O pacote econômico da China, anunciado na última semana de setembro, com forte estímulo monetário, representou a primeira etapa necessária para o país asiático evitar cair no mesmo processo de deflação que o Japão viveu por três décadas, a partir dos anos 80.
As outras duas etapas – adotar medidas de apoio fiscal que estimulem o consumo e uma reforma estrutural que inclua, entre outras iniciativas, fortalecimento de um sistema público de saúde - são imprescindíveis, mas o governo chinês vem se recusando a adotá-las.
O alerta é de Stephen Roach, economista da Universidade Yale, nos Estados Unidos, que publicou um artigo no jornal britânico Financial Times sobre o tema.
“A China corre o risco de cair num atoleiro semelhante ao japonês, caracterizado pela estagnação e deflação, como resultado do rebentamento de uma grande bolha de ativos alimentada pela dívida”, escreveu ele.
No caso do Japão, a queda dos preços dos ativos na década de 1980 imobilizou o dinamismo do crescimento e enviou o país para uma espiral deflacionária que durou três décadas.
A situação atual da China, adverte o economista, reflete virtualmente a vivida pela economia japonesa há 30 anos. O melhor exemplo é o estouro de uma bolha imobiliária em 2021 que, desde então, incinerou cerca de US$ 18 trilhões em riqueza das famílias chinesas, inibindo o consumo.
A saída para a China, propôs Roach, é adotar as lições aprendidas pelo Japão: "Eram necessários estímulos fiscais e monetários poderosos para proporcionar ao Japão uma velocidade de fuga, enquanto as reformas estruturais eram vitais para uma recuperação duradoura.”
Neste sentido, o recente pacote de estímulo do governo chinês da semana passada – incluindo injeções de liquidez de US$ 250 bilhões, flexibilização das taxas hipotecárias e grandes cortes nas taxas de juro e de reservas bancárias obrigatórias, esta para abrir linhas de crédito – representou o que Roach chama de “impulso monetário impressionante”.
Falta de confiança
O próximo passo - fazer o mesmo com estímulo fiscal - esbarra em vários problemas. Embora o governo tenha indicado disponibilidade para apoiar financeiramente os seus consumidores durante a reunião do Politburo do Partido Comunista na semana passada, Roach observou que poucos detalhes foram dados.
Isso reforça a falta de confiança dos consumidores no país, principalmente depois do estouro da crise imobiliária, que ceifou a poupança de boa parte das famílias.
Sem reanimar o mercado consumidor, a China tende a caminhar rapidamente para a deflação. Roach atribui a hesitação do governo chinês em abrir o cofre para estimular o consumo como reflexo do impacto gerado pelo crescimento da dívida pública – hoje sob índice estratosférico de 283% em relação ao PIB, três vezes superior ao da década passada.
"Tal como o Japão na década de 1990, o governo chinês continua cauteloso em implantar uma bazuca fiscal como fez em 2009-2010, dado o crescente endividamento do setor público", escreveu Roach.
O mesmo imobilismo é visto em relação à terceira etapa necessária para ajustar a economia e colocá-la em rota de crescimento que evite a deflação: reformas estruturais de longo prazo que levem em conta questões mal encaminhadas, como demografia e produtividade.
Roach vê como ajuste prioritário as reformas de segurança social, incluindo na lei de aposentadoria e investimento no sistema público de saúde – mesmo sob regime comunista, as autoridades chinesas sempre adotaram políticas sociais típicas de regimes ultraliberais, retirando o papel do Estado nessas áreas.
“Se estes benefícios fossem oferecidos, os consumidores chineses estariam menos inclinados a poupar”, conclui Roach. “O governo chinês precisa gastar com as pessoas para reanimar a procura interna; sem ela, o país caminha para a deflação, enquanto o seu enorme mercado imobiliário está sobrecarregado com habitações não vendidas e grandes pilhas de dívidas.”