Frederico Pompeu, sócio e head do boostLAB, hub de negócios do BTG Pactual para empresas tech, costuma brincar que a vantagem de se olhar os Estados Unidos é que você lê o jornal hoje e sabe o que vai acontecer com o Brasil amanhã. “Se oito das dez maiores empresas dos EUA são de tecnologia, é natural que isso aconteça aqui”, diz ele.
Por isso, ele busca estar próximo dessas empresas e usa outro exemplo que cristaliza seu pensamento. “É muito mais difícil ficar amigo do David Vélez agora que ele fez uma rodada que avalia o Nubank em US$ 25 bilhões do que ficar amigo dele quando ele está no início e está precisando de um amigo”, diz Pompeu sobre o empresário que fundou o Nubank.
De olho nisso, buscando “ficar amigo” das startups e, claro, também lucrar, o boostLAB, que já funciona impulsionando startups que atuam nas áreas de interesse do banco, acaba de lançar uma linha de crédito especial para empresas tech. Serão emprestados entre R$ 200 mil e R$ 4 milhões com taxas mensais de 1,8% com prazo de 18 meses e carência de até seis meses.
“Muita startup pedia para levantar R$ 500 mil, R$ 1 milhão, R$ 3 milhões. Mas o banco não tinha esse produto”, afirma Pompeu, que detalhou os planos com exclusividade ao NeoFeed. “Preciso ser o banco desse ecossistema, referência para esses empreendedores”, afirma.
A saída foi desenhar um modelo específico para esse público que não quer ser diluído em uma nova rodada de investimento, mas que, ao mesmo tempo, não pode abrir mão de estar capitalizado para investir na operação.
O modelo adotado contempla startups que já receberam investimentos de fundos de venture capital e que também geram receita recorrente mensal, a chamada de MRR (Monthly Recurring Revenue). São dois os motivos que levaram o boostLAB a adotar essa régua.
Ao estipular o corte de startups que contam com a participação de fundos, Pompeu diz que, por ter bom relacionamento com os gestores e heads dos principais fundos do mercado, consegue fazer uma checagem das informações com os VCs. Não é uma garantia, mas minimiza os riscos de inadimplência.
O outro ponto, a exigência de que a startup tenha uma receita mensal recorrente, serve como uma espécie de recebível em caso de falta de pagamento. Não há números exatos do tamanho desse mercado, mas, ao mirar essas empresas, o BTG pode se posicionar como um “amigo” de startups que atuam em um mercado bilionário.
Os ícones desse segmento no mundo, principalmente no B2C, são empresas como Spotify e Netflix. No Brasil, PlayKids, da Movile, atua dessa maneira. Já no B2B, no mercado de software as a service, players como RD Station, que acabou de ser comprada pela Totvs por R$ 1,86 bilhão, Olist, ContaAzul, entre outras, se destacam.
Agora, essas empresas já são grandes, mas, a ideia é “dar a mão” para startups que podem se tornar gigantes, permitindo que o banco ofereça outros produtos e serviços. Trata-se de um posicionamento estratégico para a instituição financeira de André Esteves, comandada por Roberto Sallouti.
Um caso emblemático, que serve para exemplificar a atuação do BTG e o que o banco ambiciona junto às empresas de tecnologia, é o da Mosaico. Em 2019, quando a companhia, dona dos sites Zoom e Bondfaro, comprou o Buscapé, ela concluiu a transação através de um venture debt (empréstimo que pode ser convertido em ações em uma nova captação) com o banco.
Depois, quando fez IPO, captando R$ 1,21 bilhão, a Mosaico escolheu o BTG para ser o coordenador da oferta. Agora, a plataforma da Mosaico será a loja oficial do aplicativo BTG+, o banco digital para pessoas físicas do grupo financeiro. Detalhe: a instituição financeira ainda é acionista da Mosaico.
Essa nova linha de crédito do BTG enfrentará a concorrência da fintech A55, investida pelo Santander que oferece empréstimos que variam entre R$ 20 mil e R$ 5 milhões. Mas a maior competição virá do mercado de venture debt, área que já conta com mais players atuantes.
A Galapagos Capital, fundada pelo ex-sócio do BTG e do C6 Bank, Carlos Fonseca, emprestou R$ 45 milhões, no ano passado, assinando cheques entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões. Para este ano, o montante emprestado pode chegar a R$ 150 milhões.
Esse nicho ainda é disputado pelo Silicon Valley Bank (SVB) e o Brasil Venture Debt. O SVB, conhecido por ser o banco das startups nos Estados Unidos, estruturou um fundo de venture debt de US$ 30 milhões para emprestar para startups latino-americanas. O Brasil Venture Debt, por sua vez, conta com R$ 140 milhões.
De acordo com um estudo do próprio BTG, o venture debt é praticamente virgem no Brasil. Nos Estados Unidos, entretanto, vem crescendo. Entre janeiro de 2010 e março de 2019, os americanos concentraram 78% das transações. Em seguida vem os europeus com 10%, os canadenses com 6% e o restante do mundo outros 6%.
Os volumes emprestados têm crescido, mas ainda estão bem longe dos praticados pela indústria de venture capital. Enquanto os venture debt responderam por US$ 10,1 bilhões no mercado americano, em 2019, US$ 1,7 bilhão a mais do que em 2018, o venture capital respondeu por US$ 136,5 bilhões.