Quando subir ao palco do Teatro B32, na quinta-feira, 25 de agosto, em São Paulo, o violonista João Camarero não apenas lançará seu mais novo disco Gentil assombro, um título na velha tradição dos trocadilhos de choro, pela gravadora Biscoito Fino.

Para quem não o conhece, é certo que causará ao menos espanto pela habilidade em tocar o instrumento e a sensibilidade para tirar notas “profundas” como faziam mestres como Dino 7 Cordas e Jacob do Bandolim.

Aliás, talvez o maior reconhecimento de seu talento seja fazer parte do grupo que Jacob fundou em 1960 e que em 1964 foi batizado de Época de Ouro. Deste fizeram parte grandes violonistas como Dino 7 Cordas e César Faria, pai de Paulinho da Viola.

Camarero promete surpresas para a plateia e interpretará duas composições inéditas que Paulinho da Viola lhe deu para fazer parte do disco – Um choro breve e Homenagem a Armando Neves.

O público poderá desfrutar de músicas novas que acaba de gravar, como a belíssima Sherzino mexicano (Manuel Ponce), e outras dos dois discos anteriores – João Camarero (2014), Vento brando (2019) –, como Tocata em ritmo de samba, Choro da brasiliana e Camará.

Talvez o maior reconhecimento de seu talento seja fazer parte do grupo que Jacob do Bandolim fundou em 1960 e que em 1964 foi batizado de Época de Ouro

Com apenas 32 anos e uma carreira consolidada, Camarero se define como um erudito apaixonado por canção popular e um músico popular de alma concertista. Tem experiência em palco, pois tocou para Maria Bethânia, Leny Andrade e Cristóvão Bastos, entre tantos outros, e em roda de choro ou em sala de concertos, como provam as autorais Pequenas valsas sentimentais #3 e #5, as únicas composições próprias do álbum.

Em estúdio, Camarero acompanhou Yamandú Costa, Mônica Salmaso, Fágner, Paulinho da Viola e Maria Bethânia - que o escolheu para o álbum Noturno (2021) - além de duas participações em homenagens a Aldir Blanc e Hermínio Bello de Carvalho, nas faixas Palácio de lágrimas (Aldir Blanc/Moacyr Luz) e Cobras e lagartos (Sueli Costa/Hermínio Bello de Carvalho), respectivamente.

Nascido em Ribeirão Preto e criado em Avaré, interior de São Paulo, Camarero estudou no Conservatório de Tatuí, interior paulista, e na Escola Portátil de Música, no Rio de Janeiro, onde trabalhou como monitor e professor.

Com apenas 32 anos e uma carreira consolidada, Camarero se define como um erudito apaixonado por canção popular e um músico popular de alma concertista

Compôs com Cristóvão Bastos, Moacyr Luz, Roberto Didio e Paulo César Pinheiro, entre outros. É vencedor dos prêmios MIMO Instrumental (2015) e do Concurso Novas -3 (2016), e integra também o grupo Regional Imperial.

Além de diversas cidades Brasil afora, já se apresentou em importantes salas de concerto em países como EUA, Japão, Coreia do Sul, França, Alemanha, Itália, Holanda, Inglaterra, Bélgica e Áustria.

Neste papo exclusivo com o NeoFeed, Camarero fala de sua formação, principais influências e métodos de compor e gravar e convida os paulistanos ao que pode ser descrito como uma imersão na música instrumental popular brasileira, em que a emoção de belas composições se mistura a uma impressionante habilidade em dedilhar cordas, capaz de levar a plateia a um transe.

Posso começar com uma pergunta que todo mundo deve te fazer? Quais são suas principais influências no violão popular e erudito?
Na popular, cito Jayme Florence, o Meira. Ele foi professor dos grandes violonistas do Brasil, como Baden Powell e Raphael Rabello, além de ter feito a maior dupla de violão da história da música brasileira com Dino 7 Cordas. Entre os eruditos, Andrés Segovia. É o pai do violão moderno, quem definiu sonoridade, abriu caminhos e desenvolveu repertório.

