Assim como boa parte do varejo, a Marisa passou por maus bocados com a Covid-19. Com um agravante: a pandemia atingiu em cheio a reestruturação da empresa, iniciada em 2017 e, desde então, a rede de moda feminina vem lutando para retomar o caminho de recuperação que vinha trilhando.

No último dia 3 de dezembro, a companhia deu mais um passo nessa direção, ao anunciar um aumento de capital de até R$ 250 milhões. A operação, que prevê uma segunda tranche no fim de 2022, veio com a chancela da família Goldfarb, sua controladora, que se comprometeu a participar com R$ 90 milhões.

Com os novos recursos, a Marisa entende que tem um colchão para enfrentar um ciclo que, novamente, promete não ser fácil. E, sob esse novo panorama, vai dar velocidade a iniciativas como o recém-lançado marketplace, o braço financeiro Mbank e o novo modelo de lojas físicas.

“Estamos bastante confiantes que essa injeção de capital permite não só a proteção do negócio num ano incerto como 2022, com eleições e outros fatores”, diz Marcelo Pimentel, CEO da Marisa, ao NeoFeed. “Mas também que a empresa volte a investir na retomada que ela merece ter.”

O executivo reconhece que questões como a inflação e o desemprego afetam o bolso do público atendido pela Marisa, conhecida pelo slogan “De mulher pra mulher” e por seu apelo junto às consumidoras da classe C. Em contrapartida, ele enxerga oportunidades nesse contexto.

“A mulher das classes B e B- também está sendo impactada”, afirma. “E estamos olhando também para esse segmento, que podemos aproveitar e atender nesse momento.”

Lançado em novembro deste ano, o marketplace é uma das apostas da rede para manter e estabelecer novos diálogos com o público feminino. Com mais de 6 mil produtos, ele traz marcas como Mormaii, Forever Liss, Passarela, Beleza Natural e Honey Be, além de opções em áreas como educação financeira.

A empresa já tem conversas avançadas para adicionar novas categorias a esse mix. Para o primeiro trimestre de 2022, estão previstas ofertas em segmentos como beleza, perfumaria e bem-estar. No ano, a ideia é chegar a 350 sellers na plataforma.

“Tem muito tubarão nesse oceano e nós somos um peixe. Não adianta entrar na luta do marketplace generalista”, diz Pimentel. Ele ressalta a curadoria da plataforma. “Queremos ser o marketplace da mulher. Mas não vamos ter qualquer produto. Você não vai encontrar vassoura ou produto de limpeza.”

Trazer novidades para o portfólio é também o nome do jogo para o MBank, braço de produtos e serviços financeiros que entrou no ar em setembro. A divisão vai digitalizar o que a empresa já oferecia na área, de cartões a empréstimos, e já nasceu com mais de 2 milhões de clientes.

Essa oferta está integrada ao aplicativo da rede, lançado também neste ano e que tem 12 milhões de downloads. Hoje, 40% das vendas digitais já passam pelo MBank. O digital, por sua vez, vai fechar 2021 com uma fatia de 14% do faturamento total da Marisa. Até 2025, o plano é chegar a um índice de 25%.

“Já temos uma carteira de crédito pessoal muito forte, cartão digital, seguros e temos feito testes com cashback”, diz Pimentel. “Em 2022, o plano é lançar uma carteira digital e avançar em produtos como seguros para pets, que é uma grande demanda das clientes.”

A integração de totens e tablets, nos quais as clientes podem fazer todas as operações ligadas ao Mbank, é também um dos destaques do novo modelo de loja da Marisa. Depois do teste inicial com uma unidade no shopping Parque D. Pedro, em Campinas (SP), a rede começa a expandir esse formato.

Com um custo 16% menor em relação ao modelo tradicional, as primeiras quatro unidades a passarem por esse banho de loja estão localizadas na Avenida Paulista, em São Paulo; nos shoppings Aricanduva e Interlagos, também na capital paulista; e no Osasco Plaza, na cidade de Osasco.

O novo modelo reforça a pegada de tecnologia e os esforços multicanal da Marisa. Por meio do app da rede, a cliente tem acesso a todos os produtos disponíveis no digital e consegue, por exemplo, escanear qualquer item e colocá-lo em uma sacola virtual, além de finalizar a compra em qualquer ponto da loja.

Um dos focos da Marisa é expandir seu novo modelo de loja

Embora não revele uma projeção de aberturas, Pimentel diz que esse formato irá guiar não apenas as reformas, mas também a volta da expansão das lojas físicas da varejista, que hoje conta com 344 pontos de venda no País. Essa estratégia terá maior foco em lojas de shopping e nas regiões Norte e Nordeste.

“Não temos visto nenhum boom, e sim, uma retomada gradual nas vendas”, observa o CEO da Marisa. “Ao mesmo tempo, temos performado melhor nas lojas de shopping e o Norte e o Nordeste têm sido as regiões mais resilientes em termos de demanda.”

De investidor para investidor

Com esses e outros projetos, a Marisa tenta encerrar uma trajetória marcada por muitas baixas no mercado de capitais. Depois de passar por uma severa crise, a empresa encerrou 2019 com uma valorização de 146% em suas ações. Em 2020, no entanto, os papéis acumularam queda de 51%.

“A empresa vinha entrando nos eixos, mas, com a pandemia, tombou novamente”, diz Alberto Serrentino, sócio da consultoria Varese. “Eles voltaram a remar e, agora, com essa capitalização, esses projetos e a retomada do varejo de moda, têm um cenário mais favorável à frente.”

Em 2021, as ações da Marisa, avaliada em R$ 1 bilhão, acumulam desvalorização de cerca de 44%. Em contrapartida, além da alta de mais de 15% com a notícia do aumento de capital, o papel teve outro pico em agosto, com a divulgação das negociações para uma possível transação com a Americanas.

“Houve conversas muito mais atreladas ao MBank”, diz Pimentel. “Mas acredito que isso foi muito mais um hype pelos movimentos de consolidação da Arezzo e do Grupo Soma, na época, e entendemos que não era o momento de seguir adiante.”

Com suas ações cotadas a R$ 3,77, a rede tenta convencer os investidores, a partir de seus resultados, que está voltando aos trilhos. De janeiro a setembro deste ano, a receita líquida da Marisa cresceu 20,7%, para R$ 1,39 bilhão. A empresa reduziu seu prejuízo líquido em 83%, para R$ 68,5 milhões.

Em relatório, os analistas Karen Atsuta e Eduardo Nishio, da Genial Investimentos, apontaram a recuperação no terceiro trimestre, mas recomendaram cautela com a empresa, em virtude do cenário macroeconômico mais desafiador, que “corrói o poder de compra do público-alvo da companhia”.

Em contrapartida, eles destacaram a performance do digital, o potencial do marketplace e o novo formato de lojas, com a retomada da expansão em shoppings. E classificaram o MBank como a “galinha dos ovos de ouro da operação.

Em entrevista programa Conexão CEO, do NeoFeed, além dessas iniciativas, do cenário macro e da retomada, Pimentel fala ainda de projetos como o programa Sou Sócia, uma plataforma digital de vendas via consultoras; o investimento em dark stores; e a parceria com hub de inovação Distrito para se aproximar de startups.

Assista ao programa: