Nos últimos meses, Rodrigo Terni, sócio-fundador da gestora Giant Steps, passou a olhar com mais atenção para Nova York e Londres. Não que ele já não olhasse. A Giant Steps, com 100 mil cotistas, R$ 8 bilhões sob gestão e focada em fundos quantitativos, já analisa câmbio, juros, ações e commodities em 40 países.

Mas, neste momento, a atenção de Terni está voltada para outro tipo de ativo: capital humano. Junto com seus sócios, Flavio Terni, Christian Iveson e Jorge Laranjeira, ele está em fase de escolha de onde montará um centro de pesquisas com especialistas em dados, matemáticos e estatísticos.

“Vamos anunciar em breve, mas estamos entre essas duas cidades”, diz Terni com exclusividade ao NeoFeed. “Queremos trazer pessoas sêniores de fora do Brasil para o nosso time. Estamos buscando profissionais como engenheiros, físicos e matemáticos que trabalham em gestoras.”

A estratégia, que visa robustecer a gestora no campo da estratégia sistemática, também busca encorpar os ativos sob gestão. A meta é alcançar R$ 14 bilhões até o fim deste ano. E, para isso, vai refinar ainda mais a enorme quantidade de dados – 1 terabyte por dia – que ajudam nas tomadas de decisões e criação de teses, buscando também informações como geolocalização e comportamento em mídias sociais.

Os dados de geolocalização, por exemplo, são extraídos dos devices das pessoas. Dá para saber, por GPS, para onde as pessoas estão indo, em que momento e quanto tempo estão ficando em determinados lugares.

“É possível mapear os pontos de interesse de um país. Consigo saber em tempo real quando as pessoas estão indo para as fábricas, para os shoppings, o quão cheios estão, como está o consumo”, diz Terni.

O segundo foco de atenção da empresa também está voltado para tecnologia, principalmente no exterior. A gestora pretende investir pesado em colocation, os servidores próximos de bolsas dos Estados Unidos, Europa e Ásia, que permitem executar ordens mais rápidas.

No Brasil, o servidor da Giant Steps está dentro da B3. Mas em outros lugares do mundo pretende montar estruturas próximas. “Vamos investir em até 20 servidores entre 12 meses e 24 meses.” Os servidores estarão próximos das bolsas porque, em alguns países, alugar um servidor dentro da bolsa, pode custar alguns milhões de dólares.

Pode parecer detalhe, mas isso faz toda a diferença nas negociações. Pedro Simonetti, sócio responsável pelo relacionamento com investidores da Giant Steps, exemplifica o que acontece aqui no Brasil. Ele brinca que até parece coisa de ficção científica, mas não é.

“Nosso escritório está a alguns quilômetros da Bolsa. Se o nosso servidor de onde parte a ordem de compra estivesse aqui, ela entraria dentro de um cabo de fibra óptica e percorreria esses quilômetros até chegar no servidor da B3 para ser processada”, diz ele. Demoraria cerca de 100 milissegundos.

“Se o meu servidor está na bolsa, faz diferença na execução. Conseguimos processar uma informação nova, tomar decisão e executar, na média, entre dois e quatro milissegundos. E é isso o que a gente quer diminuir.” Terni complementa. “Quanto mais rápido e eficiente formos, o nosso custo de entrada em uma posição é menor.”

Alguns desses planos estavam previstos para daqui cinco anos, mas foram antecipados para serem concluídos em, no máximo, dois anos. Essa acelerada no passo se deu por conta de um aporte da XP Inc., de valor não revelado, em junho do ano passado. “A captação foi necessária para acelerar o crescimento da empresa e investir em tecnologia para as nossas teses”, diz Terni.

“A Giant Steps é uma fábrica de teses”, diz Simonetti. Quando a companhia começou, ela tinha quatro modelos. Hoje, são mais de 40 teses. Mas o que seria uma fábrica de teses e como funciona? É, definitivamente, uma linha de produção em série.

A gestora tem um time de 20 cientistas de dados e pesquisadores que compila as informações. Depois, a equipe de gestão desenvolve linhas de pesquisas e cria hipóteses de forma de ganhar dinheiro no mercado. Na terceira etapa, a tese é testada para ver se dá para ganhar dinheiro. Feito isso, a ideia é transformada em um algoritmo.

“O programador só entra no final, para transformar aquela equação matemática que o gestor encontrou em um programa de computador que vai atuar como um radar, olhando para o mercado. Toda vez que encontrar aquele padrão desenhado, vai executar no mundo inteiro”, diz Simonetti.

Barrados no hall?