Quais são os cinco grandes que você admira no violão popular?
Dino 7 Cordas, Raphael Rabello, Baden Powell, João Lyra e Canhoto da Paraíba.

Você costuma buscar no passado referências, como em nomes como João Pernambuco, Garoto, Dilermando Reis, Dino 7 Cordas ou mesmo mais recentes como Rafael Rabello?
Olha, acredito na importância de nos fundamentarmos nos mestres que construíram as linguagens que queremos dominar. Porém, isso não anula o fato de olhar para o presente. Sem olhar para frente, torna-se saudosismo e o fio da história para de se desenrolar.

"Acredito na importância de nos fundamentarmos nos mestres que construíram as linguagens que queremos dominar. Isso não anula o fato de olhar para o presente. Sem olhar para frente, torna-se saudosismo e o fio da história para de se desenrolar"

Quando se diz que você é um erudito apaixonado por canção popular e músico popular de alma concertista, isso se junta de que forma nas suas composições e interpretações?
Na escolha de sonoridade, principalmente, creio. Também na maneira de como encarar a música, com absoluta seriedade e compromisso, mas, antes de tudo, com uma leveza e alegria de tocar, claro.

O que se aprende como músico ao acompanhar artistas da excelência de Maria Bethânia?
Para além da excelência musical, aprendo muito sobre comprometimento, dedicação e entrega.

Se eu pedir para definir seu novo disco, que mistura música instrumental brasileira e estrangeira, o que você diria?
Que estou pensando em música, independente da sua origem.

Há uma sintonia, uma ligação com os dois discos anteriores? Ou cada um é independente?
Sem dúvida, há uma ligação: o fato de tocar o que sempre acho que tenho para dizer. E o assunto pode mudar, mas o cerne é o mesmo, está ali desde o primeiro disco.

Você gravou duas composições inéditas de Paulinho da Viola. Você pediu a ele algo para incluir no disco?
Paulinho me mostrou, numa ocasião informal, a Homenagem a Armando Neves. Fiquei apaixonado pela peça e, posteriormente, quando comecei a levantar o repertório novo para gravar, entrei em contato com ele sobre esse choro. Ele, então, me cedeu além desse, um outro que havia acabado de compor (Um choro breve).

Você quer chegar a algum lugar, a uma linha, um estilo? Ou cada disco é independente e tem a ver com o momento?
Inevitavelmente, cada disco meu tem muito a ver com o momento. Mas se olharmos de um panorama mais distante, acho que a linha vai se desenhando e o estilo se aprimorando.

Que gêneros musicais você flerta neste disco? Há uma referência ao choro (Paulinho) e três faixas com títulos em espanhol. Pode explicar o conceito dessa mistura?
Eu não sinto que sejam coisas tão distantes, apesar de serem bem distintas entre si. Todas carregam a alma da música popular do seu lugar de origem. Todas oferecem algo para além da beleza óbvia.

"Todas carregam a alma da música popular do seu lugar de origem. Todas oferecem algo para além da beleza óbvia"

Jacob do Bandolim passava semanas ou meses ensaiando com seus músicos do Época de Ouro. Como é o seu processo preparação para gravação? Há improviso no estúdio ou você treina exaustivamente antes? Gosta de burilar?
As duas coisas. Estudo muito, gosto de amadurecer o repertório no palco, mas também sempre deixo espaço para o que pode acontecer durante a gravação. Não me fecho cegamente a uma interpretação fixa.

Serviço:
Show de lançamento Gentil assombro, de João Camarero
Data: 25/08 (quinta-feira)
Horário: 20h
Local: Teatro B32 – Avenida Brigadeiro Faria Lima, 3732, Itaim Bibi, São Paulo
Duração: 60 minutos
Ingressos
Classificação: 16 anos