhões por ano pelo Sunday Ticket, referente aos jogos exibidos domingo.
Em relação às finanças, no quarto trimestre do ano passado, vale lembrar que o lucro líquido da Netflix caiu 58%, passando de US$ 1,4 bilhão para US$ 607 milhões na comparação com o terceiro trimestre. Na comparação anual, porém, houve avanço de 11,9%. Já a receita foi de US$ 7,71 bilhões, alta de 16% na comparação anual.
A aposta em Los Gatos, sede da Netflix, foi em outra direção. Para diversificar o negócio, a companhia focou nos games. Em setembro, a companhia comprou o estúdio de jogos Night School. Mais recentemente adquiriu a produtora Next Games, da Finlândia, por US$ 72 milhões.