A característica home bias do investidor brasileiro vem sendo cada vez mais questionada com a internacionalização dos portfólios. Para abrir uma nova janela nessa frente, o Bradesco está lançando o primeiro fundo de fundos (FoFs) de hedge funds no Brasil em reais.
Em parceria com o banco americano Goldman Sachs, a estratégia dá acesso local a alguns dos melhores gestores de hedge funds globais. A iniciativa faz parte da ampliação de produtos alternativos do Bradesco e da aposta de internacionalização das carteiras para o público private em uma reestruturação da área de investment solutions, que foi iniciada em 2020.
“Esse ativo é muito interessante de se ter na carteira, mas que é de difícil acesso, com tíquetes mínimos altos e pequenas janelas de investimentos”, diz Juliana Laham, CIO do Bradesco Global Private Bank, em entrevista ao NeoFeed.
O Bradesco Explorer Frontier, que terá gestão da Bradesco Asset, vai contar com até 20 hedge funds disponibilizados pelo Goldman Sachs, que tem uma longa trajetória de mais de 40 anos investindo nesse mercado e consegue acesso a dezenas de gestores, inclusive aqueles que estão fechados para para captação.
Neste início, o fundo tem ao redor de 12 hedge funds, como a gestora americana Renaissance, com cerca de US$ 74 bilhões sob gestão, uma referência mundial em gestão sistemática, uso de algoritmos e um dos fundos mais rentáveis da história (Jim Simons, seu criador, fundou a empresa em 1988, aos 50 anos, e faleceu em maio deste ano).
Além da Renaissance, estão na carteira outras estrelas - algumas desconhecidas do investidor local - como FengHe, Centiva, Palestra e a britânica Rokos Capital Management, com cerca de US$ 14,5 bilhões sob gestão, fundada por Chris Rokos em 2015, conhecida por suas estratégias macroeconômicas descorrelacionadas.
O objetivo é conseguir um retorno diferenciado buscando um portfólio que mescle gestores que buscam alfa (retorno acima do seu índice de referência) em estratégias quantitativas, macroeconômicas e de valor relativo em diferentes regiões, sendo descorrelacionado com os mercados de ações e renda fixa globais e brasileiro.
“A indústria de hedge funds já é bastante madura, operando na vanguarda do mercado com uso ostensivo de dados e agora com inteligência artificial para trazer resultados consistentes e com grande controle de drawdown [oscilação entre o preço máximo e mínimo]”, afirma Adilson Ferrarezi, head de soluções de investimento da Bradesco Asset, ao NeoFeed.
O fundo é destinado a investidores profissionais no Brasil (com no mínimo R$ 10 milhões para investir) e está sendo distribuído com exclusividade pelo Bradesco Global Private Bank em reais e sem variação cambial, com aporte mínimo de R$ 250 mil.
No offshore, ele estará disponível com investimento mínimo de US$ 50 mil. A taxa de administração é de 0,5% ao ano e há possibilidade de resgate trimestral de até 25% do valor alocado após um ano – o que a maioria desses fundos não permite.
Ampliação dos alternativos
No Bradesco, a primeira iniciativa foi um fundo de fundos de private equity e venture capital local, o Explorer, que levantou R$ 250 milhões e investiu em 21 gestores com foco no Brasil e na América Latina.
No ano passado, o Bradesco criou um feeder fund local para a gestora de private equity global Riverwood Capital e trouxe uma estratégia de investimento em cotas de fundos no mercado secundário e em co-investimentos com outras gestoras para agregar mais retorno aos seus investidores.
Outros lançamentos de feeder monogestor estão no radar, assim como um fundo de fundos global de private equity e venture capital.
“Estamos montando um programa de investimento em alternativos para que essa alocação seja estruturada para estar no portfólio. Queremos dar acesso a estratégias mais sofisticadas, mas sem abrir mão de uma curadoria nossa. Não seremos um supermercado”, diz Ferrarezi.
Na carteira estrutural recomendada do private do Bradesco, a alocação em alternativos varia de 8% a 30%, dependendo do perfil de risco do investidor e do tamanho do patrimônio. Entram desde fundos imobiliários, fiagros, special situations, private equity, hedge funds e outras estratégias locais e internacionais. Mas, neste momento, a alocação está mais propensa à renda fixa local e internacional.
“Estamos com alocação neutra em alternativos neste momento, por entendermos que os juros estão em patamar atrativo. Mas estamos educando o cliente a ter sempre essa exposição na carteira como forma de diversificação. E quando favorável, aumentar a posição”, afirma Laham.
Hedge funds: uma estratégia ousada
Com estruturas parecidas com os fundos multimercados brasileiros, por terem flexibilidade de poder investir em qualquer classe de ativo no mundo, os hedge funds globais estão no imaginário do investidor por suas estratégias ousadas e complexas para conseguir retornos acima do mercado.
Segundo levantamento da Preqin, a pedido do NeoFeed, a indústria de hedge funds cresceu 32% desde 2019 e alcançou US$ 4,7 trilhões sob gestão no primeiro trimestre deste ano.
Como em geral buscam retornos absolutos no longo prazo, que são descorrelacionados aos mercados de renda fixa e variável, sem se guiar por algum benchmark, os retornos podem assustar investidor.
Neste ano, a classe de ativos está com um resultado médio de valorização de 4,31%, até maio. No ano passado, o retorno foi de 13,8%. Em 2022, no entanto, o retorno foi negativo em 7,3%. Entre 2019 e 2021, os hedge funds entregaram rentabilidades que variaram de 13,2% a 19,1%.
Os hedge funds, assim como outros gestores alternativos, têm ganhado ainda mais destaque nos portfólios internacionais. A indústria de fundos está passando por uma grande transformação, com os gestores ativos cada vez com mais dificuldade de bater os seus índices de referência e de justificar o seu custo.
Em 2024, pela primeira vez, os ETFs passaram o total sob gestão dos fundos mútuos, com mais de US$ 15 trilhões. Em meio a esse cenário, os gestores alternativos, como os hedge funds, aparecem como uma possibilidade de conseguir gerar alfa.
“A indústria de investimentos segue duas grandes tendências, com o crescimento de estruturas eficientes em fundos passivos e dos alternativos. Os melhores hedge funds têm conseguido, a despeito do restante da indústria de fundos, retornos consistentes em dólar nos últimos 10 anos”, diz Ferrarezi.
A expectativa dos grandes investidores internacionais é que esse investimento fique ainda mais atraente com a esperada queda na taxa de juros das grandes economias mundiais. E, assim como toda a classe de investimentos alternativos, os brasileiros já estão começando a aderir aos portfólios globalizados.