A cantora americana Taylor Swift é um fenômeno sob vários aspectos. Aos 16 anos lançou seu primeiro disco. Aos 20, conquistou seu primeiro Grammy de Álbum do Ano - prêmio que receberia em duas outras ocasiões, empatando o recorde de ninguém menos que Frank Sinatra, Stevie Wonder e Paul Simon.

Aos 27, ela lançou o disco "Reputation", cuja turnê se tornaria a mais rentável da história dos Estados Unidos, arrecadando US$ 345 milhões. Aos 30, dona de uma fortuna estimada em US$ 365 milhões, superou a marca de 50 milhões de cópias vendidas - uma cifra astronômica para o mercado atual.

Em um momento em que as vendas de discos só caem, é a única que ainda consegue vender ao menos 1 milhão de cópias de seus trabalhos. Agora, aos 31 anos, o maior ícone pop da atualidade quer entrar de novo para a história. Só que, dessa vez, batendo de frente com poderosos empresários da indústria da música – a mesma que a forjou.

Swift planeja regravar todos os seus seis primeiros discos por conta de uma longa disputa sobre a propriedade de suas próprias canções. Pode parecer um detalhe, mas ao regravar seus próprios sucessos, ela coloca em xeque um milionário catálogo que já foi comercializado por centenas de milhões de dólares algumas vezes.

O primeiro passo para retomar o controle criativo de seus trabalhos mais antigos acaba de ser dado. "Fearless (Taylor's Version)", regravação do álbum de mesmo nome que lançou originalmente em 2008, já está disponível nas plataformas de streaming desde o dia 9 de abril. E mostra o fenômeno que Swift, dona de uma fortuna de US$ 400 milhões, se tornou. Das dez músicas mais tocadas no Spotify, nos Estados Unidos, seis são do álbum que a cantora regravou e colocou no ar.

O imbróglio remonta ao início de sua carreira. Ainda menor de idade, ela fechou um contrato com o selo musical Big Machine, do executivo Scott Borchetta, com duração de 12 anos. De acordo com esse contrato, Swift não é dona das masters, como são chamadas as gravações originais. Isso quer dizer que ela não tem liberdade de usar essas músicas como bem entender.

A disputa ganhou uma outra dimensão em 2018, quando a Ithaca Holding, de Scooter Braun, empresário de artistas como Justin Bieber e Ariana Grande, comprou a Big Machine. Na aquisição, ficou com todas as masters. Swift expôs publicamente essa briga, dizendo na época que seu "legado musical estava nas mãos de alguém que tentou desmontá-lo".

Segundo a cantora, Braun se negou a permitir o licenciamento de suas canções em diversas ocasiões. No ano passado, Scooter Braun vendeu as masters para a gestora Shamrock Holdings, criada por Roy E. Disney (1930-2009), sobrinho de Walt Disney, em um negócio avaliado em US$ 300 milhões.

A nova versão de Taylor Swift para o próprio álbum

Novamente, a cantora criticou a negociação, afirmando que nunca teve a chance de comprar de volta essas gravações. No acordo que tem hoje com a gravadora Universal, ela é dona das masters que ela grava.

"Eu acho que os artistas merecem ser donos de seus trabalhos. É um tema com que me sinto muito apaixonada", escreveu a cantora em seu Instagram. "E a razão mais óbvia é que só eles de fato conhecem esse catálogo".

Taylor Swift aproveitou sua popularidade para escancarar os problemas da indústria da música, e comprou a briga para retomar o controle. Ou, no mínimo, usar seu exemplo como alerta para outros artistas.

"Música é arte, mas também é negócio. Dá muito lucro e envolve muito dinheiro", diz o crítico Marcelo Costa, do site de cultura pop Scream & Yell. "Vivemos em um mundo em que Paul McCartney perdeu os direitos sobre suas músicas por um tempo. Em que os Rolling Stones não têm domínio sobre suas primeiras gravações."

É claro que não é qualquer artista que pode comprar uma briga desse tamanho. E nem mesmo Taylor Swift conseguiu reaver as masters. Mas ainda é dona das composições. Seu contrato original permitia a regravação a partir de novembro de 2020, desde que as novas versões não fossem cópias das originais. É uma cláusula comum nesse tipo de negociação.

Foi assim que decidiu regravar os seis primeiros discos, mantendo arranjos próximos dos originais. Na prática, as gravações originais perdem valor. É como se ela dissesse para os fãs que o que vale, agora, são os novos trabalhos.

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Por isso, a prática é incomum na indústria da música. Existem outros exemplos. A banda de hard rock Def Leppard, popular na década de 1980 e com mais de 100 milhões de discos vendidos na bagagem, regravou alguns de seus sucessos justamente por conta de disputas com a gravadora.

Mas o alcance de Taylor, hoje, é mais amplo. "Por tudo que ela passou e por tudo que ela representa, essa disputa tem um reflexo no cenário pop como um todo", diz Marcelo Costa. Em sua visão, artistas que olharem para o imbróglio vão ficar muito mais atentos às letras miúdas dos contratos.

A cantora despontou com suas composições influenciadas pelo country. Foi incorporando outros estilos e migrando cada vez mais para o pop, consolidando sua posição de liderança. Foi tema recorrente em sites de fofoca principalmente por conta de seus relacionamentos com músicos e atores, como Harry Styles, John Mayer, Calvin Harris e Tom Hiddleston (o Loki dos filmes da Marvel).

No ano passado, enquanto a pandemia interrompeu boa parte da indústria musical, impedindo a realização de shows, Swift deu outra guinada musical e passou por 2020 de maneira intensa e produtiva.

Swift lançou dois discos, "Folklore", em junho, e "Evermore", em dezembro, ambos influenciados por uma sonoridade mais folk e “indie” que atraíram a atenção da crítica e apareceram nas listas de melhores lançamentos do ano.

Foi também tema de dois documentários: "Miss Americana", disponível na Netflix, que reconta sua trajetória, e "Folklore: The Long Pond Studio Sessions", para a Disney+, em que toca todas as faixas de "Folklore" e fala sobre o processo criativo envolvido na composição.