Com suas peças multicoloridas, a Lego construiu um império avaliado em mais de US$ 15 bilhões, mas agora vive um momento quebra-cabeça: os seus blocos, feitos de plástico, não são compatíveis com os modelos sustentáveis que vêm remodelando a indústria – e a sociedade.

Para se encaixar nesse mundo de negócios ecologicamente corretos, a companhia dinamarquesa assumiu, em setembro do ano passado, o compromisso de banir peças de plástico até 2030 e, assim, se tornar 100% sustentável. 

À época, a empresa afirmou que investiria mais de US$ 100 milhões em pesquisas e testes para garantir que o pacto seja levado a cabo. Uma centena de novos funcionários foi incorporada à Lego para ajudar no processo. 

Enquanto uma alternativa viável de produção ainda não é apresentada, a gigante dinamarquesa estuda outras maneiras de manter seu compromisso, como a possibilidade de adotar um serviço de aluguel, algo já usual em outras indústrias, mas incomum no setor de brinquedo infantil.

O vice-presidente de sustentabilidade da Lego, Tim Brooks, declarou em uma conferência organizada pelo jornal britânico Financial Times, que a ideia enfrenta barreiras técnicas, mas que a fabricante está totalmente aberta à possibilidade de colocar em prática o modelo de aluguel. 

O principal desafio deste serviço seria a complexidade dos kits Lego, que contêm milhares de peças. "Qual a chance de darmos um kit a uma criança de oito anos e receber tudo de volta?", questionou Brooks, no evento. 

Desde 1958 foram feitas mais de 400 bilhões de peças Lego, mas a compatibilidade entre elas se tornou "universal" apenas em 1959. 

Ainda de acordo com o executivo, diversas outras alternativas estão sendo discutidas, mas nem todas serão colocadas em prática, como aconteceu com a proposta de fazer peças com o plástico obtido a partir do uso da cana-de-açúcar.  

Em agosto do ano passado, a Lego lançou esses primeiros blocos "sustentáveis", feitos nos moldes de plantas. Fabricado pela companhia brasileira Braskem,  o Plástico Verde, como é conhecido o material, é o primeiro polietileno de origem renovável a ser produzido em escala industrial no mundo.

Contudo, especialistas como o britânico Peter Skelton, do Programa de Ação de Resíduos e Recursos, enxergam divergências na sustentabilidade do Plástico Verde. A maior crítica é a de que esse plástico feito de cana é exatamente como o convencional: reciclável, não biodegradável. Depois, o material pode até não usar combustíveis fósseis, mas os recursos envolvidos na agricultura da cana passam longe de ser sustentáveis. 

Talvez por isso a ideia do aluguel ainda esteja em jogo na empresa que fabrica 2,16 milhões de blocos de plástico por hora – 36 mil por minuto. Segundo um levantamento do site Gizmodo, desde 1958 foram feitas mais de 400 bilhões de peças Lego, mas a compatibilidade entre elas se tornou "universal" apenas em 1959. 

Todos esses cálculos indicam que existam 62 pecinhas do brinquedo por cada habitante do planeta. E esse número deve aumentar, se levarmos em consideração o fato de que 7 kits Lego são vendidos a cada segundo no mundo. Não por acaso, o balanço anual de 2018 da gigante apontou para um crescimento de 7% no faturamento, e lucro de cerca de US$ 1,5 bilhão.

Economia circular

O modelo de aluguel, que é central na chamada economia circular, tem sido a resposta para negócios que vão de roupas a carros. A Volvo, por exemplo, lançou em 2017 o Care by Volvo, um serviço de assinatura de pelo menos dois anos, que condensa os custos com manutenção e seguro. 

Ao pagar mensalidades que variam entre US$ 700 e US$ 800, o cliente tem na garagem um Volvo já com seguro, sendo o combustível sua única preocupação. Depois de um ano, o assinante pode trocar o modelo do carro. 

A Ikea, empresa sueca de móveis desmontáveis, avaliada em US$ 58 bilhões, também viu uma boa recepção em seu serviço de aluguel. Curiosamente, suas peças são comparadas aos brinquedos Lego, pela facilidade de montar e desmontar mesas, cadeiras e outras mobílias. 

Mudanças pequenas e grandes, como essas de adotar novos modelos de negócios ou de pensar em novos materiais para produtos já bem-sucedidos no mercado, podem movimentar até US$ 1 trilhão globalmente, segundo a Comissão de Desenvolvimento de Negócios e Sustentabilidade. Resta saber como e quando a Lego vai se encaixar nesta conta.

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