Desafiador para muitos, o ano de 2022 entrou em seu último trimestre ainda com pouca previsibilidade no ambiente de investimentos global.

A instabilidade econômica que aflige o mundo mantém receios que acompanharam os profissionais do setor ao longo dos últimos meses – e nem mesmo os gestores que estão no coração do mercado financeiro, em Nova Iorque, passam isentos destas incertezas.

Nesta semana, tive a oportunidade de participar de um encontro com portfolio managers e diretores da Lord Abbett em Nova Jersey. Aqui do outro lado do rio, tentamos desvendar para onde o mercado pode seguir daqui para frente.

A Lord Abbett é uma das maiores gestoras de patrimônio dos EUA, com quase 100 anos de história e com mais de US$ 200 bilhões sob gestão – hoje, seus fundos estão acessíveis aos clientes da Avenue.

Trago os principais destaques dos diversos painéis e aquilo de mais importante que foi comentado no evento.

ORIGENS DA ATUAL INFLAÇÃO

Mercado de trabalho
Durante a pandemia, ficamos presos em casa e com a ajuda dos estímulos monetários não houve queda de consumo prolongado. O que vimos foi a mudança para um consumo de bens e produtos.

As pessoas ficaram presas em casa e resolveram gastar com moveis, reformas, videogames, entre outros. E logo, muitos desses produtos se tornaram mais escassos e tivemos inflação de bens e produtos. Posteriormente com a abertura, o consumo volta a se normalizar com as pessoas viajando, indo a restaurantes ou shows, por exemplo.

Questão é que o segmento de serviços é intenso e dependente de mão de obra e, por consequência, tem como driver importante de inflação os salários. Com o mercado de trabalho aquecido a taxa de trabalhadores que pedem demissão está em níveis recordes, porque as pessoas querem ganhar mais.

Surge então o atual problema de uma forte demanda por serviços, que mantém o mercado de trabalho aquecido; pressionando salários e, consequentemente, retroalimentando, ou tornando muito mais difícil o trabalho da autoridade monetária. Como conclusão, o combate à inflação se torna mais difícil e tende a ser mais longo.

Aluguéis
Outro problema atual é que os aluguéis, que representam uma parcela considerável do índice de inflação, seguem em alta. Isso tem a ver com o menor volume de construções pós-2008.

A crise de 2008 afetou o mercado imobiliário e levou anos para voltarmos a termos um volume robusto de novas construções. Logo o estoque de moradia diminuiu, enquanto a demanda por moradia seguiu aquecida.

Bem verdade que os indicadores do setor já mostram uma desaceleração, mas eles demoram a aparecer em termos de queda de aluguéis. Mais uma vez aqui, como conclusão, o combate à inflação se torna mais difícil e tende a ser mais longo.

Reflexos da luta contra inflação
Se a inflação é um problema e se a luta contra ela deve levar mais tempo, devemos seguir vendo juros em alta ou em patamares elevados nos EUA, o que por consequência torna difícil não termos o chamado hard landing – uma desaceleração mais forte que leve a recessão.

Fora isso, o problema de você ter índice de inflação mais elevados (um número maior e longe da meta) é a instabilidade no mecanismo de preços e que tende a gerar maior volatilidade no PIB – oscilações maiores entre períodos de crescimento e decrescimento... a economia se desestabiliza.

COMO AJUSTAR OS PORTFÓLIOS?

Conselho prático
Vivemos um momento de muitas incertezas, volatilidade e receios vindo de diversos lados. Nesse cenário, mesmo gestores profissionais tem dificuldade de ter fortes convicções. mas tudo bem. Talvez seja exatamente essa postura humilde que seja o melhor approach na hora de investir. Nesse cenário de incertezas a capacidade de admitir uma visão errada e mudar suas posições adotando uma nova perspectiva é fundamental.

Ações
Historicamente, as mínimas e posterior inflexão do índice S&P 500 aconteceu durante períodos de recessão e não antes desses. Ou seja, aqui fica implícita a ideia de que há espaço para mais quedas dado que a economia ainda não entrou no seu pior momento.

Dito isso, a alocação em ações deve levar em conta o perfil do investidor e sua aptidão a não se desesperar com novas quedas. Fora isso, num cenário inflacionário, os gestores entendem que você deveria priorizar empresas que tem pricing power – capacidade de repassar maiores custos aos seus preços.

Renda Fixa
Para renda fixa, em um cenário mais instável e com maior volatilidade de preços e PIB, deve-se diminuir duration das carteiras, ou seja, priorizar investimentos com vencimentos mais curtos.

Fora isso, dado que, na opinião dos gestores, a economia caminha para uma recessão, é importante reduzir o risco de crédito da carteira e priorizando títulos de empresas investment grade.

Neste sentido, os gestores da Lord Abbett destacaram que muitas empresas nos EUA priorizaram o reforço de caixa e de seus balanços em detrimento a investimentos e novas expansões. O que nesse caso foi bom, pois é possível encontrar bonds com yields elevados ante a média dos últimos anos, em empresas com boa capacidade de pagamento de dívidas.

Outras ideias que foram comentadas no evento foi a redução da alocação em Europa. Dado os receios em relação aos desdobramentos da crise energética, eles ressaltaram que migraram grande parte dos portfólios para ativos nos EUA, saindo de investimentos na Europa.

Estratégias e estruturas que se beneficiem de uma elevada volatilidade também são desejáveis, uma vez que a percepção deles é a de que o cenário seguirá turbulento por mais tempo.

Por outro lado, foi consenso de que o momento turbulento abriu uma janela de oportunidade não vista há muito tempo em termos de valuations de ações e yields de bons. Para quem tem orientação de longo prazo, não precisa de grande liquidez, mas é necessário ter paciência.

* William Castro Alves é estrategista-chefe da Avenue Securities