Terni diz que ele e os sócios são outsiders dessa indústria de fundos. “Apesar de alguns sócios terem trabalhado em bancos, gosto de brincar que eles eram os nerds dos bancos, traders de tesouraria que não apareciam muito. Não é igual a traders como Xavier (Rogério Xavier, da SPX) e Stuhlberguer (Luis Stuhlberger, da Verde Asset).”

Terni fez engenharia da computação na Poli e criou uma empresa de software, em 2008, com a intenção de prestar serviço para o mercado financeiro. Ela se chamava Neural Soft, em sociedade com o hoje CTO da Giant Steps, Rafael Lee. O primeiro trabalho da startup, feito para um cliente do mercado financeiro, chamou sua atenção.

A Neural Soft atendia um gestor macro que acordava de manhã e imprimia todos os papers de research e lia tudo logo cedo. Com o tempo, a quantidade de relatórios aumentava e o tempo dele diminuía. “A gente chegava no escritório dele e os papéis estavam jogados no chão”, diz Terni.

O gestor, Vincent Carvalho, pediu para que eles resolvessem aquele problema. A Neural Soft, então, desenvolveu um sistema que consolidava todas as informações que o interessava. “Mostrava o que todos estavam falando, sobre a abertura do mercado, o que era relevante”, diz Terni. Isso foi como um estalo para eles.

“Percebemos que tinha muito valor em juntar conhecimento e a intuição dos gestores com a parte tecnológica. Salvamos duas horas e meia por dia para ele, ao criar aquele sistema”, diz Terni. “E vimos que tínhamos que entrar nesse mercado para ter chance de sucesso.”

“Não criamos uma empresa com a visão de ser uma gestora de fundos quantitativos, criamos uma empresa com a visão de juntar experiência com tecnologia”, diz Terni. Assim nasceu a Visia, em 2011, renomeada de Giant Steps em 2018.

O primeiro fundo foi criado, em 2012, batizado de Zarathustra, por sugestão de Jorge Laranjeira. Inspirado no personagem do livro “Assim falou Zaratustra”, de Friedrich Nietzsche, que retrata um profeta que, depois de dez anos de isolamento nas montanhas, volta para passar seu conhecimento, mas não é ouvido.

Era assim, diz Terni, que os sócios da Giant Steps se sentiam, falando sobre um novo modelo e não sendo escutados. Nesse início, ele diz que não conseguiam nem passar pelo hall dos bancos para serem recebidos. “Tínhamos uma empresa pequena, pouca gente conhecia quantitativos e não tínhamos histórico”, diz ele. “A reação era ‘não confio em máquina, acho que gestor macro é muito melhor, quem são vocês?’”, diz Terni.

Além disso, Terni batia na porta dos investidores institucionais e bancos com o seguinte background. “Eu tinha 22 anos, a gente tinha um fundo sem histórico, um fundo sistemático para fazer gestão e dizia que os meus clientes eram meu pai e meus amigos. Quer investir com a gente?”, diz Terni. “Não era das coisas mais fáceis”, brinca.

O fundo começou com R$ 2 milhões. Entre 2012 e 2017, a captação foi feita com amigos, familiares e alguns poucos clientes. Hoje, o Zarathustra conta com R$ 5,5 bilhões sob gestão e, desde a sua fundação, rendeu 270% sobre o CDI e 340% absoluto.

O Zarathustra funciona quase como um grande radar monitorando o mercado no mundo inteiro. Analisa bolsa, juros, câmbio e commodities em 40 países. Ele busca indícios de que os preços vão disparar para algum lado, tanto para cima como para baixo.

“Quando ele encontra esses indícios, monta uma posição, surfa o movimento e depois sai”, diz Simonetti. A outra estratégia é a do fundo Sigma, criado em 2017, com R$ 2,5 bilhões, é o oposto do Zarathustra, que reage ao mercado. Na verdade, tenta se antecipar ao mercado.

A Giant Steps faz parte de um movimento que ganhou força nos últimos anos. Várias gestoras e grandes bancos passaram a apostar nos fundos quantitativos. Grandes bancos como Itaú e Bradesco contam com esse tipo de produto. Outras gestoras como SulAmérica e AZ Quest também entraram nesse segmento.

Novas gestoras como Clave Capital, de Rubens Henriques, também nasceram já com algum produto com essa estratégia. E o mercado tem procurado cada vez mais profissionais como matemáticos e cientistas de dados para suprir a demanda.

“Os algoritmos que temos não valem nada. O que tem valor na empresa são as pessoas. O algoritmo é o resultado final de uma pesquisa bem-sucedida”, diz Simonetti. Terni complementa. “Para mim não é uma questão de acreditar que a máquina é melhor do que o ser-humano. Na nossa visão a máquina mais o ser-humano é muito melhor.”