Na última sexta-feira, 12 de março, Guilherme Benchimol, fundador e CEO da XP Inc., pegou o mercado de surpresa e anunciou que deixaria o cargo de CEO da XP Inc. para ocupar a posição de presidente do Conselho de Administração da companhia avaliada em US$ 22,7 bilhões na Nasdaq.

A partir de agora, Benchimol se dedicará a questões estratégicas como o relacionamento com os escritórios de agentes autônomos, focará em M&As e continuará sendo a cara e alma da empresa que fundou. Mas o dia-a-dia da operação agora será tocado pelo executivo Thiago Maffra, até então diretor de tecnologia do grupo.

A indicação não deixa de ser simbólica. Primeiro porque Mafra, de origem humilde, conquistou muitas coisas “na raça” e segundo porque ele comanda uma área estratégica e a XP quer, cada vez mais, ser vista como uma empresa de tech. Mas, afinal, quem é e o que pensa o novo CEO do grupo?

O NeoFeed teve acesso a uma carta que Maffra acabou de enviar aos 3,8 mil funcionários do grupo XP Inc.. Intitulada “Construindo juntos o futuro da XP”, ela traz muito da história dele, desde a mudança de sua cidade-natal Araxá (MG) com um ano de idade para Itapevi, na grande São Paulo.

Ironia do destino, ele estudou em São Roque, a mesma cidade onde a Villa XP está sendo construída. Mas, além de seu passado, ele dá o tom do que virá pela frente e o que a nova gestão espera da equipe. “Para fazer coisas incríveis, todos nós precisamos nos dedicar muito, abdicar de recompensas de curto prazo em busca de uma recompensa maior no futuro”, escreveu Maffra.

O executivo continuou dando o tom. “É preciso ter resiliência, pois certamente iremos errar algumas vezes ao longo do caminho, saber dividir o nosso sonho e ter as pessoas certas ao nosso lado. Ninguém constrói nada grandioso sozinho, e precisamos ter certeza que temos as mentes mais brilhantes conosco para realmente atingirmos os nossos grandes objetivos”, afirmou.

O discurso é extremamente afinado com o de Benchimol. “Nossa missão para os próximos anos será intensificar a transformação do mercado financeiro a favor dos clientes, nos consolidando de vez no mundo dos investimentos para as pessoas e as empresas, e avançando para outros serviços como conta digital, cartão de crédito, crédito, seguros e muito mais”, diz ele.

Maffra, que até agora liderou a transformação digital da companhia, sabe o grande desafio que tem pela frente. Mais do que implementar tecnologia, é necessário um amplo processo de transformação cultural. E os números mostram isso. Em 2018, a XP contava com 150 funcionários de tecnologia. Hoje, quase 1,9 mil atuam na área.

“O nosso grande desafio será fazer isso de forma diferente, por meio de uma transformação digital, em um modelo no qual produto, design, operações e tecnologia passam a estar totalmente integrados, olhando a jornada do cliente do início ao fim”, afirma.

Leia a carta de Thiago Maffra, o novo CEO da XP Inc., na íntegra:

Construindo juntos o futuro da XP

Boa noite pessoal,

Antes de mais nada, espero que vocês e as suas famílias estejam bem, e que isso tudo passe logo para que possamos nos encontrar pessoalmente.

Diante do anúncio de sexta-feira, pensei que seria interessante compartilhar um pouco da minha história até aqui, que acredito ser parecida com a de muita gente na empresa e poucos conhecem, e como vejo o nosso futuro se delineando nos próximos anos.

Nasci em uma família de classe média, em Minas Gerais, mais precisamente em Araxá. Acabei mudando de lá bem cedo, com apenas um ano, e fui criado em Itapevi, na grande São Paulo.

Durante meu período escolar, fazia todos os dias um trajeto de ao menos 1 hora de ônibus até São Roque - sim, a cidade da nossa nova sede, o bom filho à casa torna-, pois as escolas de Itapevi não eram tão boas naquela época. Tive uma infância simples e sem grandes luxos, mas feliz, brincando na rua, torcendo para o São Paulo nas suas boas épocas, jogando videogame e estudando.

Quando chegou a hora de decidir a faculdade, eu não tinha grandes mentores para me guiarem e não existia a abundância de conteúdos digitais que temos hoje para me ajudar, mas a minha preocupação era ter uma profissão que me abrisse portas e permitisse ajudar a minha família. Acabei optando pelo Ibmec, que hoje vocês conhecem como Insper, pois me diziam que as pessoas que se formavam ali teriam boas oportunidades e que muitos alunos iam para um tal de “mercado financeiro”, mas não tinha muita ideia do que viria pela frente.

Eu e a minha família, porém, não tínhamos dinheiro para pagar a mensalidade, e muito menos para comprar um laptop, obrigatório na época. Consegui uma bolsa de estudos parcial por meio das minhas notas e a minha mãe decidiu vender o carro dela para pagar o restante, e assim começou a minha jornada. Qualquer semelhança com o que o Guilherme fez lá atrás para salvar a XP é mera coincidência, mas confesso que sempre me inspirou e gerou uma conexão ainda maior minha com a empresa.

