A polarização política da campanha presidencial dos Estados Unidos chegou a Wall Street, um reduto que tradicionalmente se mantinha alheio às disputas pela Casa Branca, seja por temer eventuais retaliações caso seu candidato fosse derrotado ou pelo fato de os candidatos democrata e republicano normalmente não guardarem maiores divergências em relação à condução da economia.
Desta vez, no entanto, algumas diferenças marcantes entre a plataforma econômica da candidata democrata Kamala Harris e a do ex-presidente Donald Trump - cujo partido, o Republicano, sempre teve mais simpatia do mercado financeiro americano -, estão levando os principais executivos de Wall Street não só a declarar em quem vai votar como também a liberar polpudas contribuições financeiras para a campanha do nome escolhido.
“Esta é uma daquelas raras eleições em que as diferenças provavelmente superam as semelhanças, e é por isso que é uma eleição tão importante para a democracia americana e para a política externa do país”, disse Richard Haass, ex-presidente do Council on Foreign Relations, um think-tank respeitado dentro e fora dos EUA, ao portal Business Insider.
O portal americano vasculhou o site da Comissão Eleitoral Federal em busca de doações individuais de líderes de Wall Street entre 2023 e julho. Os dados mostraram que o apoio a Trump e a Harris está dividido de forma uniforme entre executivos e banqueiros. Os motivos podem variar pelo perfil da candidatura como a melhor para o país (Harris) ou pela agenda de redução de impostos (Trump).
A pesquisa, no entanto, não encontrou doação direta para nenhum dos candidatos dos chefes de grandes bancos de investimento de capital aberto, incluindo Goldman Sachs, J.P. Morgan, Citi, Bank of America e Morgan Stanley.
De qualquer forma, numa mostra do complexo cenário político americano, dois altos executivos da gigante de private equity Blackstone – o CEO Stephen Schwarzman e o COO Jon Gray – anunciaram apoio a candidatos diferentes: Schwarzman está com o Trump e Gray, com Harris.
A rigor, era de se esperar um grande apoio do setor a Trump. Mas a saída de cena da candidatura à reeleição do presidente Joe Biden, curiosamente, teve impacto relevante no coração do sistema financeiro americano.
Biden não era bem-visto em Wall Street, cuja governo voltado à classe trabalhadora defendeu sindicatos, combateu fusões e atribuiu a inflação elevada à ganância corporativa. Harris, apesar de uma agenda econômica aparentemente ainda mais à esquerda de Biden, porém, começou rapidamente a registrar adesões do mercado financeiro.
Parte é atribuída à conhecida ojeriza de Wall Street a Trump, que perseguiu executivos e empresas que não o apoiaram na última eleição, e parte ao currículo da candidata democrata. Como procuradora-geral e senadora pela Califórnia, Harris manteve boas relações com as gigantes de tecnologia do Vale do Silício e sempre foi elogiada por sua conduta correta ao julgar ações envolvendo empresas.
Doações elevadas
De acordo com o levantamento da Business Insider, muitos dos nomes parrudos do mercado financeiro já haviam feito doações no ano passado e antes de a vice-presidente substituir Biden na cabeça de chapa, ao Harris Action Fund, mantido pela vice-presidente.
É o caso de Roger Evercore, fundador e presidente do banco de investimento Evercore; Blair Effon, sócio Centerview Partners, banco especializado em fusões e aquisições; Marc Lasry, fundador e CEO do fundo de hedge Avenue Capital; e Peter Orszag, CEO do banco de investimento Lazard.
Mais recentemente, outros investidores que já haviam anunciado apoio a Biden reforçaram a aposta em Harris, com doações financeiras à campanha da candidata democrata. É o caso de Jon Gray, da Blackstone, que doou US$ 413 mil no fim de julho.
A campanha de Trump também recebeu apoio formal e doações de investidores de peso em Wall Street, como Bill Ackman, gestor bilionário de fundos de hedge e executivo-chefe da Pershing Square Capital Management.
Howard Lutnick, CEO da empresa de serviços financeiros Cantor Fitzgerald, não só apoia Trump como atua como arrecadador de fundos da campanha do candidato republicano – Lutnick inclusive doou US$ 410 mil do próprio bolso em março.
Outros nomes conhecidos de Wall Street alinhados com Trump incluem Omeed Malik, fundador e CEO do banco comercial Farvahar Partners; Peter May, sócio fundador e presidente da Trian Fund Management; e Scott Bessent, fundador do Key Square Group.
Pelo menos dois investidores já fizeram doações acima da média para a campanha de Trump. Robert Mercer, ex-CEO do fundo de hedge Renaissance Technologies, contribuiu com US$ 825 mil. John Paulson, fundador da Paulson & Co, um fundo de hedge que virou family office, doou US$ 813 mil.
Outros conhecidos eleitores de Trump da última eleição, no entanto, ainda não oficializaram apoio nesta campanha. Nelson Peltz, sócio-fundador do fundo de hedge Trian Partners, rejeitou Trump após os tumultos de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio dos EUA, mas admitiu em março que provavelmente votaria nele novamente, citando a inaptidão de Biden para o cargo.
Já Ken Griffin, CEO e fundador do fundo de hedge Citadel, apoiou a rival de Trump, Nikki Haley, nas primárias republicanas e disse que esperaria para ver quem Trump escolheria para vice na chapa antes de decidir se investiria seus bilhões de dólares no candidato republicano. Até agora, porém, Griffin ainda não colocou a mão no bolso.