O segundo grande desafio do período foi ter que aprender um novo idioma sozinho, o inglês, que eu não falava. Mas todos os livros da faculdade eram justamente em inglês, então não tive opção, e como não podia pagar um curso, foi na raça mesmo.

Durante a faculdade, dividi um pequeno apartamento de dois quartos com outras sete pessoas, construí grandes amizades que guardo até hoje e aprendi muito. O aprendizado mais importante que guardo desse período é que as coisas não seriam fáceis e que se eu quisesse vencer de verdade era preciso ir atrás.

Da faculdade, entrei no tão sonhado mercado financeiro, trilhando uma carreira em mesas de operações e, em 2015, finalmente encontrei a XP.

Eu já tinha escutado falar de uma empresa que não parava de crescer, que tinha um modelo meritocrático, uma partnership, e que poderia ser grande no futuro. Parece ontem, mas na época o Brasil estava em crise e a XP ainda estava emergindo, começando a apontar na direção do que conhecemos hoje.

Após uma série de entrevistas, acabou dando certo e fui contratado para montar a mesa de algotrading. E foi amor à primeira vista. O espírito empreendedor, a horizontalidade da empresa e a velocidade com a qual as coisas aconteciam me motivaram desde o início. Foi um período incrível. Finalmente, tinha encontrado a empresa dos meus sonhos.

Apesar de amar a XP, sabia que precisava evoluir como profissional e pessoa e foi ali que decidi tomar o risco de pegar todas as minhas economias, deixar a empresa por um tempo, sem saber se um dia encontraria novamente um lugar tão incrível quanto aquele, e ir fazer um MBA no exterior, na Columbia Business School, em Nova York.

Mas dei sorte e apenas dois meses depois recebi uma ligação do Carlão pedindo para que voltasse para a Companhia. Fiquei trabalhando ao longo do MBA para a XP de Nova York e voltei para São Paulo com a missão de montar a Xdex, a nossa antiga corretora de criptomoedas. Da Xdex, acabei migrando para a tecnologia e hoje estou aqui, humildemente aceitando mais um desafio para que possamos seguir construindo esse sonho grande que chama XP.

Fiz questão de fazer essa longa introdução para mostrar principalmente que aqui na XP os nossos sonhos, por maior que sejam, podem sempre se realizar e que nada, realmente nada é impossível. É uma empresa que sempre valorizou o trabalho duro e honesto, pessoas com perfil de liderança, que trabalham bem em equipe e com um foco total no que é melhor para o cliente.

Somos uma empresa que valoriza as pessoas, e apesar de sabermos que ainda temos muito para melhorar, estamos trabalhando duro para que todas as pessoas tenham as mesmas condições de desenvolver a sua carreira conosco. Somos uma empresa que sempre colocou as pessoas em primeiro lugar, e assim continuará sendo.

Isso não significa, porém, que o caminho será fácil. Muito pelo contrário. Para fazer coisas incríveis, todos nós precisamos nos dedicar muito, abdicar de recompensas de curto prazo em busca de uma recompensa maior no futuro. É preciso ter resiliência, pois certamente iremos errar algumas vezes ao longo do caminho, saber dividir o nosso sonho e ter as pessoas certas ao nosso lado. Ninguém constrói nada grandioso sozinho, e precisamos ter certeza que temos as mentes mais brilhantes conosco para realmente atingirmos os nossos grandes objetivos.

Nossa missão para os próximos anos será intensificar a transformação do mercado financeiro a favor dos clientes, nos consolidando de vez no mundo dos investimentos para as pessoas e as empresas, e avançando para outros serviços como conta digital, cartão de crédito, crédito, seguros e muito mais. O nosso grande desafio será fazer isso de forma diferente, por meio de uma transformação digital, em um modelo no qual produto, design, operações e tecnologia passam a estar totalmente integrados, olhando a jornada do cliente do início ao fim.

Hoje, temos apenas 1% de market share da receita total de R$ 770 bilhões do sistema financeiro. Isso mostra o tamanho da oportunidade que temos, e que a nossa jornada está apenas no começo. Podem ter uma certeza, não descansaremos enquanto não tivermos transformado o mercado financeiro completamente. Eu não tenho a menor dúvida de que chegaremos lá, e isso será transformacional para o Brasil.

Estamos construindo juntos a maior e melhor fintech do mundo! Para isso, precisamos seguir conectando os pontos e, tijolo por tijolo, estou certo que seremos a maior empresa financeira do Brasil nos próximos anos. Primeiro, transformaremos o ecossistema financeiro brasileiro e, depois, quem sabe, conquistaremos novos territórios.

Por fim, agradeço ao Guilherme e a todos os meus sócios e sócias pela confiança e por me proporcionarem o maior desafio da minha vida. A conquista do nosso sonho grande sempre foi e é, agora, mais do que nunca, o meu maior propósito.

Contamos com todos vocês nessa jornada. E, acima de tudo, esperamos que vocês se inspirem e se divirtam todos os dias.

Enjoy the journey!